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DIA DOS AVÓS

Com humor e descontração, vovós influencers fazem sucesso na web

O Portal A TARDE conversou com três influenciadores e especialistas sobre presença deste nicho nas redes

Por Bianca Carneiro

26/07/2023 - 6:00 h | Atualizada em 26/07/2023 - 8:37
Selma Morais, Vovó Terezinha e o "Painho" de Lore Rufis falaram sobre suas vivências na internet
Selma Morais, Vovó Terezinha e o "Painho" de Lore Rufis falaram sobre suas vivências na internet -

Acordar, se arrumar, sair com a neta e resolver compromissos ou então, ficar em casa cozinhando e realizando tarefas do cotidiano. A rotina de Terezinha Pires de Almeida, de 73 anos, é igual a da maioria de todas as avós e avôs, exceto por um detalhe: milhões de pessoas nas redes sociais acompanham o dia a dia da feirense, que é conhecida na internet como “Vovó Terezinha” (@vovoterezinhaoficial).

“Um bom dia bem alegre da vovó. A vovó ‘tá’ saindo agora para mais um compromisso e já volta com mais novidades para vocês”. Nas redes da “vovó mais lindona e arretada”, como ela mesmo se define, todos os fãs e seguidores viram netos e netas. Na família uma se destaca: Nicolly Almeida, de 22 anos, que é também sua parceira na produção de conteúdo.

Nas últimas décadas, o mundo digital tem revolucionado a comunicação e o compartilhamento de experiências. Nesse cenário, uma tendência surpreendente tem ganhado cada vez mais destaque: as avós e avôs influenciadores digitais, tema do A TARDE Destaque desta quarta-feira, 26, Dia dos Avós. Eles desafiam estereótipos e quebram barreiras ao mostrar que não há idade limite para compartilhar suas histórias e conhecimentos.

Nascida no município de Morro do Chapéu, Terezinha era professora. Hoje aposentada, ela viu sua vida mudar completamente depois de uma cocada que deu errado. “Foi por causa da ‘traste’ da Nicolly. Ela tem hora que apronta comigo, que eu digo, meu Deus, será que é minha neta mesmo? Porque ela adora me trollar e me tirar do sério. Eu gosto muito de fazer doce, então fui fazer uma cocada de leite, só que eu peguei a panela errada e o doce começou a grudar. Fui ficando nervosa e Nicolly me gravou [...] No outro dia, o vídeo já estava bombando no Brasil e fora do Brasil, em tudo que foi canto. Esse vídeo viralizou. Foi assim que eu me tornei uma blogueira com 73 anos”, conta a Vovó, que já foi notada por artistas famosos como Luísa Sonza.

O jeito explosivo e até os palavrões da Vovó cativaram um grande número de seguidores na web: são mais de 2,9 milhões de “netinhos” no TikTok e quase 1 milhão no Instagram. “Não é ensaiado, porque se fosse não era tão perfeito [...] Eu sou assim, ela [Nicolly] me pega de todo jeito dentro de casa. Porque a gente acorda assim, rindo, brincando, ela me trollando e eu me ‘reto’ com a cara dela”.

Nicolly foi criada pela avó e além de fazer ela "passar nervoso", é a grande responsável pelas gravações nas redes. Segundo a estudante, Terezinha não tem vergonha de fazer os vídeos, mas se estressa ao ter que repeti-los. “O conteúdo que eu adoro gravar é perturbando ela, né? Porque eu adoro perturbar minha avó. Não é pra ela ficar brava comigo, nem nada, é a minha forma de dar um pouco do amor que eu tenho por ela [...] Eu adoro trollar minha avó, porque ela acredita em tudo que eu falo, então trollar ela pra mim também é muito bacana”, afirma.

Outra relação entre neto e avô que é famosa na internet é a dos soteropolitanos Lore Rufis (@rufislore), 24, e Aloísio Alves, 73, o “Painho”. Entre “tapas e beijos”, os dois fazem sucesso, principalmente pelas brincadeiras que Lore apronta com o avô. E dessa vez, nem a reportagem do A TARDE Destaque escapou: com muito bom-humor, foi a própria influenciadora quem “entrevistou” o patriarca a partir das perguntas que fizemos [confira o vídeo divertidíssimo abaixo]:

A criadora de conteúdo revela que o avô sempre foi a figura paterna mais próxima a ela. No início, ela não o incluía nos vídeos, respeitando sua timidez. No entanto, a primeira gravação com Painho viralizou, isso porque a relutância em não querer ser filmado acabou dando um toque único às gravações.

