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ARTES CÊNICAS

Espetáculo infanto-juvenil traz abordagem antirracista

Peça Dandara na Terra dos Palmares acontece aos sábados e domingos no Teatro do SESI

Por Victor Hernandes*

10/05/2022 - 6:05 h
Na peça, uma criança negra sofre bullying por conta do seu nome
Na peça, uma criança negra sofre bullying por conta do seu nome -

De uma forma lúdica e poética, o espetáculo infanto-juvenil Dandara na Terra dos Palmares, organizado pela Companhia Arte Sintonia Companhia de Teatro, estreou no fim de semana passado temporada que se estende por todos os sábados e domingos do mês de maio, no Teatro Sesi RV.

A montagem conta a história da pequena Dandara, uma criança negra que sofre bullying na escola por conta do seu nome. Após sonhar com seus ancestrais, a garota conhece uma heroína negra, que a inspira e a faz ter orgulho de ser quem é.

O texto é um o enredo inédito, escrito pelo jovem autor Antônio Marques, que dedica à sua sobrinha o roteiro da peça. Segundo o autor, a ideia de fazer um espetáculo musical em que uma criança enfrenta preconceito e racismo foi para alertar acerca desta discriminação que crianças negras passam todos os dias.

“Dandara na Terra dos Palmares é na verdade um texto que dedico a Julia Ramos, minha sobrinha de dois anos. Uma criança negra, que não desejo que sofra discriminação pelo fato de ser negra, mesmo sabendo que ela irá passar por isso, infelizmente. O texto tem tudo a ver com esse mundo que vivemos, muitas vezes tão cruel com as nossas crianças”, revela.

Para abordar as questões de racismo, preconceito e discriminação, o espetáculo foi construído de uma forma mais didática, dinâmica, informativa e lúdica. De acordo com o diretor da história, Agamenon de Abreu, a apresentação foi montada desta maneira, pois o objetivo é que esses assuntos cheguem de uma forma mais leve para as crianças que forem assistir.

“A gente pensou justamente em como transmitir essa dureza do tema para o universo infantil. O racismo é um assunto difícil e triste de se abordar. Não é uma condição confortável de jeito nenhum, sobretudo para quem sofre na pele. Na dimensão artística, a gente não vai camuflar, mas vamos buscar elementos para que exista uma reflexão e também uma fruição artística”, explica Agamenon.

Ancestralidade africana

As origens e raízes africanas também fazem parte da história da apresentação. O espetáculo traz parte da trajetória de Dandara dos Palmares, guerreira negra do período colonial brasileiro, que mantém vivo seu legado até os dias de hoje.

“Falar da história do nosso povo negro não é fácil e escrever sobre a luta e a injustiça para crianças e adolescentes é um desafio. No entanto, este texto abriu possibilidades de falar de um personagem real, que liderou um exército. Uma mulher que aprendeu desde cedo a lutar capoeira. É bom contribuir para o protagonismo dessa líder guerreira, que assim como outras personalidades, não tiveram ou ainda não tem o seu reconhecimento merecido”, diz o autor.

A apresentação é dividida em dois momentos específicos. O momento da realidade, onde a pequena Dandara convive com preconceitos e dificuldades reais da vida, e depois o momento onírico, onde a garota sonha com Dandara dos Palmares e conhece a luta dos seus antepassados.

“O espetáculo tem dois planos. O primeiro é o plano real da menina, em que ela vive com as questões todas de preconceito e racismo. Já o segundo é o plano onírico, surreal, do sonho, é onde ela sonha estar em Palmares e encontra sua ancestral Dandara. O espetáculo é dividido nestes dois momentos”, pontua o diretor.

A montagem apresenta também muitas outras referências da luta afro, desde o roteiro, até variados elementos da cultura africana, como explica Antônio.

“O texto fala da luta do povo negro, coloca em questionamento o que mudou da época da Dandara dos Palmares para a Dandara que vive no ano 2022, mas tudo de forma muito leve. A Dandara é conduzida no espetáculo por três animais: o macaco, a onça e o lagarto africano, e o texto brinca com diversas referências ao teatro infantil”, observa.

O cenário e os figurinos também passeiam pela ancestralidade africana. Com diversos significados, esses elementos buscam levar a ludicidade e muita informação para todas as crianças que assistirem.

“O figurino tem muitos elementos e simbologia. Não buscamos ilustrar Palmares, mas no universo do sonho da menina, queremos mencionar o universo palmarino neste sentido. Vai ter umas folhagens, mas com certa abstração, para justamente ampliar essa imaginação. No figurino a gente busca tramas, sobreposições de tecidos, com estampas também de origens africanas. Tem também bonecas africanas que são muito simples, mas com um efeito lúdico muito forte”, ressalta Agamenon.

Elenco variado

Com uma variação de veteranos e iniciantes, duas gerações de artistas baianos se mesclam em Dandara na Terra dos Palmares.

O elenco formado por atores experientes, como Denise Correia, Gilson Garcia e Leonardo Freitas, Diogo Lopes Filho e Natalyne Santos, conta também com as atrizes mirins Yandra Goés e Maria Alice Xavier, que dão vida à pequena / grande protagonista, Dandara.

“É maravilhoso trabalhar com esse elenco, um aprendizado a cada dia de ensaio. Estou muito feliz por interpretar Dandara, uma menina sorridente, alegre, que aprendeu a gostar do seu nome por conta de Dandara dos Palmares. É muito gratificante”, diz Xavier.

Já Denise Correia interpreta dois personagens no espetáculo, a avó da menina Dandara e a própria Dandara dos Palmares, que aparece no sonho da criança. Para a atriz, fazer este personagem é também uma forma de homenagear e dar voz contra todas as formas de opressão.

“Vejo o espetáculo como uma oportunidade de poder refletir sobre a importância da nossa ancestralidade negra, de respeitar e reverenciar aquelas que vieram antes de nós. Nesse aspecto, interpretar Dandara dos Palmares , que foi uma mulher negra, de luta, que preferiu se suicidar à retornar à condição de escravizada, é uma homenagem e um grito de que não podemos sucumbir. Precisamos continuar resistindo, contra todas as formas de opressão”, afirma a artista.

O espetáculo Dandara na Terra dos Palmares marca também as comemorações de mais de duas décadas da Arte Sintonia Companhia de Teatro. Sempre preocupada com a luta do povo negro ao longo de sua existência e resistência, a Companhia já realizou outros projetos que homenageavam personalidades negras. O sambista baiano Riachão, e a eterna Elza Soares foram algumas das personalidades reverenciadas pela Cia.

A Arte Sintonia produz também espetáculos musicais de autores brasileiros e histórias de grandes personalidades. Nestas apresentações, o repertório bastante variado contém musicais para públicos de todas as idades.

Já Dandara na Terra dos Palmares, chega para ser um grande destaque da Companhia nesta temporada, como aponta o autor Antônio Marques.

“Dandara na Terra dos Palmares é um espetáculo que fala de identidade, de aceitação, de existência e resistência. O que eu mais destaco no espetáculo além da possibilidade de as pessoas saberem mais sobre a Dandara, é a possibilidade da empatia com pequenas atitudes e consequentemente contribuir com a evolução do outro”, destaca.

A apresentação pode ser assistida aos sábados e domingos do mês de maio, às 16h, no Teatro SESI Rio Vermelho. Os ingressos custam R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia).

*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.

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Tags:

artes cênicas caderno 2 dandara na terra dos palmares teatro sesi

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