ENTENDA
Após vazamento de vídeo de dançarina, especialistas falam em crime
Bailarina Natalya Nery teve imagens íntimas vazadas, com o cantor Zé Paredão
Por Osvaldo Barreto
O mundo do pagode baiano acordou com uma polêmica envolvendo a bailarina Natalya Nery e o cantor Zé Paredão. Tudo isso porque um vídeo que registrou o momento íntimo dos dois tem sido compartilhado nas redes sociais desde a noite de terça-feira, 23. Entretanto, mais do que uma polêmica, em qualquer caso, a divulgação e o compartilhamento das imagens podem ser consideradas crimes.
De acordo com o Painel de Estatísticas do Poder Judiciário, em outubro de 2023, tramitavam no Brasil 474 processos de importunação sexual e 344 de registro não autorizado da intimidade sexual.
A equipe do Portal A TARDE buscou opiniões de especialistas, que reforçam que o registro e a divulgação de imagens íntimas - os famosos "nudes" - sem consentimento, são condutas criminosas previstas na Lei 13.772/18, conhecida como Lei Rose Leonel, a Lei 13.718/18, e, a lei 12.737/2012, popularmente conhecida como Carolina Dieckmann, que alteraram o Código Penal.
A Lei Rose Leonel criminaliza o registro e/ou montagem de imagens íntimas sem o consentimento da vítima. Já a Lei 13.718/18 penaliza a divulgação dessas imagens e prevê o agravamento da pena de um a cinco anos de prisão, para quem divulga, mantém ou manteve relação íntima com a vítima, ou se a divulgação foi feita para humilhar se vingar.
A advogada Jôze Karen, especialista em direito digital e Pesquisadora de Racismo Algorítmico, lembra que a Carolina Dieckmann foi a primeira lei a tratar sobre o tema. "Está no consciente brasileiro a primeira lei a punir crimes cibernéticos. Um verdadeiro marco inicial da proteção à privacidade no Brasil. Numa visão mais objetiva, essa lei incluiu no código penal, o crime de invasão de dispositivos informáticos, como celulares, tablets e notebooks".
Ana Paula de Moraes, também advogada de direito digial, chama atenção para os números alarmantes envolvendo o tema e ressalta que muitos casos são subnotificados.
"No Brasil, ao menos quatro processos são registrados, por dia, e dizem respeito a divulgação de imagens íntimas sem consentimento da parceira. Podemos considerar que o crime praticado e o número de processos em trâmite é aquém da realidade devido à falta de dados precisos e, porque não dizer falta de registro por parte das vítimas? Já que envolve os sentimentos de culpa e de medo destas vítimas, que desistem de denunciar", explicou a especialista.
Ainda conforme Ana Paula, o Brasil registrou ao menos 5.271 processos judiciais envolvendo o registro e a divulgação de imagens íntimas sem consentimento. "Eles foram abertos entre janeiro de 2019 e julho de 2022. O estado com o maior número de casos é em Minas Gerais (18,8%), seguido de Mato Grosso (10,93%) e Rio Grande do Sul (10,17%)", revelou.
Os especialistas ressaltam que apenas receber imagens ou vídeos de "nudes" não é considerado crime. O crime surge se houver o armazenamento e o repasse. O advogado criminalista, Marinho Soares, afirma que, apesar de, em alguns casos, haver dificuldade de identificar como o vídeo foi parar nas redes sociais, aquelas pessoas que reenviam podem sofrer punição e responder criminalmente.
Revenge Porn
Tem sido comum situações em que, após o término de um relacionamento, o parceiro ou parceira divulga imagens íntimas como forma de vingança. Nesses casos, existe agora a previsão de que a pena pode ser aumentada de 1/3 a 2/3.
"A pornografia de vingança é a expressão usada para denominar o ato de expor, na internet, fotos ou vídeos íntimos de terceiros, sem o consentimento dos mesmos. No geral, as vítimas deste tipo de ação costumam ser mulheres jovens. A majorante de pena da pornografia de vingança pode chegar a oito anos e quatro meses de prisão", explica a advogada Ana Paula de Moraes.
Importante chamar atenção para que tanto homens como mulheres podem ser vítimas dos crimes. Portanto, a Lei Rose Leonel e a Carolina Dieckmann tem o objetivo de proteção da pessoa que tiver a sua privacidade invadida.
"Podemos entender que para a legislação, por se tratar de crime comum não exige nenhuma qualidade especial do sujeito ativo, assim como pode vitimar qualquer pessoa. Note-se apenas que praticar, na presença de alguém menor de quatorze anos, ou induzí-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem, caracteriza o crime do art. 218-A do CP, punido com reclusão de dois a quatro anos", descreveu a advogada Ana Paula.
A ideia é corroborada pela advogada Jôze Karen. "Divulgar imagens por vingança ou para humilhar a vítima agrava o crime. As leis são claras em relação a isso, considerando o impacto emocional, psicológico e social sobre a pessoa afetada. Além do crime inicial, a vingança pode resultar em penas mais severas".
Ana Paula esclarece ainda que havendo autorização da gravação ou repasse, não há crime. "Outro ponto importante é diz respeito a autorização dos participantes, se há autorização, o fato é atípico, salvo em se tratando de crime ou adolescente, situação na qual configura o crime do art. 240 do ECA".
"Suponhamos que uma pessoa conheça uma moça em uma festa e de lá resolvem manter relações sexuais e esse rapaz autoriza seu irmão a ficar escondido, filmando a cena. No momento em que a moça não autorizou o referido registro, estamos diante de um crime", exemplificou.
Como a vítima deve agir?
A advogada Ana Paula de Moraes indica que o primeiro passo que a vítima deve dar é salvar a imagem que foi divulgada. Posteriormente, é preciso fazer um boletim de ocorrência e solicitar a retirada do conteúdo no site/rede social em que a foto foi exposta.
"No caso em que os conteúdos foram gerados por terceiros envolvendo, inclusive, a divulgação sem autorização de imagens, vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado, a vítima ou seu representante legal poderão, diretamente e sem a necessidade de ordem judicial, notificar o provedor de aplicações que hospeda o conteúdo", destacou.
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