ARTIGOS
O país envelhece
Estatuto do Idoso esbarra na naturalização do desrespeito e na falta de consciência

Por José Medrado*

O tema da redação do Enem 2025 foi o envelhecimento na sociedade brasileira, lançando para a sociedade o fato de que o Brasil envelhecer é incontestável. Longe ficou a ideia de país de jovens. Segundo dados do IBGE (2024), mais de 15% dos brasileiros têm 60 anos ou mais, e essa proporção deve dobrar até 2050. No entanto, o avanço demográfico não tem sido acompanhado por uma transformação cultural equivalente.
O país envelhece, mas ainda não aprendeu a respeitar o idoso. Basta observar o cotidiano: jovens que ocupam vagas preferenciais, fingem dormir no transporte público ou furam filas destinadas a pessoas com mais idade. São pequenos gestos de indiferença que revelam uma grande falha social – a naturalização do desrespeito.
As leis existem, como o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), mas o Brasil ainda convive com o velho dilema da “lei que pega” e da “lei que não pega”. O problema não é a ausência de normas, e sim de consciência. Em vez de valorização, o que se observa é descuido, impaciência e, muitas vezes, desprezo.
O problema é que o crescimento dessa faixa etária não veio acompanhado de uma mudança cultural e ética. Na prática, o amparo legal esbarra na falta de fiscalização e, sobretudo, na ausência de uma consciência coletiva voltada à valorização dos que têm histórias, experiências a contar e passar.
Do ponto de vista sociológico, o envelhecimento brasileiro expõe um conflito entre o culto à juventude e a negação da velhice. A sociedade moderna valoriza a produtividade, a aparência e o consumo, deixando à margem aqueles que já não se encaixam neste ideal. O idoso passa a ser visto como um peso, e não como alguém que carrega história, experiência e valor simbólico.
Falta uma política pública que vá além da formalidade. É preciso investir em educação cidadã, urbanismo acessível, atendimento digno na saúde e campanhas que estimulem o respeito intergeracional. O envelhecer não pode ser sinônimo de exclusão.
O modo como uma sociedade trata seus idosos diz mais sobre seu presente do que sobre seu futuro. No Brasil, o desafio não é apenas garantir o direito de envelhecer, mas assegurar que esse envelhecimento seja vivido com dignidade — não como concessão, mas como conquista civilizatória.
O Enem, por fim, ao colocar à mesa “O desafio de envelhecer na sociedade brasileira” – propõe uma reflexão necessária sobre um fenômeno que já não pode ser ignorado. Envelhecer, porém, não deveria ser visto como um problema – e sim uma conquista social. A sociedade brasileira foi colocada diante do espelho. E o reflexo é incômodo: uma sociedade que ainda trata a velhice como fardo revela o quanto falta para que o Brasil se torne, de fato, uma nação madura.
*José Medrado é Mestre em família pela Ucsal e fundador da Cidade da Luz
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