ESTREIA
A série que fez até o elenco chorar: Raul Seixas revive em obra arrepiante da Globo
Nova série traz as facetas do baiano, na semana em que o cantor completaria 80 anos
Por Bianca Carneiro

Ainda que tenha falecido há quase 40 anos, Raul Seixas nunca saiu de cena. Tantos anos depois do auge, o baiano ainda provoca, fascina e bagunça certezas. ‘Raul Seixas: Eu Sou’, nova série biográfica Original Globoplay que estreia nesta quinta-feira, 26, semana em que o cantor completaria 80 anos, tenta dar forma a essa figura que foi homem, mito e contradição ambulante.
Estrelada por Ravel Andrade, a produção explora a vida do icônico pai do rock brasileiro com um recorte mais temático do que cronológico, no qual revive sua trajetória artística e pessoal e dá voz aos sucessos, às dores e às contradições que marcaram seu legado. Criada por Paulo Morelli e dirigida por ele em parceria com o filho, Pedro Morelli, a obra é dividida em oito episódios, que mostram Raul desde menino, ainda em Salvador, onde descobriu Elvis Presley e decidiu que mudaria o mundo com um violão nas mãos. E segue até os últimos dias, quando sua própria “Sociedade Alternativa” já não oferecia tanto abrigo.
O diretor Paulo Morelli destacou que a série sobre Raul Seixas rompeu com o formato tradicional das biografias musicais. "Muitas vezes é o começo da trajetória e com a fama, a série acaba, o filme acaba. Mas os eventos da vida do Raul eram tão inusitados, tão incríveis que a gente rompeu esse padrão, esse critério de fazer um recorte. O nosso recorte é mais temático. Então, a gente tem o Raul com 10 anos de idade e vai até a morte dele. A gente pega a vida inteira dele, tentando não deixar muita coisa de fora. Parecia que todos os eventos e as cenas da vida dele eram muito interessantes. A gente tinha oito episódios para narrar, era muito tempo, equivalente ao tamanho de quatro longas."
Além de Ravel, o elenco reúne traz também nomes como Julio Andrade, Cyria Coentro, Amanda Grimaldi, Caroline Abras, Julia Stockler, Chandelly Braz, Camilla Molica, Jaffar Bambirra, João Pedro Zappa, Gabriel Wiedemann, Vitor Novello e Rodrigo Vidal.
Ravel Andrade é Raulzito
No papel principal, Ravel Andrade se entregou a um processo intenso de construção de personagem. O ator, que também é músico, toca e canta todas as cenas ao vivo, sem dublagem, uma escolha essencial para manter a fidelidade à presença musical de Raul.
“No dia 23 de dezembro de 2022, fiquei sabendo que faria o Raul. Paulo e Pedro (Morelli) me ligaram. Foi uma das grandes felicidades da minha vida, uma notícia inesquecível. Lembro que no dia 24 de dezembro, ganhei um presente de Natal da minha companheira, Andréia (Horta, atriz), que era a biografia de Raul Seixas, escrita por J.B. Medeiros. A biografia se chama Não Diga Que a Canção Está Perdida. A minha preparação começou nesse dia”, contou, em entrevista exclusiva ao Portal A TARDE.
Ravel também destaca o cuidado com o lado espiritual e filosófico do cantor:
Raul era um filósofo, pensava muito sobre o ser humano e sobre a vida. Meu trabalho foi físico, mas também precisei me conectar com esse astral, com as letras das canções e com as referências de Raul
Ao relembrar cenas marcantes, o ator se emociona especialmente com a reencenação do último encontro de Raul com Paulo Coelho: “O mais marcante para mim foi o show que reproduzimos de 1989, que foi o último encontro de Raul Seixas e Paulo Coelho. [...] Lembro que nos intervalos eu ia para um estacionamento onde estávamos filmando e ficava chorando.”
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As polêmicas de Raul na cena