“Eu não gravava com ele justamente pelo fato dele não curtir muito aparecer, mas depois que gravei a primeira vez, a espontaneidade dele e inocência em não querer aparecer deu toda a graça, a galera gostou e eu fui dando meu jeitinho pra convencer ele a gravar”, conta ela.

Entre os posts da dupla que fizeram mais sucesso está a recriação de uma cena do filme “As Branquelas” (2004). No vídeo em questão, os dois refizeram o momento em que o policial Marcus (Marlon Wayans) está experimentando roupas femininas em um shopping. A gravação, que viralizou na internet e recebeu diversos comentários de famosos, foi também, segundo Painho, a que mais deu trabalho de fazer.

Se no começo Painho relutava em gravar, atualmente a situação está um pouco mais tranquila, mas isso, claro, sob exigências até um pouco curiosas. “Hoje em dia, a curiosidade dele o fez pesquisar, e atualmente ele até me assiste nas redes, e gosta de gravar, vez ou outra uma cervejinha ajuda ele a aceitar”, diz Lore aos risos. A repercussão dos vídeos entre os seguidores é extremamente positiva: as trolagens e o jeito meio mal-humorado de Painho conquistaram os espectadores.

“O pessoal adora Painho, recebo alguns feedbacks de pessoas que dizem “ver” o próprio pai ou avô no meu avô, o jeito dele mais bruto, ranzinza, trás uma lembrança afetiva de alguém que já se foi na vida de outras pessoas que assistem, é muito bom ler isso”, afirma ela.

Tímido também com a reportagem do Portal A TARDE, em poucas palavras, Painho confirmou que é recebido com muito carinho por quem o reconhece nas ruas. “Me sinto bem, sou tratado bem, com respeito. A galera tem carinho comigo e eu também tenho com eles”, destaca.

Sabedoria que inspira

Para além dos perfis que abordam o cotidiano e a relação com os netos, há ainda aqueles avós que criam conteúdo independente para falar sobre um assunto específico. Esse é o caso da vovó Selma Morais, a “Coroa de Mochila” (@coroademochila), que aborda em suas redes sociais, opções de práticas esportivas disponíveis em Salvador, além de dicas sobre viagens.

Jornalista pioneira na reportagem de automobilismo da Bahia e uma das primeiras no país, Selma enfrentou, no auge da profissão, um desafio que ia além das pistas: em meio a uma vida agitada e estressante, ela foi diagnosticada com câncer nos gânglios linfáticos, o que a levou a enfrentar um tratamento de quimioterapia e a conviver com as sequelas da doença. Mas foi durante a pandemia de covid-19 que veio a decisão de mudar o foco. Para afastar a solidão do confinamento, aos 67 anos, a influenciadora passou a praticar diversos esportes e resolveu compartilhar o resultado com o mundo.

“O primeiro ano da pandemia eu comecei a correr dentro do próprio condomínio, então quando acabou a pressão de todo mundo ficar preso, eu comecei a correr na rua e não parei mais, porque eu ainda continuava me sentindo muito sozinha. Me deu vontade de vender a casa [...] O cara que comprou perguntou, por que eu estava vendendo aí eu disse que estava querendo era peregrina, virar uma ‘Coroa de Mochila’. O nome, inclusive, saiu assim, bem espontâneo”, conta ela que possui perfis no Instagram e Facebook, além de canal no YouTube e uma coluna no Portal A TARDE às terças e sextas.

