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O benefício de ICMS para o setor de alimentação

O benefício de ICMS sobre alimentos produzidos pelos estabelecimentos continua para o setor de alimentação

Publicado domingo, 07 de abril de 2024 às 13:34 h | Atualizado em 07/04/2024, 14:18 | Autor: Marcelo Nesser Nogueira Reis e Roberta de Almeida Maia Broder
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Um dos principais assuntos da semana na capital baiana, sem dúvidas, foi o aumento de ICMS que será suportado por alguns estabelecimentos de comercialização de alimentos, especialmente as “delicatessens”, confeitarias, panificadoras e restaurantes.

A repercussão ganhou maior proporção em virtude de circular interna de uma famosa rede de “delicatessen” de Salvador noticiando o aumento da alíquota de ICMS incidente sobre seus produtos de mercearia de 4% para 20,5%. No comunicado, que circulou nas redes sociais e grupos de whattsapp, o estabelecimento lamenta o aumento e informa que seus produtos terão os preços majorados em razão da alta na carga tributária.

Importante esclarecer que o aumento, contudo, será sentido pelas “delicatessens”, panificadoras, confeitarias e alguns restaurantes apenas para os produtos que comercializam que não sejam fabricados em seus estabelecimentos.

Trata-se de alteração da redação do art. 267, VI do Regulamento de ICMS, levada a efeito pelo Decreto nº 22.453, de 14 de dezembro de 2023, que restringiu o benefício de redução de base de cálculo das operações realizadas por restaurantes, churrascarias, pizzarias, lanchonetes, bares, padarias, pastelarias, confeitarias, doçarias, bombonieres, sorveterias, casas de chá, lojas de “delicatessen”, serviços de “buffet”, hotéis, motéis, pousadas, fornecedores de salgados, refeições e outros serviços de alimentação.

A redação anterior do dispositivo que instituiu o benefício era ampla e abrangente, e concedia redução de base de cálculo para as operações, sem restrição, realizadas pelos supramencionados estabelecimentos, a fim de que a carga tributária suportada fosse equivalente a 4%.

A nova redação dada pelo Decreto nº 22.453/2023, todavia, restringiu o benefício para contemplar as operações “exclusivamente com alimentos e bebidas preparados neste Estado pelo próprio contribuinte em seus estabelecimentos”, de forma que os produtos de mercearia como geleias, bebidas, farinhas, enlatados, mantimentos, frios e produtos importados passam a sofrer a alíquota comum de 20,5%.

A justificativa do Estado para a majoração da carga tributária é evitar a concorrência desleal, posto que as “delicatessens” que vendem produtos diversos além dos produzidos em seu estabelecimento estavam aplicando o benefício em todas as operações que envolviam produtos de mercearia, importados, frios, proteínas, bebidas e até mesmo produtos de limpeza, gerando uma concorrência desleal com os demais comerciantes que não possuem “delicatessen” e panificadora com produção própria.

Os mercados e comerciantes em geral suportam a incidência de ICMS sobre suas operações no equivalente a 20,5%.

A intenção do legislador originário ao conceder o benefício para setor específico de alimentos foi estimular a comercialização de alimentos de fabricação própria, de forma que a alteração da lei teve por efeito afastar benefício fiscal que feria o princípio da isonomia entre os comerciantes, gerando vantagem injustificada à parcela de estabelecimentos.

A majoração da carga tributária é sempre sofrível e lamentável, ainda mais em nosso País que já sofre com a pecha de possuir uma das maiores cargas tributárias do mundo sobre o consumo, entretanto, a própria Constituição Federal, no inciso III do art. 150, veda o “tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente”, devendo ser preservada a isonomia entre os contribuintes em situação igual.

Destarte, se por um lado o Estado concede benefício para estimular a fabricação própria de alimentos, por outro ele onera os restaurantes, padarias e “delicatessens” ao continuar exigindo, por exemplo, a antecipação parcial de ICMS sobre produtos adquiridos de outros Estados que são utilizados como insumo no processo de fabricação do alimento.

A cobrança do referido ICMS “antecipação parcial” onera sobremaneira os referidos Contribuintes, especialmente aqueles optantes do Simples Nacional, que não podem compensar este imposto recolhido.

Isto porque os restaurantes, “delicatessens”, confeitarias, panificadoras e lanchonete não revendem, individualmente, a carne de hamburguer, o pão, o queijo, salmão e carnes vindos de outros Estados. Tais produtos são utilizados como matéria prima, transformados, por exemplo, em um sanduíche, uma pizza etc.

Por esse motivo, a aquisição de insumos de outros Estados não é passível de cobrança de ICMS “antecipação parcial”.

É que a antecipação parcial do ICMS é devida nas “aquisições interestaduais de mercadorias para fins de comercialização” (art. 12-A da Lei nº 7014/1996), não sendo exigível nos casos em que os produtos adquiridos de outros Estados sejam destinados para uso interno de sua produção.  

Nesse sentido é o entendimento consolidado do Tribunal de Justiça da Bahia pelo não cabimento da cobrança de ICMS antecipação parcial sobre insumos no processo de produção de alimentos, tendo sido proferidas liminares, ratificadas por sentenças e mantidas em segunda instância.

Para a cobrança de ICMS antecipação parcial sobre os ingredientes utilizados nos alimentos fabricados pelos restaurantes, “delicatessens”, confeitarias e panificadoras, a solução é a busca de proteção judicial a fim de afastar a cobrança ilegal e desonerar seu processo de produção.

Marcelo Nesser Nogueira Reis, Sócio e Coordenador Tributário do Escritório Nogueira Reis Advogados.

Roberta de Almeida Maia Broder, sócia do Escritório Nogueira Reis Advogados, especialista em Negociação e Resolução de Conflitos pela Harvard Law School e Mestre em Direito Profissional Tributário pela FGV, São Paulo.

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