‘O maior aprendizado da pandemia foi conhecer a força do SUS’ | A TARDE
Atarde > Saúde

‘O maior aprendizado da pandemia foi conhecer a força do SUS’

Secretária da Saúde conta, em entrevista exclusiva, o que pasta tem feito para aperfeiçoar a regulação

Publicado segunda-feira, 30 de outubro de 2023 às 06:00 h | Autor: Divo Araújo
Roberta Santana, secretária estadual da Saúde
Roberta Santana, secretária estadual da Saúde -

A secretária estadual de Saúde, Roberta Santana, não é médica, mas acelerou sua experiência no período mais desafiador possível – a pandemia da Covid-19. À frente da diretoria-geral no enfrentamento da pandemia, Roberta conta, nesta entrevista exclusiva ao A TARDE, o que ficou de aprendizado. O maior de todos, frisa ela, foi ter conhecido a força do SUS, mas não o único. “Nós adquirimos uma expertise que é a capacidade de equipar e montar unidades de saúde numa velocidade ímpar”.

No comando da pasta de Saúde não faltam outros desafios. O principal, segundo explicou, é encontrar uma solução definitiva para a regulação. “‘Quero atender 100% dos meus pacientes em 24 horas”. Ela ainda tem como prioridades aumentar os baixos índices de vacinação no estado, levar atendimento de  alta complexidade para o interior e ampliar os transplantes de órgãos, só para citar alguns. Confira todos eles na entrevista que segue.

Uma das pedras no sapato na gestão de saúde do Estado é a fila de regulação. A senhora já afirmou que vem trabalhando num novo modelo. Como está transcorrendo esse trabalho?

Sem dúvida um dos grandes desafios da Saúde é a regulação e é prioridade do governador. Ele demandou claramente três prioridades e a primeira é a gente encontrar uma solução para a regulação. Mas a gente também precisa mostrar o que a gente já fez para desconstruir um pouco disso. Só em grandes números, já atendemos 230 mil pacientes, 99% das demandas da regulação foram atendidas. Aí você pergunta: Então está tudo bem, não temos nada a fazer? Não, temos sim, porque a gente precisa melhorar os tempos de atendimento. Atender 99% dos pacientes é um bom indicador, mostra a eficiência e os resultados significativos das ações que implantamos. Mas sem dúvida, é preciso fazer melhorias nos tempos de deslocamento, por exemplo, dos pacientes. Cinquenta por cento desses pacientes são atendidos em 24 horas. Qual é o desafio? Ampliar. Eu quero atender 100% dos meus pacientes em 24 horas. Esse é o nosso grande desafio. Não é simples. O que a gente já fez? Tiramos 424 pacientes que estavam hospitalizados fazendo hemodiálise. O governador autorizou um co-financiamento para esses pacientes. São 424 leitos liberados de forma imediata. O que mais a gente fez? Atendimento domiciliar, o home care. Nós ampliamos o contrato de home care e hoje são 3307 pessoas assistidas em suas casas com toda a parte de assistência, oxigenoterapia. Se eu pegasse todos os hospitais da rede privada de Salvador - Aliança, São Rafael, a Rede D'or - não conseguiria atender essa quantidade de pacientes. Nós temos a expectativa de entregar 168 ambulâncias. A ambulância impacta na regulação? Sim, na remoção dos pacientes. Quando o paciente é regulado e não precisa de assistência de UTI, ele é feito pelo município. A gente disponibiliza vaga, ele pega o paciente que está no hospital municipal, por exemplo, e encaminha para o hospital de média e alta complexidade. Então, isso ajuda os prefeitos. O governador também priorizou a parceria com os deputados para emendas parlamentares. E temos outras ações, por exemplo a ampliação de leitos. O total de 650 leitos foi aberto só este ano na gestão do governador Jerônimo. A expectativa até o final do ano é de mais mil leitos. Outra coisa da regulação que é importante falar: 45% das demandas da regulação são clínicas médicas, vascular e ortopedia. O que fizemos para resolver essas três demandas. Abrimos o Hospital Dois de Julho, por exemplo, dedicado exclusivamente a clínica médica. Mas é preciso também fazer o trabalho preventivo e a gente não pode deixar de falar do fortalecimento da ação primária. Quando a gente fala de clínica médica, a gente tem vascular, que é outra grande demanda. E não posso deixar de falar da importância do fortalecimento junto aos municípios. Foram entregues mais de R$ 38 milhões em equipamento este ano para fortalecer a atenção primária nos municípios. UBS, saúde bucal, para que eles equipem esses centros e possam atender e fortalecer. E a ortopedia, que conto com a parceria da divulgação e da imprensa. Porque hoje 80% dos nossos pacientes que estão acamados em leitos de hospitais são decorrentes de acidente de trânsito.

