A nova tributação sobre dividendos: o que realmente muda a partir de 2026
Coluna Direito e Tributos desta sexta-feira, 7

Desde 1996, quando entrou em vigor a Lei nº 9.249/95, os dividendos passaram a ser isentos de Imposto de Renda na pessoa física. O desenho jurídico daquela época operava com base no princípio da não duplicidade de tributação: se o lucro já havia sido tributado dentro da pessoa jurídica (IRPJ + CSLL), a distribuição ao sócio não deveria ser novamente onerada. Por quase três décadas, esse modelo foi considerado uma das poucas áreas de estabilidade do sistema tributário brasileiro.
Esse ciclo, entretanto, está em processo de encerramento. O Projeto de Lei nº 1.087/2025, aprovado na Câmara dos Deputados e atualmente em análise no Senado, restabelece a tributação de dividendos a partir de 1º de janeiro de 2026, por meio de retenção de 10% de IRRF sobre valores distribuídos acima de R$ 50.000 por mês. A medida não altera a sistemática do IRPJ ou da CSLL, mas introduz tributação complementar no beneficiário final do lucro.
Segundo a exposição de motivos do projeto, a proposta está diretamente associada à ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física, que passa para R$ 5.000 mensais — uma renúncia fiscal que o governo pretende compensar por meio da tributação de rendas de capital. Essa lógica aproxima o Brasil de modelos adotados em diversos países da OCDE, onde a distribuição de lucros sofre tratamento dual: primeiro na pessoa jurídica, depois na pessoa física, com alíquotas moderadas.
Entretanto, o PL faz distinções relevantes. As empresas do Simples Nacional permanecem isentas, o que reforça o caráter de política pública voltada ao incentivo de micro e pequenas empresas. Essa isenção, contudo, não é estrutural: ela é condicional ao enquadramento. Se a empresa ultrapassar o limite de receita bruta e migrar para outro regime, a tributação torna-se obrigatória. Ou seja, não se trata de uma blindagem permanente, mas de um benefício restrito ao porte empresarial.
Para as empresas do Lucro Presumido, a mudança exige atenção contábil. A legislação atual já prevê que dividendos distribuídos acima do lucro contábil ajustado podem ser tributados como remuneração disfarçada. Com a nova regra, essa preocupação se intensifica: a coexistência entre presunção fiscal e lucro societário passa a ter efeitos financeiros reais.
No Lucro Real, o impacto é ainda mais estratégico, pois coloca em jogo as escolhas de política de capital. Reinvestimento, distribuição de dividendos, utilização de juros sobre capital próprio (JCP) — instrumento cuja dedutibilidade segue em discussão no Congresso — e reorganizações societárias passam a integrar decisões de governança, não apenas de execução contábil.
Esse movimento orgânico leva o debate dos dividendos para um patamar mais amplo: não se trata apenas de carga tributária, mas de alocação de capital, sucessão patrimonial, valuation e relação empresa-investidor. A distribuição de lucros deixa de ser ato meramente operacional e passa a ser instrumento jurídico-financeiro com repercussões empresariais. Aqui reside um ponto crítico: o fim da isenção não encerra a eficiência tributária — apenas redefine as premissas sob as quais ela é construída.
Em síntese, o Brasil não está extinguindo a distribuição de lucros — está recuperando capacidade tributária sobre rendas de capital, em linha com padrões internacionais, porém com moderação. A mudança não inviabiliza a distribuição de dividendos, mas exige método, previsibilidade e planejamento jurídico. O empresário que, até aqui, distribuía lucros automaticamente, agora terá que definir quando distribuir, quanto distribuir e como distribuir.
A partir de 2026, a competitividade não estará mais com quem “não paga imposto”, mas com quem escolhe a forma mais inteligente de pagar. A era da distribuição automática termina; a era da distribuição estratégica começa.
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