Morte de menina no Rio cria embate sobre pacote anticrime de Sérgio Moro | A TARDE
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Morte de menina no Rio cria embate sobre pacote anticrime de Sérgio Moro

Publicado segunda-feira, 23 de setembro de 2019 às 07:36 h | Atualizado em 19/11/2021, 10:16 | Autor: Daniela Amorim e Mariana Durão, com colaboração de Mariana Haubert | Estadão Conteúdo
Ágatha estava dentro de uma Kombi no Complexo do Alemão quando foi atingida por um disparo de fuzil nas costas
Ágatha estava dentro de uma Kombi no Complexo do Alemão quando foi atingida por um disparo de fuzil nas costas -

A morte de uma menina de 8 anos durante ação da PM no Rio na sexta-feira, 20, levou a um embate entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro da Justiça, Sérgio Moro, sobre o pacote anticrime, que prevê punição mais branda a policiais que cometam excessos no combate ao crime. Também é alvo de crítica a política de segurança da gestão Wilson Witzel (PSC), que não se manifestou publicamente sobre o caso até a noite de domingo - só por meio de nota do governo. Ágatha Félix foi enterrada neste domingo, 22, sob comoção e protesto.

Na sexta à noite, Ágatha estava dentro de uma Kombi no Complexo do Alemão, com a família, quando foi atingida por um disparo de fuzil nas costas. A PM diz que policiais trocaram tiros com bandidos. Já moradores contestam a versão. Segundo eles, os PMs atiraram em homens em uma moto e acabaram acertando a criança.

Polícia Civil e Ministério Público vão apurar se o tiro partiu da arma dos PMs. Só este ano, ao menos 16 crianças foram baleadas na região metropolitana do Rio - cinco morreram, diz a plataforma Fogo Cruzado, que monitora tiroteios. O caso motivou críticas de autoridades.

Na tarde de domingo, Rodrigo Maia defendeu, no Twitter, "avaliação muito cuidadosa e criteriosa" sobre o "excludente de ilicitude" - item do pacote anticrime do governo Jair Bolsonaro enviado ao Congresso. O projeto permite ao policial que age para prevenir suposta agressão ou risco de agressão a reféns a interpretação do ato como legítima defesa. Pela lei atual, o policial deve aguardar ameaça concreta ou o início do crime para atuar.

À noite, Moro rebateu no Twitter. "Não há nenhuma relação possível do fato com a proposta de legítima defesa constante no projeto anticrime." Bolsonaro não se manifestou.

"Neste caso específico, o policial não estava amparado pela excludente de ilicitude. Provavelmente irá responder por homicídio culposo porque certamente não queria matar a menina", disse o deputado Capitão Augusto (PL-SP), relator de um dos projetos do pacote. Na terça-feira, 24, o grupo de trabalho na Câmara tenta concluir o parecer sobre a proposta.

Investigação

Em nota, a gestão Witzel disse ter determinado "máximo rigor" na apuração. Parentes de Ágatha e testemunhas já prestaram depoimento. Nesta segunda-feira, 23, serão ouvidos os PMs e suas armas, recolhidas.

Witzel defende abertamente atiradores de elite em operações policiais em comunidades e para abater bandidos. Em 2018, disse ao jornal O Estado de S. Paulo: "A polícia vai mirar na cabecinha e...fogo!". De janeiro a agosto, o total de homicídios dolosos no Estado recuou 21%, mas a letalidade policial subiu 16%, ante o mesmo período de 2018.

Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes também comentou a morte de Ágatha no Twitter. "Uma política de segurança pública eficiente deve se pautar pelo respeito à dignidade e à vida humana."

Emoção

O enterro de Ágatha foi marcado por comoção e protestos neste domingo no cemitério de Inhaúma, zona norte do Rio. "Ela está no céu, o lugar que ela merece", disse o avô, Ailton Félix, ao lado de outros parentes, inconsoláveis. O cortejo até o cemitério reuniu uma pequena multidão. "A polícia matou um inocente. Não teve tiroteio. Foram dois disparos que ele deu. É mentira!", gritava um homem, que seria o motorista da Kombi onde estava a menina. O ator Fábio Assunção também foi ao local e disse que "a sociedade tem de se pronunciar".

No fim de semana, moradores do Complexo do Alemão, onde vivia Ágatha, fizeram protestos contra a violência policial e o uso de helicópteros que estariam disparando contra as favelas.

No domingo, uma operação policial na Cidade de Deus, zona oeste, deixou um morto, de 18 anos, e outro ferido, um morador da comunidade atingido nas costas quando ia à igreja. Segundo a TV Globo, a PM disse que a vítima era um suspeito de tráfico. Os policiais disseram que foram recebidos a tiros.

Também no domingo foram enterrados dois PMs mortos durante ações policiais. Este ano, segundo a corporação, 45 PMs foram assassinados no Rio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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