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SAÚDE

As políticas públicas sobre a demência estão muito atrasadas

Confira a coluna Ciência & Vida desta segunda

Ana Cristina Pereira

Por Ana Cristina Pereira

15/09/2025 - 9:18 h
Imagem ilustrativa da imagem As políticas públicas sobre a demência estão muito atrasadas
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Com mais de 40 anos trabalhando na área da geriatria, o médico baiano Adriano Gordilho é uma referência na especialidade que trata da saúde e qualidade de vida do envelhecimento. Ele é um dos articuladores locais da campanha que marca o Mês Mundial da Doença de Alzheimer, criada pela Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz) para chamar atenção para esta condição que afeta mais de 1,6 milhão de pessoas no Brasil e ainda é cercada de preconceitos.

"Queremos estimular as pessoas a se informarem e perguntarem sobre a demência, para ajudar a diminuir o estigma", afirma o médico, referindo-se ao mote da campanha deste ano. A programação foi pensada para tirar dúvidas e agregar profissionais, pacientes e familiares, seja através de lives semanais no perfil no Instagram @abraz.bahia ou em um simpósio no dia 26, parceria com a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), que vai reunir especialistas baianos e nacionais no Centro Dom Inocêncio, na Pituba. Já no próximo sábado, dia 20, às 8h, uma caminhada e um abraço coletivo no Farol da Barra quer sensibilizar a sociedade para a causa. “Estão todos intimados”, brinca o médico, acrescentando que é preciso chamar atenção dos poderes públicos e pressionar para o desenvolvimento de uma política pública de cuidados para os pacientes com demência.

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“Hoje nós estamos numa luta muito grande para que o governo brasileiro crie uma política nacional para lidar com essa questão”, afirma o médico, que é diretor científico da ABRAz na Bahia. Ele fala com a experiência de quem já presidiu a ABRAz e a SBGG e atuou como consultor do Ministério da Saúde para políticas de envelhecimento brasileiro, sendo um dos idealizadores da Política Nacional da Saúde do Idoso, assinada em 1999 e revisada em 2006. Ele também foi responsável pela criação da primeira Residência Médica em Geriatria do Norte e Nordeste, no hospital Santo Antônio, das Obras Assistenciais de Irmã Dulce (Osid).

O aumento da expectativa de vida e o envelhecimento natural da população significam também um aumento no número de diagnósticos de demências?

O Brasil está aumentando sua população idosa rapidamente e o envelhecimento é um dos fatores de risco para o surgimento de demências. Estamos tendo um maior número de diagnósticos, em especial a doença de Alzheimer, que é a mais prevalente do conjunto de demências, porque ela está sendo mais conhecida pelos médicos em geral e pela comunidade também. Muitas informações têm chegado e isso tem gerado uma procura por diagnósticos cada vez mais precoces, porque nós sabemos que o diagnóstico precoce ajuda muito na evolução da doença, em uma série de questões. Primeiro, na utilização de drogas que ajudam a puxar o freio de mão da demência, e depois, na conscientização das famílias e na orientação de como lidar com cada fase da doença.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, mais de 55 milhões de pessoas vivem com Alzheimer e esse número deve triplicar até 2050. Como estamos lidando com o assunto?

O Brasil está experimentando um número grande de diagnósticos de demência em geral, mas também da doença de Alzheimer. Estima-se hoje que o país tenha 1,6 milhão de pessoas vivendo com demência e esse número vai crescer muito nos próximos anos. Eu creio que as políticas públicas ainda estão muito atrasadas com relação a isso. Sou diretor científico na Bahia da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), uma organização não governamental formada por filhos, esposas, esposos, cuidadores e familiares de pessoas que vivem com demência. Hoje nós estamos numa luta muito grande para que o governo brasileiro crie uma política nacional para lidar com essa questão da demência, que é muito cara. Através de planos de saúde, mas também atinge pessoas carentes, com poucos recursos, cujas famílias têm muitas dificuldades, porque o paciente entra em uma fase da demência que precisa de cuidados mais próximos. Isso é um desafio muito grande.

A demora em conseguir um diagnóstico ainda continua sendo um dos principais problemas em relação às demências, sobretudo do Alzheimer?

A demora no diagnóstico tem muito a ver com o estigma que essa doença traz. As pessoas têm pânico em ter o diagnóstico de demência, em especial da doença de Alzheimer, que ficou mais conhecida e temida. Esse estigma atrapalha demais a evolução do processo de diagnóstico, o tratamento e a reabilitação, levando o paciente para uma fase mais avançada da doença, quando as coisas já estão mais imutáveis. Então, é importante estar atento, desde cedo, diante de algumas queixas como o esquecimento, as alterações de memória recente e também alterações comportamentais.