Em relação ao modelo em si da regulação, haverá alguma mudança?

Nós tivemos em São Paulo para conhecer o modelo cross. O modelo de São Paulo é um modelo completamente contratualizado e gerido por OS (organização social). Estudamos bastante e entendemos que, na comparação dos modelos, a gente tem mais ferramentas positivas do que o implantado lá. O que estamos trabalhando hoje é no modelo de regionalização. Pegamos uma macrorregião, o sudoeste baiano, e estamos estudando para fazer o que chamo de micro e macrorregulação. É esse novo estudo da regulação que a gente quer propor. Por que estamos usando primeiro a macrorregião sudoeste? Primeiro, porque é uma região que tem uma sustentabilidade da rede maior. Eu tenho vários equipamentos e consigo compor. E a gente tem um grupo de trabalho criado, composto pelo consórcio de saúde, pela UPB, envolvendo os municípios e pelas equipes da secretaria. A nossa expectativa é que, nos próximos 45 dias, a gente tenha o resultado desse modelo. Se ele efetivamente se mostrar eficaz, nós vamos fazer uma estratégia de implantação desse modelo de macrorregião da regulação nas demais regiões do estado.

A senhora falou de regionalização e o Estado vem apostando muito nos consórcios na área de saúde, sobretudo na condução das policlínicas. Porque é importante investir nesse modelo?

Pensar no modelo de regulação, sem pensar na regionalização, a gente não tem como evoluir. É uma discussão que voltou forte no âmbito nacional. E o que a gente fez? A etapa da ampliação dos equipamentos de saúde - sejam policlínicas, hospitais de alta e média complexidade no interior do estado-  ajudou. O que a gente precisa agora é fazer com que essa rede se integre e faça funcionar toda a rede de policlínicas, atenção primária e especializada. Levar os hospitais de alta complexidade para o interior é sem dúvida a grande estratégia para melhorar a regulação. Porque vou resolver na região os problemas. É aumentar a resolutividade dessas regiões para que a gente não tenha um funil. Tudo tem que vir para Salvador e a gente concentra a alta complexidade toda na capital. Então, a regionalização é um desafio.

Os consórcios de saúde são a chave para essa mudança?

Os consórcios são o melhor modelo de regionalização que nós temos, inclusive discutido nos seminários nacionais. Porque o consórcio consegue integrar. O que eu quero para os consórcios de saúde é que a gente possa ampliá-los. E que eles saiam somente da expectativa de gerir uma policlínica e possam discutir com a gente. Queremos a integralidade da atenção primária, secundária e que a gente possa construir isso junto com os consórcios de saúde, porque eles podem fazer isso. É a junção dos municípios discutindo a saúde na região.

Representantes de conselhos que reúnem estados e municípios afirmam que estão com as despesas sobrecarregadas em razão da queda no repasse de verbas federais ao SUS. A Bahia vem sofrendo com isso também?