A série também retrata polêmicas do artista, entre elas, as rupturas familiares, sobretudo com suas filhas, que mal conviveram com o pai. Ravel afirma que a produção não faz ‘chapa branca’ e diz que o tema da paternidade lhe tocou especialmente, já que no início das gravações, ele e a esposa haviam perdido um bebe. Hoje, ele é pai de Yolanda, de apenas 7 meses.
“É uma série que não é chapa branca. Ela mostra realmente o que aconteceu nessas relações. A gente não tenta passar um pano para o Raul. Ele teve cinco mulheres, foi casado cinco vezes e teve três filhas, e elas também ajudaram muito a gente a contar essa história [...] Não que ele fosse um péssimo pai, mas o caminho que ele escolheu acabou o afastando dessas filhas. E isso gerou nele um buraco enorme.”
E por falar em família, para Júlio Andrade, irmão do ator, e pai dele na série, Ravel sempre carregou o espírito de Raulzito. Estrela de produções como ‘Betinho: No Fio da Navalha’ - onde Ravel o interpretou na fase mais jovem - o global contou que chorou ao ver a caracterização.
“O Ravel sempre foi Raul, desde molequinho. Ele nasceu Raul, com o violão debaixo do braço. Eu que dei o primeiro violão para ele. Um violão azul, todo pintado. E ele não largou mais [...] Na primeira cena que vi dele atuando, eu tive que ir embora para não desconcentrar. Comecei a chorar muito.”
O produtor Pedro Morelli ressaltou a importância de ter um protagonista que domina de verdade os instrumentos musicais, o que trouxe naturalidade e profundidade às cenas. "Isso fez toda a diferença. Tanto nas cenas de show, que você vê que o cara sabe pegar o violão, a guitarra, já faz diferença, mas principalmente nas cenas de composição. A música ia sendo criada naquela hora, eles errando alguns caminhos improvisadamente, tanto de melodia quanto de letra. E isso só foi possível porque a gente tinha um músico como nosso protagonista, que estava com o violão na mão, conduzindo a cena. E acho que são cenas muito especiais, que a gente ficou muito feliz e trazem essa liberdade."
Vozes que cercaram Raul ganham destaque
Mas se Raul era uma metamorfose ambulante, aqueles que o cercaram foram parte essencial dessas transformações. Raul Seixas: Eu Sou também dá voz às figuras que viveram ao lado do artista em momentos decisivos: mulheres, amigos, parceiros musicais e familiares que, cada um à sua maneira, ajudaram a compor o quebra-cabeça do marido, pai, amigo, cantor e compositor.
Amanda Grimaldi interpreta Edith, a primeira esposa de Raul Seixas, figura central na fase inicial da série. Ela destaca o peso emocional de reviver o amor e o abandono: “A série mostra bem esse amor puro e jovem, mas que ao longo dos anos foi se perdendo nas sombras dos vícios e dos exageros. Foi bastante intenso.”
Já Caroline Abras, que dá vida a Glória Vaquer, sua segunda mulher e figura que marca o mergulho de Raul em sua fase mais mística, diz que após fazer a série, passou a enxergar outro significado para a música ‘A Maçã’.
“Me marcou muito, primeiro porque o Ravel tocava de um jeito que sempre me emocionava, mas também porque a música marca um conflito muito profundo do Raul artista querendo viver e experimentar a liberdade versus o Raul pai, marido.”
Baiana no elenco, Cyria Coentro, que interpreta Dona Maria Eugênia, mãe de Raul, fala sobre a emoção de reviver momentos íntimos da vida do ídolo:
“Eu sou absolutamente fã e apaixonada por Raul Seixas desde que me entendo por gente, soube da morte dele pelo rádio quando estava almoçando em um restaurante, comendo um prato que eu amava, parei de comer e fui pra casa, chorar e ouvir os discos. Ser convidada para ser a mãe dele nesta série foi uma alegria e uma honra imensa. O que mais me chamou atenção foi a vida cotidiana, a relação dele carinhosa com a mãe e com o irmão, o respeito dele pelo pai. Gostei de ter a ilusão de vivenciar esses momentos íntimos e domésticos.”
Paulo Coelho aparece na série?

João Pedro Zappa dá vida a Paulo Coelho, parceiro criativo fundamental na trajetória de Raul e figura central em alguns dos momentos mais intensos da série. Curiosamente, o ator optou por não buscar contato direto com o escritor durante o processo de construção do personagem. A decisão foi consciente: Zappa explica que o Paulo Coelho retratado na série é muito diferente do homem que o público conhece hoje.
“O Paulo Coelho que a gente faz na série é um personagem diferente do Paulo de hoje. [...] Ele não tinha escrito nenhum dos livros ainda, ele escrevia, editava revistas, ele tinha uma revista”, conta o ator.
Para dar vida a esse “outro” Paulo Coelho, jovem, provocador e ainda longe da fama literária, Zappa mergulhou em um processo de observação profunda. Assistiu a entrevistas antigas, leu livros que o autor lia na época, como A Erva do Diabo e o Bhagavad Gita, e absorveu seus gestos, falas e posturas quase como se estivesse estudando uma máscara ritual. Além disso, o vínculo pessoal e artístico com Ravel Andrade, seu amigo de mais de uma década, ajudou a construir a intensidade das cenas entre Raul e Paulo. “O meu papel era defender aquele Paulo Coelho, por mais que ele possa ter críticas dele mesmo sobre ele naquela época.”
Onde assistir a série de Raul Seixas?
‘Raul Seixas: Eu Sou’ já está disponível para streaming na Globoplay. Apesar de ter estreado hoje no Brasil, a produção da O2 Filmes já acumula um marco: foi selecionada para a competição oficial do festival Series Mania, na França, feito inédito para uma série brasileira, mas que reflete o caráter único do Maluco Beleza: um artista que quebrou padrões e atravessou gerações com sua personalidade singular e visionária.
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