AUTOS
Carro deixa de ser sonho de consumo para jovens
Entretanto, pesquisas apontam interesse por mobilidade elétrica
Por Núbia Cristina
Cada vez mais, a compra do carro deixa de ser sonho de consumo para muitos jovens, mesmo aqueles de maior poder aquisitivo. Os desejos dessa galera estão alinhados com o conceito da economia colaborativa e a demanda é por melhoria no transporte público e pela criação de estações públicas de compartilhamento de carros elétricos, onde se paga pelo uso e não pela propriedade.
Estatísticas do Detran-BA revelam queda na procura por primeira habilitação entre 18 e 30 anos, na Bahia, de 2023 em relação a 2022. Em 2023, o Detran-BA contabilizou número total de 92.668 PPD´s (permissões para dirigir) na Bahia, entre jovens de 18 a 30 anos; em 2022, foram 95.757, uma queda de 3,22%.
“O que muitos jovens têm hoje é um plano de mobilidade, no qual o carro é apenas uma das opções. Soluções tecnológicas como Uber, 99, Indriver, e até o transporte público, que precisa ser melhorado, acabam atendendo essa demanda”, comenta o CEO da Cubos Tecnologia, Verivaldo Lobo. “Outra coisa que vejo na minha área de tecnologia é que o home-office se tornou muito mais frequente, então a necessidade de se locomover na cidade foi diminuída. Logo, a função do carro próprio perdeu força”.
Custo-benefício
O CEO da Cubos tem 33 anos e convive com muitos jovens da área de tecnologia. “O jovem de hoje pensa muito na relação custo-benefício. É mais prático, sustentável, econômico compartilhar e pagar pelo uso. Economia colaborativa é tendência há anos porque segue essa lógica”, explica. “Se eu posso ter um veículo só quando eu preciso, para que ter o tempo todo e me preocupar com burocracias, manutenção, estacionamento, abastecimento, custos fixos, estacionamento etc.?”
Lobo, que é baiano, acredita que a demanda por melhoria do transporte público não é anseio apenas do jovem no Brasil, mas em muitas cidades do mundo. Graduado em Engenharia Elétrica pela USP, pela própria universidade ele fez intercâmbio pelo programa Ciências Sem Fronteiras, onde cursou Ciência da Computação na Aberystwyth University, no Reino Unido. No segundo ano da formação, em 2012, fundou a Cubos Tecnologia junto com amigos.
Nos EUA, em cidades como Houston, Miami, Los Angeles e Nova York o transporte público é muito deficitário também. Sem carro é muito difícil se locomover por lá”. A Cubos Tecnologia já movimentou mais de R$ 300 milhões desde sua fundação, mas não passa pela cabeça de Lobo ter um supercarro de luxo ou trocar de carro todo ano. Apaixonado por automobilismo desde criança, ele é piloto de kart, foi campeão do Baiano de Kart e da Copa Nordeste em 2023 e faz parte da Associação Baiana de Karts.
Para se locomover na cidade e para viajar, ele comprou um SUV Creta, mas está sempre nas pistas, porque ama velocidade com segurança. “Desde pequeno acompanho automobilismo, com a família. Aos 10 anos, comecei a andar de kart, parei e retornei há dois anos. É um hobby que eu levo muito a sério. Pratico sempre que dá, quase todo final de semana estou em alguma pista, ou correndo nos campeonatos”, conta.
Parceria ABK
“Quando voltei a andar de kart percebi que algumas coisas poderiam ser melhoradas com tecnologia, no universo do kart. Sou associado à ABK e descobri que podia ajudar, então lançamos uma aplicação onde os pilotos podem fazer suas inscrições para as provas, acompanhar as suas mensalidades etc. Parceiro da instituição, além de piloto, Lobo colocou sua equipe à disposição para criar soluções que facilitem o dia-a-dia da associação, dos pilotos.
Graduada em Engenharia de Produção, Agatha Soto, 25 anos, é soteropolitana, mora em São Paulo há oito anos e trabalha na Amazon há cinco. “Logo que fiz 18 anos eu comecei a buscar a habilitação, mas eu me mudei, então ela atrasou e eu tirei a primeira habilitação há 19 anos”, conta.
“Apesar de eu gostar de dirigir carros, não acho que eu tenho necessidade de ter um carro dos sonhos. E comprar carro nunca foi algo que eu pensei como sonho. Quando eu fiz 18 anos eu ganhei um carro, e os custos que eu tinha para manter o carro não faziam sentido para mim. Quando eu coloquei na ponta do lápis, comparando com o transporte por aplicativo ou até transporte público”, explica.
Então, na época, Agatha vendeu seu carro e escolheu investir o dinheiro. “Fiquei me transportando por Uber, 99, carona, qualquer variação dessas”, explica. “Eu acho que o jovem vem perdendo interesse por carros, eu tenho muitos amigos da minha idade que não têm habilitação. A gente coloca os custos todos da ponta do lápis e percebe que andar de Uber ou qualquer outro aplicativo tem maior custo-benefício”. Apesar de não pensar na compra de um carro elétrico hoje, a jovem vê com bons olhos o avanço da mobilidade elétrica.
“Eu acho os carros elétricos muito interessantes, embora muita coisa ainda seja prematura: a tecnologia das baterias, a autonomia, o tempo de vida das baterias, o que se faz com essas baterias depois. Os carros elétricos ainda estão muito caros, o custo deve baratear depois”. Por todas essas questões e pelas incógnitas dessa indústria em desenvolvimento, Agatha não pensa na compra do 100% agora, mas se fosse para ter um carro, ele seria elétrico.
Estudo recente (novembro 2023) encomendado pela britânica Sogo Mobility aponta que, na Europa, os jovens têm três vezes mais probabilidades de adquirir um carro elétrico do que motoristas mais velhos. A pesquisa mostra que 59% dos motoristas com idades entre 18 e 24 anos têm maior probabilidade de trocar seu carro atual por um elétrico do que há um ano. Conforme a faixa etária aumenta, contudo, a disposição em ter um EV cai.
Analista financeiro, graduado em Engenharia de Produção, Pierre Prado, 24 anos, tirou habilitação aos 18 anos, gosta de dirigir, mas não pensa em comprar carro. “Gosto de carros, mas a posse de um automóvel não está entre meus sonhos de consumo”, resume. No cotidiano, ele se locomove com o carro de familiares ou utiliza aplicativos de mobilidade.
“Os carros elétricos são o futuro, hoje não vejo outro caminho para a indústria automotiva. É esperado que o Brasil siga o exemplo da União Europeia, com leis que incentivem a adoção de carros elétricos. Além disso, é uma oportunidade para o Brasil aumentar a cadeia industrial relacionada a automotivos”, resume.
Prado defende a melhoria do transporte público no Brasil. “O investimento em mobilidade urbana é fundamental para o desenvolvimento do país, porém hoje não se tem a qualidade, manutenção e tecnologia esperada para um país como o Brasil. No meu ponto de vista, o transporte deve ser uma prioridade para o estado”, pondera. Ele concorda que o jovem vem perdendo o interesse pela compra do carro.
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