Junto com o governo federal nós já tivemos um aporte significativo no incremento do Teto MAC, que é o teto de média e alta complexidade. Então, nós já tivemos um aporte. Mas há uma demanda muito grande e a gente sabe do subfinanciamento do SUS. Ninguém quer colocar isso para debaixo do tapete. A gente tem enfrentado isso e o governo federal tem feito um trabalho importante na redefinição desses tetos. Nós já tivemos, por exemplo, aqui as policlínicas que ajudam os municípios. Nunca houve investimento do governo federal para as policlínicas. Salvo engano, nós recebemos R$ 300 milhões este ano de forma inédita para o custeio delas. É a forma que nós temos de ajudar. Qual é a outra forma que nós temos de ajudar o município enquanto governo do Estado? O governador demandou e nós já estamos estudando uma possibilidade de ampliação do incentivo do governo federal para atenção primária. Mas o governador tem um pedido. Vai ser a partir de indicadores de resultado. Se o município consegue melhorar o indicador de vacinação, o atendimento de controle de diabete, e hipertensão, que são indicadores que rebatem na urgência e na emergência, eles vão ter a possibilidade de um cofinanciamento proporcional ao indicador. Nós já temos essa proposta e já apresentamos ao governador a primeira versão. E o governador disse, Roberta, eu não vou neste momento discutir valor. Eu quero resultado, que a entrega seja casada para que eu possa colocar mais recurso, fazer um esforço, fazer conta como ele diz, para gente poder ajudar os municípios. Agora, eu quero resultados. E os indicadores nós vamos cobrar. O que a gente tem feito também: programas de incentivo aos modelos dos hospitais dos HPPs. Por exemplo, no módulo de maternidade nós discutimos recentemente, já passou pela procuradoria, uma possibilidade de incentivo e de aporte para que esses hospitais ajudem aos municípios a ter, por exemplo, obstetras para poder fazer o parto cesárea no próprio hospital e não demandar isso da regulação. Então, são ações. Mas, de fato, recebo muitos prefeitos e tenho recebido, tenho visitado. Estive com o governador recentemente em Canápolis, fiz uma visita, você vê o hospital funcionando, a população está lá pedindo e os municípios têm colocado - é o que eles alegam aqui na mesa - em torno de 20% da arrecadação para saúde. É um valor que eu chamo de investimento, mas sem dúvida desorganiza as contas dos municípios. A gente tem que estar junto, isso que o governador tem colocado, para poder ajudar os municípios.. Eles têm tido parceria aqui com a gente, contratualizando cirurgia eletiva no interior, porque eu pago pelo procedimento numa tabela diferenciada do SUS, que é um programa do governo do Estado. Tudo isso é uma forma de ajudar o município.

Dados do Ministério da Saúde colocam a Bahia na primeira posição no ranking do Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas. O que foi feito para se chegar a este resultado?

Adotamos medidas inovadoras e assistenciais e de fato esse é um diferencial que a gente tem feito. Nós tivemos uma estratégia muito forte conectado com o Programa Federal de Redução de Filas e a gente conseguiu esse grande destaque. Na verdade, era um programa estadual, que iniciou o ano passado, e já foram mais de 200 mil cirurgias realizadas. Na análise do governo que faz um recorte do recurso federal, nós estamos em primeiro lugar. São 44 mil cirurgias realizadas, o segundo tem 29  mil, que é Santa Catarina. Há quem fique fazendo comparações, mas o que tenho dito é: enfrentar a situação de eletiva não é fácil. Nós paramos um período de pandemia, houve um represamento muito grande, as pessoas não buscaram e não tiveram a oportunidade de fazer. Então, hoje foi uma coisa que o governador pediu: Roberta, nós precisamos enfrentar isso. Se eu não trato de forma preventiva e faço a eletiva, efetivamente isso vai virar uma urgência, uma emergência. A gente está feliz com o resultado e o governador também, mas é um empenho conjunto. E os municípios têm feito um papel muito grande, porque a gente contratualiza. A iniciativa privada, os municípios, as filantrópicas, é um esforço conjunto da nossa sociedade, para que a gente possa atingir esse indicador. Feliz com o resultado, mas temos muito a fazer. A gente não descansa não.

Outra boa notícia é que, de janeiro a agosto de 2023, a Bahia totalizou 106 doadores de múltiplos órgãos, um aumento de mais de 58% no número de doadores. O que explica esse aumento?

Nós temos duas ações no transplante. Uma é a formação de quem recebe a família e o paciente com essa possibilidade. A captação começa na entrada da urgência, da emergência, quando a gente recebe uma família ou um paciente visto pela equipe assistencial  como uma possibilidade de ser um paciente  potencial para doar  órgãos. Tem todo um trabalho de formação da equipe, porque a gente tem que quebrar o preconceito e ampliar as doações. Doar órgãos é doar uma oportunidade de uma vida e isso é muito grandioso.   Então, uma coisa é a formação dos nossos profissionais. Nós investimos nisso e hoje a gente já está colhendo resultados. As provas são os números. Outra ação é decidir retornar determinados tipos de transplante aqui na Bahia. A gente já faz córnea, a gente já faz rim, mas a decisão do coração, e aí eu vou dizer, foi uma decisão do governador. Motivado inclusive pelo próprio Esporte Clube Vitória. Quando o clube  fez essa campanha, ele ligou pra mim, salvo engano vocês do A TARDE fizeram uma reportagem, e perguntou: por que a gente não faz transplante de coração? Aí eu falei, governador, fez, parou na pandemia, tem um tempo. Ele falou assim:  não, eu quero que retorne este ano ainda. Deu missão, deu trabalho, sentamos com a equipe do Hospital Ana Nery,  muito preparada. Nós já fazíamos o pós do atendimento desses pacientes que, muitas vezes, precisavam ser transferidos para São Paulo para fazer transplante, ou em Recife, enfim, e aí a gente conseguiu. Nós temos uma equipe preparada para isso. Já tivemos dois transplantes. Eu  acompanhei uma dessas pacientes já podendo transitar. A gente fica muito feliz com essa conquista e vamos trazer mais ainda novidades até o final do ano.

