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LUTA

Carnaval de Salvador: vendedores ambulantes dormem na rua para guardar lugar

Vendedores ambulantes contam suas histórias e os desafios de trabalhar na folia

Por Andrêzza Moura

20/02/2025 - 6:00 h
Grupo dorme em Ondina desde o dia 2 de fevereiro
Grupo dorme em Ondina desde o dia 2 de fevereiro -

"São muitos anos nessa luta, continuo porque preciso. Não estou aqui porque gosto, não. Porque é um trabalho digno, sim, mas somos muito humilhados. As pessoas olham para a gente com olhar de desprezo, sabe? Somos muito desrespeitados e humilhados perante a sociedade e perante a Semop [Secretaria Municipal de Ordem Pública]. Porque nós não temos fala, nós não temos vez. Eles falam que somos desorganizados. Não nos dão voz, eles ouvem quem eles querem, entendeu?", desabafou uma vendedora ambulante, sob anonimato, ao falar do sofrimento que é ter de dormir na rua para guardar o local onde vai trabalhar no Carnaval.

Há três dias, ela e outros familiares têm passado a noite no relento, dormindo no chão em camas improvisadas com papelões para garantir o ponto de trabalho, na Avenida Oceânica, em Ondina. Vendedora ambulante, há 20 anos, a mulher diz que a situação sempre existiu, mas que agora está pior, pois os pontos antes ocupados por isopores, agora está perdendo lugar para os food truck.

"Infelizmente, é uma situação que já vem ocorrendo há muito tempo. O que acontece é que aqui na minha frente tem esse carro, esse corola. É de uma pessoa que tem o food truck. Ela já chegou, já estacionou aí para garantir o lugar dela, para chegar e poder trabalhar. Sendo que é um local que era reservado para os ambulantes. O pessoal de isopor. E aí o pessoal agora vem com seus carros, segura a vaga e a gente não tem onde trabalhar mais. Ali na principal, somos proibidos de trabalhar. Temos que trabalhar aqui. E eles vêm agora com os carrinhos deles e colocam aí", explicou a mulher o motivo pelo qual muitos trabalhadores têm sido obrigados a dormir nas ruas.

"Muita gente veio e colocou numeração, mas o problema não está na numeração, né? O problema está na fiscalização. Eles não fiscalizam. Na realidade eles falam, falam, falam, mas eles não fiscalizam. Eles só fiscalizam mesmo os produtos que você não pode comercializar. O interesse deles é a gente não vender Heineken [cerveja], certo? Se a gente estiver vendendo Brahma, seja o vendedor qualquer, licenciado ou não, regular ou não irregular, está tudo certo. O que interessa a eles é que a gente apenas esteja trabalhando com o patrocínio deles. É só isso que interessa a eles, mais nada", concluiu.

Outra vendedora que está, há três dias dormindo na rua é Elisiane Silva, de 30 anos. Mãe de três crianças, diz não ter outra opção a não ser deixá-los em casa aos cuidados de outros familiares para defender o posto de trabalho.

"Tenho três filhos. Um de três anos, um de nove e um de quatorze. A de três, consegui deixar com a tia, agora os outros dois eu tive que deixar sozinhos em casa, para vir para cá. Minha família mora próximo, aí, de vez em quando, vai alguém lá olhar eles. Se eu não vier não tem como. Eu não posso simplesmente chegar aqui e falar que é onde eu trabalho, porque o povo já tá dormindo há mais tempo, então eu tenho que vir mostrar que eu estou aqui também para ninguém tomar meu lugar", revelou a vendedora.

Silvia Lopes, 43, trabalha como ambulante, há mais de 30 anos e, embora se sinta cansada e desrespeitada, acredita que não tem muito o que fazer, a não ser, montar a barraquinha de camping na rua e esperar a chegada do Carnaval. Ela, a irmã, os filhos, os sobrinhos e outros trabalhadores estão acampando na Avenida Oceância, também no trecho da Ondina, desde o dia 2 de fevereiro. "A gente já veio direto do Rio Vermelho [Festa de Iemanjá] para guardar nosso lugar, se não pegam", disse ela.

Grávida de seis meses, Reiniele Costa, 32, também está na luta. Assim como a irmã, Silvia, está no local, desde o início de fevereiro. Mãe de mais três filhos, de 15, 10 e 8 anos, diz não enxergar solução para o problema. "Todo ano é isso, trabalho desde criança, vinha com minha mãe e meus irmãos. Hoje, venho com minha filha de 15 anos, e nada mudou", relatou ela, com um ar de conformismo.

Quem não aceita passar pelo o que está passando é a jovem Beatriz Gonçalves, 21. Oriunda de uma família de ambulantes, cresceu vendo o sofrimento da mãe e, hoje, partilha a mesma experiência com a matriarca. Há 18 dias dormindo nas calçadas de Ondina, aponta caminhos para a Semop solucionar o probelma e acabar com a aflição dos trabalhadores.

