SÃO JOÃO
Tia Nem: 100 anos de vida e ícone na fabricação do licor de Cachoeira
Ela é a guardiã dos sabores e tradições da cultura centenária do licor no Recôncavo da Bahia
Por Jair Mendonça Jr

Angelina Cordeiro, Dona Nenzinha ou Tia Nem, como é conhecida há décadas no povoado de Belém, na cidade de Cachoeira, produz um dos licores mais tradicionais e com maior variedade de sabores da região do Recôncavo baiano, referência quando o assunto é licor na Bahia. Em entrevista ao PORTAL A TARDE, Tia Nem, aos 100 anos, garante que ainda tem vitalidade para viver mais um século e conta os segredos da bebida tão consumida no período junino.

Sentada numa poltrona na sala da casa onde criou 19 filhos, ela recebeu a equipe de reportagem com um ‘bom dia’ animado e um sorriso acolhedor. De cara, pediu para terminar de assistir a missa, que passava na TV, ao mesmo tempo que pediu a sua filha Nalva que nos servisse um café.
Na cozinha, uma enorme mesa nos aguardava com fruta pão, banana d'água, pão, queijo, bolo, manteiga da terra, café e leite. A missa e o café da manhã terminaram ao mesmo tempo. Fomos para o lugar preferido de Tia Nem: um quarto decorado com fotos, luzes e estátuas religiosas que ajudam a contar a história de fé da matriarca da família Cordeiro.
Quando perguntada o que ela não viveu e gostaria de viver, foi enfática: “Já vivi tudo que poderia. Não tenho nada a pedir, só agradecer a Deus!”. Sobre a qualidade e a fama do licor que produz, foi humilde: “Eles (os clientes) que dizem que é bom”, disse sorrindo.

O início da produção do licor, segundo ela conta, começou com uma garrafa que fez para a família beber durante o São João, há mais de 30 anos. Hoje, a bebida criada por ela está presente em outros estados e também alguns países. “Vendemos para toda a Bahia, alguns estados e até para fora do país. Ontem mesmo um rapaz comprou para levar para o México”.
Um dos segredos para fazer um bom licor, segundo Tia Nem, começa pela escolha da fruta. "A fruta tem que ser boa e de procedência. Tem que ser bonita e cheirosa, daquelas que você come com os olhos. Se for orgânica, melhor ainda", explica.
Legado
Atualmente, quem cuida de toda a produção é a filha de Tia Ném, Mariana Gouvea. "São mais de 50 sabores e as receitas ainda são as mesmas criadas por minha mãe como chocolate com pimenta e cupuaçu com pitaya. Tem também opções diet, para contemplar todos os públicos. Ano passado foram mais de 5 mil garrafas vendidas e este ano, queremos dobrar”, projeta.


O fabrico Tia Nem, como é chamado os locais de preparo da bebida, comercializa também versões cremosas, como o de Doce de Leite com Chocolate. O sabor Tia Nem é o lançamento deste ano. Mariana explica que criou a bebida para celebrar os 100 anos da mãe e a receita leva as quatro frutas favoritas dela, mas o cliente tem que tentar adivinhar, porque elas não dizem.

Pioneirismo e paixão
Antes de curtir a aposentadoria se dedicando à produção dos licores, Tia Nem trabalhou como tabeliã por mais de 50 anos no cartório de notas, que funcionou na casa onde mora até hoje. O local atualmente abriga o fabrico do licor.

Tia Nem também foi pioneira na política daquela região. Nos anos de 1970, decidiu colocar em prática a boa relação com os moradores para ir além. Acostumada a fazer trabalhos sociais, viu na política a chance de ajudar a trabalhar para quem mais precisava. O desafio era ser a primeira mulher a ocupar uma cadeira na Câmara de Vereadores da cidade, mas ela nasceu para ser a primeira e chegou lá. Tia Nem completou 100 anos em setembro de 2024.
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