Estudo inédito de pesquisadores da USP mostra que 13,3% dos pais brasileiros afirmam que não vacinaram seus filhos nas campanhas de imunização. Como está a situação na Bahia?

Eu falei de prioridades que o governador me deu. Essa é a segunda prioridade. A terceira é o fortalecimento do sistema como um todo. Mas a segunda prioridade é elevar as taxas de cobertura vacinal. Eu estava olhando hoje os indicadores e veja que dificuldade. Li uma manchete em São Paulo sobre o aumento do número de internações por conta da Covid. Houve uma sensação de que está tudo resolvido e a população entrou numa zona de conforto, o que me preocupa. Hoje nós temos apenas 10% da população da Bahia vacinada com bivalente, que é dose única.  As pessoas não procuram os postos e a gente precisa trabalhar contra a desinformação. Recentemente, a ministra Nísia Trindade  lançou a campanha Saúde e Consciência, que é efetivamente para a gente poder trabalhar a defesa da vacina. É um desserviço para a população o que é feito com a informação equivocada sobre a vacina. A gente precisa retomar isso e fazer um chamado a nossa população: não acabou.  Dei uma olhada ontem nos indicadores e a gente já percebe um leve acréscimo nos números de positividade da Covid. As pessoas também pararam de fazer teste. Está gripado, bom que se recolha para que não contamine outros, mas a gente precisa testar. Também com os testes rápidos encontrados nas farmácias eu não consigo ter controle dos indicadores, porque não são notificados. Então a gente tem uma dificuldade falando de Covid. Mas falando das outras influenzas, a gente tem um indicador melhor: três milhões de baianos são vacinados contra influenza. Acho que tem uma resistência menor, mas a gente precisa falar também da pólio e todas outras vacinas. Esta semana teve o Dia Mundial do Enfrentamento da Pólio. Ter a possibilidade de crianças com paralisia é algo pra mim inimaginável. Mas a gente precisa vencer e fazer um chamado. Estou falando de vacina em crianças, a responsabilidade são dos pais, dos avós, das pessoas que estão próximas. Então a gente está fazendo um pedido aos responsáveis que amam seus filhos, que vacinem.

 É muito difícil combater tanta desinformação?

Você conhece o poder da informação e sabe da capacidade do raio de ação. Estou fazendo um pedido para que a informação correta chegue com a mesma velocidade e a gente tenha a oportunidade de vacinar. Temos estratégias alternativas, o dia D, horários diferenciados das UBSs (unidades básicas de saúde), os municípios precisam fazer isso de forma unida e pensar o que mudou na população. Eu posso oferecer um horário diferenciado, por exemplo, numa UBS, para que a mãe possa sair às 18h do trabalho e levar seu filho? É isso que eu tenho instado nos fóruns onde a gente está com os secretários municipais a pensar em alternativas para gente poder fazer com que a população seja vacinada. A imprensa tem esse papel e eu peço ajuda de vocês e sei que conto.

Após não chegarem a um acordo, o Centro de Parto Normal da Mansão do Caminho (CPN), oficializou o encerramento da unidade. Qual peso o fechamento desta unidade terá em Salvador?