É ela mesmo quem grava e edita o conteúdo. Mesmo sem tanto trato com a tecnologia, ela diz que consegue filmar as suas aventuras. Mas além de inspirar as pessoas a se exercitarem, Selma também se orgulha de ser uma avó muito presente na vida de seus dois netos, de 7 e 4 anos, que considera como “as sobremesas” da sua vida. Ela conta que as crianças apoiam e acompanham a carreira digital e até mesmo a reconhecem como “youtuber”. “O que me deixa extremamente orgulhosa e feliz é quando eu pego meu neto com celular, vendo meus vídeos, vendo minhas aventuras. Ele adora. Meu neto disse que eu sou youtuber, eu acho engraçado isso [...] Realmente, eu estou curtindo, estou curtindo muito essa fase nova que eu estou vivendo”, diverte-se.

Para o psicólogo e gerontólogo Paulo Roberto Reis, especialista em envelhecimento humano, a participação ativa dos idosos nas redes sociais pode trazer inúmeros benefícios para a saúde mental.

“Hoje em dia, as pessoas idosas têm mostrado que não são frágeis, incapazes e muito menos descartáveis. Estão descobrindo que é possível ser pessoa idosa e continuar produzindo. Ao meu ver, essa é a realidade das pessoas idosas que estão ativas nas redes sociais. Eles e elas estão mais conectados, e isso é bom para a saúde e qualidade de vida. A democratização da internet abriu um leque de possibilidades, e vem traçando um caminho de inclusão. Então, sim, eu avalio essa participação como positiva. Os benefícios podem ser múltiplos. Podemos pensar na estimulação cognitiva, melhora na autoestima, aquisição e produção de novos conhecimentos, além de uma maior socialização”, enumera.

No entanto, o especialista também faz um alerta: é importante não romantizar ou ignorar os riscos da exposição nas redes sociais, já que a vida atrás das telas também pode ser exaustiva, gerando ansiedade e estresse.

“Não vamos ficar romantizando ou editando a realidade dos influencers. Toda exposição é um risco, até porque a vida atrás da tela pode ser bastante exaustiva, provocando muita ansiedade e estresse. Toda ferramenta pode ser utilizada de forma saudável ou não. Daí a importância de uma educação digital voltada para uma ética do cuidado. Há muitos golpes, manipulação, discursos de ódio e fakes [...] Evitar abusos quanto à exposição à tela deve ser um dos cuidados. Então, saber a hora de se desconectar e evitar conteúdos tóxicos contribuem para um impacto mais saudável. A nossa saúde mental agradece quando somos capazes de estabelecer limites entre o online e o off-line”, lembra.

Psicólogo Paulo Roberto Reis diz que participação dos idosos nas redes pode trazer benefícios para a saúde mental
Psicólogo Paulo Roberto Reis diz que participação dos idosos nas redes pode trazer benefícios para a saúde mental | Foto: Arquivo Pessoal

Nicho em crescimento

Em meio a variedade de influenciadores na internet, os idosos vêm conquistando cada vez mais espaço na produção de conteúdo digital, é o que afirma Fátima Pissarra, fundadora e CEO da Mynd, uma das maiores agências especializadas em marketing de influência e entretenimento do Brasil. Apesar dos perfis dos “vovós” ainda serem consumidos, em grande parte, por uma parcela mais jovem da população, a tendência é que esse quadro mude.

“Assim como vários outros nichos que estão surgindo e crescendo no Instagram, os influencers 60+ também estão em expansão. Ainda temos poucos nomes que efetivamente se comunicam com essa faixa etária, já que muitos influenciadores que têm mais de 60 anos acabam falando com o público jovem. Mas levando em consideração que a idade média de vida da população está aumentando a cada ano, acredito que é um mercado promissor e que só tende a crescer, com os idosos se tornando cada vez mais consumidores ativos”, pontua.

Para Fátima Pisarra, CEO da agência Mynd, grupo de influencers 60+ está em expansão
Para Fátima Pisarra, CEO da agência Mynd, grupo de influencers 60+ está em expansão | Foto: Divulgação

Entre os perfis de idosos focados no humor e aqueles que abordam conteúdos específicos e mais independentes, Fátima pontua que há espaço para todos, desde que o influenciador ou influenciadora se sinta à vontade para compartilhar sua vida com os seguidores. Ela destaca ainda que as agências de marketing de influência podem ajudar no manejo das redes sociais e aparelhos digitais para quem tem dificuldade, além de trocar insights sobre o conteúdo mais adequado e auxiliar na venda de espaços publicitários.

