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Céu de Van Gogh chega à bela Ouro Preto com ‘Dia Estrelado’

Curta em stop motion dirigido pela alagoana Nara Normande está em exibição na Mostra de Ouro Preto

Por João Paulo Barreto | Especial para A TARDE

22/06/2024 - 6:00 h
Presença da obra de Nara Nomande na 19ª edição da CineOP a torna ainda mais especial
Presença da obra de Nara Nomande na 19ª edição da CineOP a torna ainda mais especial -

As estrelas estão ausentes no céu de Van Gogh que abriga o brilhante Dia Estrelado, curta em stop motion dirigido pela alagoana Nara Normande. Tal ausência remete justamente à desesperança que o sol escaldante impõe sobre aquelas famílias sertanejas que insistem na adaptação à amarga e inóspita rotina em busca de água e comida.

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Não há outra opção para elas. No entanto, ao subverter os dois céus, transformando em dia a noite – o que o niilista pintor holandês visualizara através de sua janela em um asilo psiquiátrico –, o filme cria uma notável rima que ultrapassa o meramente visual e estético. O resultado consegue nutrir uma sensação de esperança para aquelas pessoas e, por consequência, para o espectador.

Assim, há certo otimismo naquela aspereza. Por trás daquele véu infernal a maltratar tanto a terra quanto os seres vivos presentes ali, pode existir um outro véu. Este, mais suave e menos agressivo. Estão ali as estrelas que podem se descortinar perante aquele manto quente e árido.

E é justamente diante da possível presença delas que as esperanças se renovam para tais indivíduos. A ideia de haver realmente um dia estrelado representa justamente isso aqui. Nada mais que um breve lapso de otimismo. Sensação esta que, ao soprar dos fortes ventos naquele deserto, nos faz acreditar, mesmo que em vão, que seja um sinal de qualquer gota d’água a cair daquele céu.

Ainda assim, é com pesar que percebemos que, naquele lugar, as crianças também se adaptam. Criam suas realidades lúdicas, entre insetos e montes secos de barro quebradiço. Na ausência de um cãozinho de estimação, uma cigarra recebe uma coleira. Quase como a Baleia oriunda de páginas gracilianas, o bicho ajuda a nutrir o imaginário infantil daqueles pequenos de barrigas contraditoriamente avantajadas pela fome, bem como atiça o apetite de um deles.

Formigas se tornam brinquedos e o compartilhar em busca da sobrevivência, um norte. Como o garoto lunar de Saint-Exupéry, o pequeno sobrevivente de pés descalços, aqui, também se afeiçoa a uma flor. Compartilha o pouco da água que lhe é reservada para apenas vê-la se abrir. Suas pétalas não cedem. Resistem presas àquele pedúnculo do mesmo modo que aqueles seres humanos se prendem às suas vidas secas.

Quando qualquer gota de seiva que sairia da árvore que pende de fraqueza se torna apenas uma pedra áspera e dura, é da dor que o menino retira uma fagulha de vida para sua flor de estimação, usando as próprias lágrimas para regá-la. E é justamente nesse ponto que Dia Estrelado encontra sua mais bela metáfora.

Agonia e tristeza

Tal dor está presente em todos naquele ambiente, mas é nas crianças que Normande e o codiretor Tião a retratam mais penosamente para o espectador, que é introduzido naquele mundo de secura.

Sob o céu incinerador, naquela realidade que os define, vive-se com a agonia e a tristeza de modo natural, comum. As duas, claro, se fazem presentes de forma mais cruciante nos adultos, cientes de suas responsabilidades e dos riscos que correm suas crias. Mas é nas crianças que a percepção daquela realidade nos é apresentada. É pela ótica delas, pelo observar de suas vidas tanto por nós quanto por elas mesmas, que sentimos um pouco daquela mesma aspereza.

Ao nos trazer essa ótica justamente a partir do pensamento infantil, em uma consciência que reconhece que pelo sofrer pode ser possível alcançar algo – no caso, lágrimas que servem como salvação –, percebemos como a maturidade forçada atinge o garoto de modo a lhe retirar qualquer traço de inocência. Não é somente a natureza física do lugar que aquele sol modifica, mas a humana.

Dolorosamente, é através das lágrimas dos pequenos que se consegue um pouco mais de esperança, quando o provocar do desalento e da decepção se faz necessário para salvar uma vida. Mesmo que essa vida seja a de um flor.

A presença da obra de Nara Nomande na 19ª edição da CineOP a torna ainda mais especial.

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