Primeiro quero registrar o meu respeito, a credibilidade e ao trabalho qualificado que é prestado pelo CPN, que são formadores inclusive de profissionais na área do parto normal. Dito isso, em termos absolutos de quantidade, efetivamente era uma quantidade muito pequena de partos que eles faziam. A gente precisava fazer um trabalho e foi colocado isso na mesa. Eu fiz mais de três reuniões em fórum para gente poder ajudar na possibilidade do que fosse para manutenção da unidade. Eles dizem que as mães eram acompanhadas e tem uma quantidade muito grande de mães que fazem o acompanhamento do pré-natal na unidade, mas elas não procuravam a unidade na hora do parto. Eles fizeram campanha de marketing, de estratégia de divulgação. Aí é uma opinião pessoal, mas a sensação que tenho é que as mães se sentem mais seguras quando a CPN está muito próxima de uma unidade hospitalar até pela possibilidade da assistência. Elas entendem a importância do parto normal e a gente tem que incentivar isso porque a gente acredita que essa é a forma mais saudável, mais simples para assistência também. Mas dizer que, em termos de números absolutos, isso traz um problema, não é verdade. Registro, contudo, que nos fará muita falta no sentido da formação. Hoje nós temos CPNs mantidos pelo governo do Estado. O cenário da maternidade hoje em Salvador, ela é sustentada única e exclusivamente pelo governo do Estado. É bom que se registre isso. Se você olhar a maternidade de alta complexidade são de fato de responsabilidade do governo do Estado, mas até as CPNs que são centros de parto normal e poderiam ser geridos pelo município, o que não acontece.

Aliás, a senhora já disse que a Prefeitura demorou na definição da construção de uma maternidade em Salvador. Qual é a situação hoje das maternidades da capital?

De forma tardia, o município apresenta as estratégias de maternidade. Quanto tempo que o governo do Estado mantém essa estrutura? Fazemos com muito carinho e com muito amor as nossas mães. Eu especialmente, mulher, tenho um carinho muito grande pelas nossas mães e fico feliz em poder acolher. Mas a gente precisa falar. Se o município assume a responsabilidade de fazer a sua parte na maternidade, nós do governo do Estado podemos investir em outras ações que também são de nossa competência.

A Sesab registrou, no primeiro semestre de 2023, um aumento de 168% nas formas graves da dengue em comparação ao ano passado. Qual é a situação da dengue, zika e chikungunya hoje na Bahia?

Para combater essas doenças é necessário o trabalho conjunto de sociedade e governo do Estado. Porque o combate ao mosquito começa em casa.  E a gente também está trabalhando.  Sou do interior, e a gente chama de fumacê. Ele é muito cobrado pelos municípios, mas, veja, a gente tem que combater antes. Não é combater o mosquito, mas combater o foco. Esse trabalho que tenho feito, junto com os municípios. Os casos de dengue a gente sempre monitora. Temos  uma central de vigilância.  Feira de Santana recentemente teve uma incidência muito grande. Nós fizemos uma ação pontual reunindo o Estado e o município de Feira. Mas outros municípios também têm casos. O que eu peço é: a sociedade pode nos ajudar no combate à dengue. É um trabalho conjunto -  sociedade, estado e comunicação, para gente poder divulgar.  Só complementando a informação, 80%  dos focos do mosquito estão dentro das casas. Ou a gente faz um trabalho de conscientização porque  colocar fumacê nas ruas não resolverá a questão. É uma medida, mas sem dúvida o combate começa dentro de casa.

Um dado do início do ano mostrava que Bahia era, na ocasião, o segundo estado com maior número de infectados de HIV, sobretudo entre os jovens. É uma questão que ainda preocupa muito?

Sim, a gente acompanha de perto as  ISTs, que são as infecções sexualmente transmissíveis.  De fato, a gente tem um número elevado. Mas a sífilis tem me chamado mais atenção. Quando a gente faz essas campanhas de testagem, seja em grandes festas, Carnaval, São João, fizemos também, o que tem nos chamado mais atenção é a sífilis. Mas o HIV, sem dúvida, é um ponto de preocupação. Nós temos sempre instigado as pessoas a fazer a testagem e o controle, porque também há uma resistência, um preconceito na hora de fazer o teste. Por  isso que a gente tem levado isso para as  grandes festas, para que a gente possa conscientizar as pessoas. É um teste rápido e é melhor que a gente detecte para quebrar o ciclo de transmissão do vírus. Esse é o trabalho que a gente tem feito muito grande de divulgação em grandes eventos do estado. Foi uma estratégia que o governador decidiu, de forma acertada, colocar nos grandes eventos para gente desmistificar e tratar. É um ponto de monitoramento da gente importante para que a gente faça o combate e quebre o ciclo de transmissão, é esse o nosso pedido.

