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Febraban lança projeto para valorizar diversidade

Publicado quarta-feira, 02 de abril de 2008 às 21:07 h | Autor: Agencia Estado

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) lançou hoje (02), em São Paulo, um programa para valorizar a diversidade nas instituições financeiras do País, com base em ações educativas e na divulgação de experiências que deram certo nos bancos associados à entidade. O pontapé inicial do projeto é o Mapa da Diversidade, um censo com 400 mil bancários, de 16 instituições, para identificar as relações entre ascensão profissional e gênero, etnia e porte de deficiências, que começa na próxima quarta-feira (09). A partir daí, será consolidada, gradualmente, uma política inclusiva no setor.
O presidente da Febraban, Fábio Barbosa, abriu o evento de lançamento falando sobre a importância do tema, que, pretende ele, entre no dia-a-dia dos bancos. "Igualdade de oportunidades é sinal de uma sociedade evoluída", disse. "E o Brasil ainda tem muito o que evoluir." Para Barbosa, uma equipe com pessoas de diferentes perfis trabalha melhor. "A diferença traz a riqueza, pois as visões de mundo são complementares."
A expectativa da Federação é inspirar iniciativas semelhantes em outros setores da economia. "Só o sistema financeiro é pouco, mas, se cada um cuidar do seu redor, podemos mudar muito", afirmou Barbosa. O segmento financeiro emprega cerca de 2% de toda a força de trabalho do País.
Segundo o diretor de Relações Institucionais da Febraban, Mário Sérgio Vasconcelos, o modelo, construído pela entidade e organizações parceiras desde o início do ano passado, ficará a disposição de outros setores. "As experiências não são exclusivas do setor. O que aprendermos, vamos compartilhar, e quem quiser dividir algo conosco será bem-vindo."
A coordenadora da Subcomissão de Diversidade da Febraban, Maria Cristina Carvalho, diz que, em um levantamento preliminar, observou haver entraves para a igualdade dentro dos bancos. "As mulheres, por exemplo, não ascendem a posições de liderança tão rápido quanto os homens." Maria Cristina disse que o programa vai acelerar a mudança de cultura nas instituições financeiras. "Hoje tivemos um marco, pois o programa insere o tema na nossa agenda do dia-a-dia."
PIONEIRISMO - A diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil, Laís Wender Abramo, que participou da elaboração do programa, destacou a empreitada como pioneira. "Não temos conhecimento de iniciativa voluntária como essa em nenhuma outra federação da importância da Febraban", disse. "É um programa ambicioso."
O relatório global da OIT Igualdade no trabalho - enfrentando desafios, divulgado ano passado, apontou desigualdades "muito profundas, sérias e difíceis", disse Laís. "Mulheres e negros estão em desvantagem em qualquer indicador de mercado de trabalho." A diretora relatou que o estudo apontou a importância das iniciativas do setor privado. "O governo tem um papel central, mas a atuação dos atores sociais é fundamental. É louvável que Febraban tenha tomado essa iniciativa."
Para a diretora-executiva do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert) - que coordenará o censo dos bancários -, Cida Bento, o projeto expande as discussões sobre diversidade. "A experiência é singular por sua envergadura, pois não se restringe às áreas de Recursos Humanos ou Responsabilidade Social", disse, lembrando da importância da adesão dos funcionários. "Não haverá avanços para as mulheres sem os homens, para os negros sem os brancos, para os homossexuais sem os heterossexuais."
PRIMEIRO PASSO - A decisão da Febraban atende a uma luta antiga dos movimentos sociais, defendeu o advogado Cleyton Borges, do setor de Políticas Públicas e Ações Afirmativas do Educafro, ONG que oferece cursos pré-vestibular comunitários. "Fizemos uma enorme força para que isso acontecesse e vamos continuar cobrando soluções", disse Borges. "Vemos a iniciativa da Federação como extremamente positiva, desde que entendida como um primeiro passo de muitos outros, urgentes e necessários."
Desde 2003, a Educafro promove manifestações, ocupações de agências bancárias e ações judiciais, com representações ao Ministério Público do Trabalho (MPT), para denunciar casos de racismo no setor. Segundo o advogado, a discriminação ganha contornos graves nos bancos. "É um problema de todo o mercado de trabalho, porém acentuado nos bancos e no comércio." Borges disse que os empregadores evitam contratar negros para funções que exigem contato com o público. "Mesmo 120 anos depois da abolição da escravatura, persiste no Brasil o preconceito."
O Educafro defende a adoção de cotas para os negros nas empresas. Hoje, pela lei, há reserva de vagas apenas para portadores de deficiências físicas. "É uma das medidas de melhor resultado e maior impacto", disse. "Já há sindicatos que colocaram na convenção coletiva da categoria a aprovação de cotas e lojas reservam até 20% dos postos para negros."
O censo no setor bancário deve indicar, segundo Borges, a necessidade de estabelecer cotas para mulheres e negros nas empresas. "Os bancos, um setor conservador, dão um passo anterior, que é o mapeamento", disse. "As cotas são necessárias para causar impacto imediato de mudança no perfil dos funcionários."
Para a integrante do Educafro, Zilá Ferreira, o censo deve apontar ainda para a necessidade de ações direcionadas às mulheres negras, que, em sua opinião, vivem o preconceito de forma mais dura. "No mercado de trabalho, a mulher negra é estereotipada como aquela que limpa a mesa das decisões", disse. "Continuamos sendo invisíveis e, para que alcancemos a ascensão profissional, vai ser necessária muita luta."
PRIORIDADE - O Mapa da Diversidade ficará restrito à análise de três aspectos: gênero, etnia e deficiência. Por enquanto, outras características que motivam preconceito, como idade, homossexualidade e HIV positivo, ficam de fora do censo.
"Não era possível abraçar todos os temas com a mesma intensidade dentro do questionário", explicou Vasconcelos, da Febraban. "Escolhemos os assuntos mais relevantes para começar, mas isso não quer dizer que outros não sejam tratados no programa." Os temas serão trabalhados em cartilhas e campanhas dentro dos bancos.
No caso dos homossexuais, não houve aprovação das organizações de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros (GLBT) para que os funcionários respondessem questões sobre sua orientação sexual. "Consultamos diversas instituições ligadas ao tema e não há consenso sobre como tratar isso. São questões mais delicados e precisamos de um processo de maturação antes de chegar a elas."

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