O senhor poderia falar um pouco mais sobre as alterações comportamentais mais comuns?

O paciente pode ficar mais apático ou irritado, inquieto e ansioso, e passa a apresentar alterações nas habilidades sociais. No início, tem dificuldade de lidar com situações do dia a dia mais complexas, com dinheiro e conta bancária, por exemplo, fazendo duas vezes o mesmo pagamento e sofrendo abusos de pessoas da casa. Eles perdem a capacidade de planejar uma tarefa que antes era feita com muita facilidade e que agora se torna complexa, como anotar e dar recados. Às vezes o paciente conta a mesma coisa várias vezes e o familiar perde a paciência. Parece que o paciente se transforma numa criança teimosa, mas ele é um adulto, que tem consciência do seu papel, sabe que ele é pai, mãe, patrão, que comanda, só que começa a falhar nessas atividades.

Quais são as principais novidades em relação às medicações e formas de tratamento?

Há 20 anos que não surgem novas drogas para demência, que não são curativas, mas modificam um pouco o curso da doença. Eu costumo dizer que elas são um dos freios em torno de 55, 60% dos casos. Mas existem outras demências, como a doença de Levi, a demência vascular, pela doença de Parkinson, as doenças mistas e várias outras demências podem também acometer o cérebro humano.

Nos últimos 10 anos, têm sido testadas substâncias chamadas proteínas imunológicas, que podem limpar o cérebro das proteínas beta amiloide, que se depositam no cérebro e começam a inviabilizar os neurônios. Mais recentemente, dois desses medicamentos foram liberados pelo FDA, e um deles, que está chegando no Brasil, foi liberado pela Anvisa. Essa medicação tem que ser criteriosamente empregada, porque só se torna útil em fases pré-clínicas da doença, quando o paciente ainda não foi diagnosticado com demência, mas tem o que chamamos de comprometimento cognitivo leve, que deve ser investigado por um neuropsicólogo e pelos exames PET amiloide, que marca as proteínas beta amiloides no cérebro, ou exame do líquor, aquele líquido que circula no cérebro, que pode detectar essas proteínas precocemente. Então, se você cumprir esses critérios, têm indicação de usar essa medicação, que é muito cara, não é financiada pelo Sistema Único de Saúde e nem pelos planos de saúde, e não é indicada nas fases mais avançadas da doença.

Quais são os primeiros sinais de demência que costumam aparecer?

Já toquei um pouco sobre isso lá em cima, mas vou falar de uma forma mais concisa. A primeira coisa que vai acontecer é afetar a memória recente, a memória de trabalho, como a gente chama. O paciente informa duas vezes a mesma coisa em menos de cinco minutos. Muitas vezes vai ter dificuldades nas habilidades do dia a dia, principalmente aquelas mais complexas. Lidar com o remédio, que é um risco, pois o paciente pode tomar duas vezes o mesmo remédio e sofrer efeitos colaterais; lidar com finanças, com transporte público; se perder na cidade, ter dificuldade espacial para saber onde ele está. Esses são então os gatilhos que nós devemos ficar atentos com relação aos nossos queridos pacientes.

Setembro é o mês mundial da conscientização do Alzheimer e de outras demências. O que o senhor diria para pacientes e familiares?

A demência é um grande guarda-chuva que abriga várias doenças e o Alzheimer é mais prevalente. A Abraz preparou algumas lives que estão acontecendo nas quartas-feiras, no Instagram @abraz.bahia. Essas lives, que estão salvas, são muito educativas para familiares, cuidadores e também profissionais de saúde que queiram se inteirar melhor.

Quais são as principais atividades em Salvador para marcar o mês?

Nós vamos ter dois grandes momentos: o primeiro no sábado, dia 20, às 8h, quando vamos realizar uma manifestação no Farol da Barra. Então, estão todos intimados. É uma caminhada curta, a gente vai dar um abraço à causa da demência, da doença de Alzheimer, para chamar a atenção dos políticos, para que políticas públicas venham em favor do cidadão afetado por essas patologias tão desafiantes. Então, é muito importante que a gente tenha uma concentração grande, para que isso chame a atenção dos poderes públicos. E teremos mais um simpósio, no dia 26, no qual vamos reunir profissionais de alta qualidade, como o doutor Leonardo Oliva, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria, doutor Jonas Gordilho, presidente da Sociedade de Geriatria Baiana, e vários outros profissionais, como fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, enfermeiros, para uma série de aulas, com tempo para debate. Eu também darei aula sobre alterações comportamentais no paciente com Alzheimer e outras demências.

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