 A senhora falou da sífilis, quais outras enfermidades preocupam mais no estado?

De forma geral, o que a gente tem hoje são doenças muito associadas à questão das vacinas. A gente volta a ter meningite, varicela, catapora. Elas têm formas de combater e é por isso que a gente faz o chamado da vacina.

A senhora conduziu a Diretoria-geral no enfrentamento da pandemia causada pela Covid-19, atuando na reorganização da rede de assistência à saúde. O que ficou de aprendizado deste período para a gestão da saúde pública nos dias atuais?

Foi um grande aprendizado. E o primeiro que eu queria destacar é a força e o tamanho do SUS. É algo que eu me arrepio. Eu fico realmente emocionada porque quando se depara com aquela situação, primeiro de imprevisibilidade, a gente não sabia o que poderia acontecer. A gente viu uma rede ansiosa, os colaboradores unidos. E  a força dos multiprofissionais imbuídos nisso. E a gente tinha muita desinformação, porque no começo a gente não sabia o que enfrentar. Destacaria que o grande aprendizado pra mim é conhecer a força do  SUS. O segundo grande aprendizado que a gente teve é a capacidade de mobilização rápida da nossa rede. Se não tivesse sido construída uma rede pelo governo do Estado, de equipamentos de saúde do jeito que foi e no interior de forma regionalizada, nós não teríamos conseguido atingir a segunda menor taxa de mortalidade do país. Então, aprendi muito. Eu brinco, quando o governador pergunta se determinada obra está pronta para entregar, eu digo: governador, nós adquirimos um expertise que é a capacidade de equipar e montar unidades de saúde numa velocidade ímpar. Então, isso também foi um aprendizado. A gestão do processo de aquisição de compras, porque foi um período muito difícil,  os valores subiram muito, e nós criamos a expertise para enfrentar isso. Na gestão como um todo, foi um grande aprendizado. Claro que eu registro aqui, que foi um período muito difícil, as vidas que se foram e não voltam, dos profissionais que colocaram lá a sua vida em risco e efetivamente partiram e morreram nesse enfrentamento, mas eu digo, tudo isso em prol de acreditar na fortaleza do SUS que se fez presente na pandemia. Esse é o grande aprendizado. Consegui conhecer a força do SUS.

Desde a gestão de Jaques Wagner, a Secretaria da Saúde é comandada por médicos e a senhora formada em administração de empresas. Quais são as vantagens e desvantagens de ter uma profissional que não tem uma formação em saúde como secretária?

Claro que a gente sempre se questiona. Quando fui convidada pelo nosso governador veio os receios, não tenho problema em falar. Uma administradora sentada numa pasta muito especializada. E quando a gente fala da medicina o campo é muito amplo. Quando a gente fala de saúde pública isso se amplia ainda mais. Mas acreditei em toda a minha trajetória na gestão pública e o governador falou isso para mim. Ele falou, olha Roberta, especialista nós temos e você vai poder ter, porque na Bahia nós temos os melhores, sem dúvida. O que eu preciso é de gente que faça qualificação e gestão. E sobre isso eu sei que você tem competências para fazer e me sinto hoje confortável de estar assumindo esse lugar. Tenho pessoas especializadas que podem me ajudar no campo específico e, sem dúvida, com a minha experiência de quase 18 anos na gestão pública, tenho certeza que posso dar minha contribuição. A gente já tem resultados positivos sendo colhidos claro, liderados pelo nosso governador. Ele dá o comando maior. Mas é um grande desafio e confesso a você que deu um frio na barriga e o frio de vez em quando volta. Mas estou na certeza de que a gente está num bom caminho. E que a gente pode, com gestão, inovação, trazer bons resultados para saúde pública do nosso estado.

Raio-X

Graduada em Administração pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e mestre em Administração Estratégica (Unifacs-2009), Roberta Santana se especializou na área de Administração Pública, com ênfase em Planejamento e Gestão Estratégica. Ocupa funções estratégicas de gestão no governo do Estado desde 2007 e, em janeiro de 2023, assumiu o cargo de secretária da Saúde do Estado da Bahia (Sesab). Ela conduziu a Diretoria-geral no enfrentamento da pandemia causada pela Covid-19.

Publicações relacionadas

MAIS LIDAS