"A Semop deveria dar uma estrutura para a gente que é mais antigo demarcar nosso lugar e depois os mais novos. Aí, não ia ter essa necessidade da gente dormir na rua. Seria uma imposição da Semop, eles mesmos organizariam e a gente ia ter que obedecer. Mas, eles preferem deixar a gente [ambulantes] fazer o que quiser, aí vira essa bagunça", avaliou a moça, afirmando que quando pagavam pelo cadastramento, era mais organizado, inclusive, no próprio Documento de Arrecadação Municipal [DAM] vinha uma numeração e o nome da rua onde o vendedor deveria montar sua barraca.

Em conversa com o A Tarde, a presidente do Sindicato dos barraqueiros, ambulantes e quermesseiros do Estado da Bahia (Sindbaqa), Graziela Lima Santos, explicou não concorda com que seja feita marcações nos passeios públicos da cidade como forma de marca lugar, no entanto diz que entende a atitude dos trabalhadores. "A gente sabe que é patrimônio público e tal, isso e aquilo outro. Então, é realmente errado. Eles estão com o receio de perder seus lugares, porque querendo ou não, o número de vendedores aumentou. Então, hoje, são 3.500 credenciados, mas, na verdade, a gente sabe que é 15.000 ambulantes", explicou a presidente.

Para ela, o número de credenciamento é insuficiente para atender a demanda de trabalhadores. "Para evitar essa situação tinha que abrir realmente o espaço de credenciamento certo e correto. Já começa desde aí, que não é 3.500, então é mais do que isso. Depois, eles precisam chamar a gente para conversar, temos muitos projetos. Se chamar o sindicato, a gente vai mostrar a solução. Não vamos levar só a crítica, não, nem tampouco trazer só os problemas. A gente tem total solução, entendeu? Para resolver tudo para todo mundo", concluiu Graziela.

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Ordem Pública se pronunciou por meio de nota e disse: "Sobre a presença de ambulantes acampados no circuito Barra-Ondina, a SEMOP reforça que não há necessidade dessa permanência, uma vez que toda a estrutura de apoio aos trabalhadores será disponibilizada nos dias de festa, incluindo pontos de apoio e áreas específicas para abastecimento de mercadorias".

Ainda segundo o órgão, o processo de cadastramento dos ambulante seguiu critérios técnicos e transparentes para garantir a organização do comércio durante a festa. "Neste ano, houve um aumento no número de ambulantes licenciados, medida adotada para equilibrar a demanda e fomentar a geração de renda para trabalhadores informais", diz um trecho do documento.

REIVINDICAÇÕES

Ainda durante conversa com o A TARDE, alguns trabalhadores reclamaram da falta de banheiros próximos ao circuito da festa o que, para eles, dificulta o acesso."O banheiro a gente tem que andar léguas, lá depois das gordinhas. A gente anda muito depois de ter perdido noite, está cansado. Então, infelizmente, a gente é obrigado a pagar para usar banheiro de moradores, que moram aqui próximo. Quem vai aguentar dar essa andada horrível? ", questionou a trabalhadora.

"Há alguns anos atrás, eles colocaram um banheiro aqui próximo, com ar-condicionado. Mas, acredito eu, que eles que estavam fazendo um bem muito grande para nós e tiraram. Acharam que não somos dignos disso. Deixam apenas os banheiros químicos, que são uma nojeira, é algo desumano para ser usado. Muito sujo e bem distante também. E outra coisa, ficam aberto um ou dois para os ambulantes usarem durante o dia, os outros ficam trancados.Só abrem, quando a festa começa para o foliões", denunciou outra vendedora.

Com relação a essa demanda, a SEMOP revelou que "disponibilizará banheiros gratuitos para os ambulantes cadastrados em diferentes pontos do circuito, funcionando no contraturno da festa, das 07h às 16h". De acordo com o órgão, as estruturas serão montadas em pontos estratégicos dos dois principais circuitos da festa.

1. Centro – Oríxas Center (lado estacionamento São Raimundo)

2. Viaduto Menininha do Gantois – Ligação Campo Grande - Canela

3. Barra – Próximo ao Shopping Barra / antiga Perini

4. Ondina – Av. Adhemar de Barros / Milton Santos - Praça Camaleão (rotatória UFBA)

5. Ondina – Rua José Mirabeu Sampaio, 196 (próximo ao Beco do Camarão)

Ainda conforme a secretaria, mais dois pontos serão instalados por patrocinadores na Rua Baependi, em Ondina, e Rua Miguel Bournie, na Barra.

A SEMOP concluiu a nota dizendo que "mantém diálogo constante com a categoria e reforça que a ocupação antecipada de espaços públicos não é autorizada. As equipes de fiscalização da Prefeitura seguem monitorando a situação para garantir a ordem e o cumprimento das normas estabelecidas".

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Tags:

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