INADIMPLÊNCIA
Estudantes lidam com altas dívidas do Fies na Bahia
Especialistas apontam aspectos que podem reduzir dívida e questões que precisam de atenção
Por Madson Souza
Ainda com dois anos por cursar da faculdade de medicina, o estudante João Argolo, de 24 anos, já se preocupa em como vai pagar o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), após se formar. E a preocupação não é à toa, pois dos 198,9 mil contratos ativos com recursos do programa na Bahia, cerca de 128,5 mil estão inadimplentes, de acordo com dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Especialistas da área do direito e da economia apontam aspectos que podem ser alterados no programa e questões que os estudantes precisam ficar atentos.
“É uma dívida muito alta, então vou ter que ter um planejamento financeiro puxado, talvez seja um impeditivo, principalmente nos primeiros anos de formado”, conta João. É nesse cenário que ele já considera alternativas do curso de medicina que podem diminuir o valor total a ser pago. “Ainda estou pesquisando pra me decidir, mas existem áreas da medicina que se você atuar pode ganhar um abatimento da dívida”, explica.
Atuar em Unidades de Saúde da Família localizadas em regiões prioritárias, participar do programa Mais Médicos, trabalhar na atenção primária, são algumas das alternativas que tornam possível a solicitação do abatimento da dívida, como explica o advogado e CEO da GRS - Defesa Médica, Samir Coelho. “Os médicos que atuam nessas áreas têm a possibilidade de solicitar o abatimento e a suspensão proporcional de suas dívidas. Aqueles que trabalham por pelo menos 12 meses consecutivos podem obter uma redução de 1% ao mês no saldo devedor”, afirma.
Dos 198,9 mil contratos ativos com recursos do programa na Bahia, cerca de 128,5 mil estão inadimplentes
Para solicitar o abatimento ou a suspensão do Fies, o médico deve formalizar o pedido administrativo pela plataforma FiesMed. Caso haja negativa ou dificuldades no cadastramento, é possível recorrer à via judicial. Samir reforça que a medida é importante para o país e para o desenvolvimento educacional dos estudantes, além de que poderia ser expandida para outras áreas da saúde, educação e assistência social. “Seria uma estratégia positiva para reduzir a inadimplência e promover a inclusão e o desenvolvimento social”, ressalta.
Dificuldades
Existem vários fatores que explicam porque mais da metade dos usuários do programa no estado possuem dívidas, de acordo com o economista e assessor técnico da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), Alex Gama. A dificuldade em arrumar emprego após se formar, os baixos salários iniciais, as despesas do dia e a falta de entendimento do que é o programa são os principais motivos.
“Muitos jovens acessam o programa, mas observam como uma oportunidade de ingresso em um curso superior e não como financiamento, que tem um prazo de pagamento para quitação da dívida. Precisa ser melhor informado que é uma modalidade de financiamento e que é preciso um planejamento financeiro”, comenta.
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Hoje dentista, Filipe Barreto ingressou no FIES em 2014, num curso de engenharia civil, mas não entendia direito o projeto. Mais tarde, ele conseguiu uma bolsa do Programa Universidade para Todos (Prouni) e fez a migração, e, posteriormente, mudou para o curso de odontologia na Universidade Federal da Bahia (Ufba), em que se formou este ano.
Porém, na época, ele acreditou que o Prouni resolveria os valores devidos ao período em que fez a universidade por meio do FIES, o que não aconteceu. Quando tomou consciência da dívida a situação já era uma bola de neve. “Estava estudando, então não tinha condições de pagar as contas e pagar o Fies. Optei por pagar as contas, mas não tive escolha. E aí eu fui empurrando a dívida mesmo, que foi crescendo”, conta.
“Já fiquei muito ansioso por saber que há uma dívida e não conseguir pagar. É algo que me atrapalha também a ter um cartão de crédito ou uma linha de crédito”, afirma Filipe. Agora, já formado, o dentista se organiza para poder resolver finalmente essa pendência.
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A advogada e sócia do escritório Saraceno Ferreira, Giovanna Conrado, aponta que a comunicação é um dos desafios do programa. “Muitos estudantes não tiveram acesso a informações claras sobre as condições de financiamento, como taxas de juros e prazos de pagamento, o que pode levar a decisões financeiras inadequadas”.
O diretor jurídico da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Bruno Coimbra, explica que a questão da inadimplência traz consequências e pode prejudicar também a continuidade dos estudos.
“É algo que impacta na continuidade dos estudos, no aprimoramento desse profissional, porque é improvável que ele vá assumir um compromisso financeiro para continuar estudando, seja por meio de uma pós-graduação ou de uma segunda graduação”, afirma.
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