TURISMO
Evite passar vexame com o portunhol
Por JORNAL A TARDE
Na hora de fazer uma viagem ao exterior, turista brasileiro ainda gosta de misturar os dois idiomas
Silvia Maria Nascimento
O turista para fazer uso do portunhol mescla numa mesma frase palavras em português e espanhol, acrescenta ou suprime vogais e consoantes, ou muda o som das sílabas para que pareçam com o da língua em que a pessoa quer se expressar. Quem não se lembra do duela a quién duela do ex-presidente Fernando Collor? Só que a comunicação feita desta forma pode causar alguns problemas, gafes e situações constrangedoras que, mesmo rendendo uma boa piada depois do ocorrido, ainda deixa muita gente em saia-justa.
Há alguns anos, em entrevista à revista Veja, o lingüista americano Steven Roger Fischer, especializado em idiomas mundiais, previu o fim do português e em seu lugar o uso definitivo do portunhol. Fischer, fluente em inglês, francês, espanhol e alemão, e capaz de decifrar outras 480 línguas existentes ou já extintas no planeta, decretou esta mudança para daqui a 300 anos. Boa parte dos turistas brasileiros, porém, prefere não esperar tanto tempo e já assimilou o futuro idioma como a melhor forma de se fazer entender. Eles justificam que, com todos os percalços, a comunicação sempre acaba acontecendo, e isto é o que importa.
E falar o portunhol é bem fácil: basta pegar sons típicos de palavras em espanhol e acrescentar a vocábulos em português. Parece que foi desta forma que o doa em quem doer, muitas vezes expresso como doa a quem doer foi traduzido pelo ex-presidente. Ou, então, mesclar palavras dos dois idiomas em uma mesma frase.
Professores de espanhol no Brasil consideram que nem sempre o portunhol ajuda e aprender o básico da língua de Miguel de Cervantes se torna imprescindível às pessoas que gostam de somar turismo com cultura e relações humanas positivas. Com isso, o visitante pode evitar erros comuns aos que acham que os idiomas têm palavras semelhantes e de fácil entendimento. A coisa não é bem assim. É fato que em países da América do Sul, por exemplo, se fala um castelhano que necessita de tradução para o espanhol falado na Espanha. Por exemplo, o verbo coger que traduzido na Espanha para o português significa pegar, na Argentina, é o mesmo que manter relações sexuais. Se estiver no México, o turista brasileiro e mesmo os da Espanha não devem pedir uma corrida para um taxista porque ele vai entender outra coisa. O som do duplo r corresponde ao da letra g em espanhol e o mexicano vai entender que o turista está interessando em uma transa ou relação sexual.
FÁCIL DE TRADUZIR Para o professor Manuel Angel Romero Aguirre, argentino radicado no Brasil há 15 anos, o portunhol nada mais é do que a falta de interesse por completo de aprender uma língua. Mas ameniza a declaração afirmando que o uso do idioma mesclado já é um início para a comunicação, quando a pessoa sente que não é necessário falar de forma corretíssima. Nas aulas, esta primeira idéia de que os idiomas são parecidos e por isso fácil de traduzir rende até situações engraçadas, diz ele. Dois de seus alunos costumam inventar palavras. Às vezes eles até acertam, brinca o professor, que ensina em colégio de segundo grau e cursos de idiomas.
Turistas não ligam para o idioma
Na hora da compra de um pacote de viagem, no entanto, o idioma é a última coisa com que o turista se preocupa, afirma a supervisora de receptivo da Sol Turismo, operadora de Salvador, Grace Nicory, que atua no setor há quatro anos e meio e cursou apenas um semestre de espanhol. Hoje ela consegue se comunicar bem com os visitantes, e também ouve algumas pérolas de portunhol dita por eles. Segundo Grace, o espanhol dos argentinos é mais complicado porque sons mudam como o il que eles pronunciam com o som do ch em português, enquanto que na Espanha é o mesmo que o som do lh. No portunhol dos argentinos, ela já ouviu coisas como moriango (morango) e a famosa em todos os idiomas cueca-cuela.
Por lidar com os turistas e para evitar aborrecimentos a eles, a supervisora está sempre pesquisando o significado das palavras. Assim tomou conhecimento do transtorno de usar termos como concha que no Brasil é um talher e na Argentina é uma forma chula de se referir ao órgão genital feminino. Grace também já riu muito com o espanto de turistas chilenos com a palavra pajero que pra nós é o nome de um carro, mas no Chile é palavrão. Aprendeu também a não se espantar mais com termos como buseta, que quer dizer microônibus.
O empresário Rodrigo Sampaio Andrade, que acaba de voltar da lua-de-mel em Montevidéu, Punta Del Este e Buenos Aires, diz que o idioma nunca foi problema para suas viagens. Sabe inglês, mas muito pouco de espanhol, e se comunica usando as palavras que conhece e ainda recorre à mímica. Tudo é uma questão de jeito, afirma, dizendo ainda que vai contornando as dificuldades de comunicação e sempre tem a sorte de encontrar brasileiros trabalhando em restaurantes, hotéis e outros setores do atendimento a turistas nestes países.
Livro ensina como evitar erros
O turista brasileiro que elege os países de língua espanhola como destino acaba de ganhar um guia interessante que o ajudará a fugir de situações constrangedoras. Baseado em experiências vividas por ele e por amigos, o ítalo-argentino Diego Alejandro Fabrizio escreveu o Espanhol sem Gafes Guia de Turismo Lazer & Negócios, lançado simultaneamente no Brasil e na Argentina. De forma bem-humorada, Diego relaciona situações corriqueiras que podem acontecer a qualquer viajante a uma série de dicas de como usar palavras em espanhol em viagens de turismo e negócios.
O autor foca o trabalho no humor, relatando gafes que comumente acontecem pelo uso de palavras do tipo parece mas não é, os falsos amigos ou falsos cognatos.
O objetivo do guia é evitar que o viajante cometa erros, consiga safar-se dos apuros e aproveite o melhor da viagem, não caindo nas armadilhas do significado diferente de palavras semelhantes. Por exemplo, em espanhol, mala é uma pessoa má e não aquele objeto onde se leva as roupas. Para pedir sua mala, o turista deve solicitar a valija. Ele já começa o guia com os toques fonéticos, relacionando os sons dos fonemas espanhóis com os mesmos em português, entre outras dicas. E, para ilustrar, o autor mandou fazer caricaturas de seus amigos, os amigos verdadeiros, nas situações descritas no livro em que aparecem os falsos amigos.
Diego Fabrizio é graduado em ciências contábeis com especialização na área societária, já ministrou aulas de espanhol e realizou trabalhos de traduções para empresas e editoras. O autor já começou a coletar material para uma edição do guia voltado para os turistas que falam espanhol e visitam o Brasil. Além das dicas sobre o idioma, ele apresenta também sugestões de passeios a pontos turísticos como Bariloche e Buenos Aires. A versão para turistas estrangeiros terá a indicação de passeios a destinos brasileiros como Salvador e Rio de Janeiro, informa o autor.
GAFES QUE PODEM SER EVITADAS
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