“Cada influenciador tem o seu público. O importante é achar o seu nicho, aquilo que seja verdadeiro e que faça com que ele realmente se conecte com os seguidores. Não acredito que o influencer 60+ precise apenas apostar no humor ou falar da relação familiar e com os netos. Eles são indivíduos que possuem as suas carreiras e a sua própria vida. Por isso, acho muito bacana quando vejo perfis que falam de moda, viagens, dicas gastronômicas etc. Afinal, a vida não para aos 60 anos e há muita história para contar ainda”, diz.

Selma Morais quer motivar seguidores através das experiências no esporte
Selma Morais quer motivar seguidores através das experiências no esporte | Foto: Reprodução

O psicólogo Paulo Roberto aponta a importância da presença de idosos como influencers no combate ao etarismo e ao ageísmo. “A partir do momento, que pessoas idosas colocam-se mais nas redes sociais, que é um espaço de interação, revelam que a velhice não é uma doença ou o término da vida, mas um tempo onde a vida pode e deve continuar sendo cultivada através dos afetos, criatividade e, também, das novas tecnologias [...] Desse modo, as influencers do envelhecimento ajudam a quebrar esses tabus, e visibilizam o envelhecimento e a velhice, numa perspectiva inclusiva. É como se recordassem a todos nós, que estamos envelhecendo, que é possível viver saudável, com qualidade de vida e participação social”.

Pelo menos, este é um dos objetivos da “Coroa de Mochila”: motivar seguidores através das experiências e conquistas no esporte. “Quero tirar as pessoas da zona de conforto [...] Uma coisa que me emociona muito também são as reportagens que eu tenho feito para a coluna no Portal A TARDE, porque eu estou mostrando muita gente, muitos projetos de pessoas que não tinham espaço para mostrar seu trabalho, pessoas que estão se sentindo úteis, motivadas. Isso para mim é o combustível que me faz todo dia pensar, escrever, andar, correr e me exercitar”, pontua.

E para quem muda a vida dos seguidores através do humor, como é o caso da Vovó Terezinha e Nicolly, e de Lore Rufis e do Painho, a certeza de estar fazendo bem ao próximo se estende ainda à relação com a própria família.

Seu Aloísio descarta criar um perfil nas redes sociais: “não quero, e nem sei por onde começa”. Ele tem 15 netos e mantém uma relação de muito carinho com Lore. “É um bom relacionamento, me dou muito bem com ela”, diz.

Vídeos de Lore Rufis e do avô fazem maior sucesso na web
Vídeos de Lore Rufis e do avô fazem maior sucesso na web | Foto: Reprodução

Fora das câmeras, Nicolly salienta que ela e a avó são como mãe e filha e destaca a cumplicidade entre as duas. “Foi a minha avó que me criou, então a minha avó é a minha mãe, minha amiga. Minha avó é a mãe que eu conto tudo da minha vida. Eu não guardo nada dela, então tudo da minha vida, ela sabe e me apoia. Minha avó me apoia em tudo e eu apoio ela em tudo também [...] Eu amo a minha avó, ela é a melhor avó do mundo”, declara ela que diz não sentir ciúmes dos outros “netos” da Vovó Terezinha espalhados Brasil e mundo afora.

Apesar do sucesso, Vovó Terezinha não se enxerga como famosa e diz que é a mesma de sempre. Com relação aos planos para o futuro, ela hoje diz que não pensa em abrir nenhum negócio, baseado nas redes, mas se permite sonhar com um cantinho para chamar de seu.

“É incrível. Eu pensei que o seria mais conhecida na minha terra, na Bahia. Mas quando eu cheguei em São Paulo, nossa, me surpreendi. No aeroporto, mesmo quando eu cheguei, misericórdia, eu quase perco meu voo, de todo mundo querendo tirar foto, abraçar [...] Eu agradeço a Deus por eu levar alegria para as pessoas, porque o que eu tenho recebido de mensagens de pessoas dizendo Vovó, você me tirou da depressão…Isso é que eu considero como sucesso”, agradece.

Vovó Terezinha e Nicolly têm relação de mãe e filha
Vovó Terezinha e Nicolly têm relação de mãe e filha | Foto: Reprodução | Instagram

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