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Corridas de rua em Salvador: histórias de superação

Atualmente, o clube do profissional de Educação Física tem 200 alunos

Por Pedro Hijo

05/05/2024 - 6:07 h
Flavio Simas é profissional de Educação Física e dono de um clube de corrida
Flavio Simas é profissional de Educação Física e dono de um clube de corrida -

O advogado Augusto Cruz, 54, se tornou corredor de rua para combater a insônia. A enfermeira Stella Menezes, 63, introduziu o exercício na rotina para amenizar dores causadas por um remédio de uso contínuo. O jornalista Gabriel Soares, 36, encarou a corrida de rua como uma aliada durante a pandemia de Covid-19. E o profissional de Educação Física, Flavio Simas, 38, voltou a correr depois de um grave acidente.

Com diferentes idades e histórias, Augusto, Stella, Gabriel e Flavio são moradores de Salvador que encontraram na corrida de rua uma via de superação. A cidade tem vivido um crescimento do esporte nos últimos anos, com a formação de grupos de corrida e do circuito de provas do ramo patrocinadas por instituições e empresas, como Banco do Brasil, a rede de lojas Netshoes e a marca de produtos de exercício físico Track&Field.

Autor de dois livros sobre corrida, Augusto Cruz começou no esporte há 27 anos. “O primeiro benefício importantíssimo, para mim, foi a melhora do meu sono, acordar cedo para gastar energia em uma atividade aeróbica me ajudou muito”, conta. Sanada a dificuldade que levou Augusto ao esporte, ele entendeu, mais tarde, que a prática fez mais por ele: “Graças à corrida, estou vivo”.

Há três anos, o advogado descobriu por um exame de rotina que estava com uma artéria com risco de entupimento. Ele foi submetido a um cateterismo, procedimento para desobstrução do vaso sanguíneo, e a instalação de uma prótese para recuperar o fluxo de sangue, um stent. “Não fosse pelo meu estilo de vida, talvez não estivesse mais aqui. E, mesmo com o stent, continuo correndo longas distâncias”, comemora Augusto.

Corredor de maratonas, o advogado lançou o livro Um estilo de vida, em 2015, para contar a relação dele com o esporte. No mês passado, o autor publicou a segunda obra, Triação 20 Anos: Sonhos, corridas e negócios, sobre a empresa baiana Triação, que orienta corredores. Com todas as conquistas que teve no esporte, Augusto se tornou um embaixador da corrida. “Minha primeira ‘vítima’ foi minha esposa”, brinca. “Primos, amigos e até colegas de trabalho acabaram se contagiando”.

Para Flavio Simas, o hábito de levar pessoas a praticar o esporte é um negócio. Sócio do clube de corrida Authentic Run, criado em Salvador há 20 anos, ele conta que a entrada na empresa se deu pelo interesse no esporte. “Colei nos treinos de corrida e, um ano depois, comecei a trabalhar junto”, conta Flavio, que se tornou gestor do clube. “Montamos um escritório, onde a gente prescrevia os treinos, entrevistava os alunos e buscava patrocínios”.

Atualmente, o clube do profissional de Educação Física tem 200 alunos. “Tem o pessoal que busca a corrida como forma de emagrecimento e acaba se apaixonando; há os que têm um interesse maior e os que fazem maratona”. Além das aulas em Salvador, os alunos já participaram de provas com o clube em outras cidades do Brasil e até em outros países, como Portugal, Holanda e Argentina.

Flavio avalia que, para ele, a corrida simboliza resiliência. “A minha cabeça é muito mais forte do que eu imaginava”, diz. Assim como Augusto, o empresário superou uma experiência com risco de morte recentemente. Há quatro anos, ele sofreu um acidente praticando jiu-jítsu em que rompeu todos os músculos da perna e um ramo da artéria femoral, a segunda maior do corpo humano.

O profissional de Educação Física ficou hospitalizado por 26 dias, sendo 10 na Unidade de Terapia Intensiva (UTI): “Foi muito traumático”. Depois de dois anos, ele já havia retomado as práticas de musculação e jiu-jítsu, mas não conseguia voltar às corridas. “Eu sentia muita dor, minha perna estava muito dura, minha coluna doía. A corrida era um esporte que me desafiava”, lembra.

“Coloquei na minha cabeça que eu ia conseguir correr e, aos poucos, fui me preparando”, diz Flavio. Há um ano e meio, ele participou da primeira prova depois do acidente, uma corrida de 10 km. “Foi fantástico. Era a única coisa que eu não conseguia fazer e consegui”, celebra. Agora, ele se prepara para uma corrida de 21 km, no Rio de Janeiro. “Estou bem ansioso”.

O profissional explica que a condição física resultante de décadas de autocuidado ajudou na recuperação. “A minha preparação física privilegiada foi fundamental para eu não perder a perna e ficar vivo”. Já para a enfermeira Stella Menezes, uma das alunas de Flavio, a corrida entrou na rotina de exercícios físicos depois de um tratamento oncológico.

“Há um ano, tive o diagnóstico de câncer, operei, fiz radioterapia e faço uso de um medicamento que tem como efeitos colaterais dores articulares”, conta Stella. A enfermeira recebeu como recomendação das médicas a prática de atividade física regular para diminuir as dores. “A partir daí, me motivei e, com o incentivo de sobrinhos que estavam num clube de corrida, agreguei o esporte à minha rotina”.

Para Stella, a corrida traz sensação de liberdade, além de melhorias na saúde física e emocional. A enfermeira já participou de provas de até seis quilômetros. “A minha meta até o final do ano é correr 10 km”. Ela conta, no entanto, que não teve um bom resultado na primeira tentativa nas corridas: “Cheguei a praticar sem orientação e me lesionei”.

O jornalista e corredor Gabriel Soares reforça a importância do acompanhamento profissional. Enquanto se prepara para uma corrida de 36 km, no próximo dia 19 de maio, ele tem orientação de nutricionista, fisioterapeuta e professores da Triação. “A preparação para uma prova começa muito tempo antes do dia D, às vezes, três meses ou mais”, explica Gabriel.

Ele começou a praticar corrida há 12 anos, mas foi durante a pandemia de Covid-19, entre 2020 e 2022, que transformou a atividade, antes esporádica, em prática frequente. “Busquei a corrida por ser um esporte praticado ao ar livre e sozinho. Foi assim que ela se fez mais presente em minha vida, como aliada no enfrentamento à pandemia”. Atualmente, Gabriel treina três vezes por semana, somando até 40 km.

Viagens

Imagem ilustrativa da imagem Corridas de rua em Salvador: histórias de superação
| Foto: Rafaela Araújo/ Ag. A TARDE

Além de corridas em Salvador, o jornalista participa de provas em outras cidades, como Rio de Janeiro, Porto Alegre e Muritiba, no Recôncavo Baiano. “O que desperta a vontade de correr em outro lugar é explorar circuitos diferentes, ver paisagens que não estou habituado, interagir com pessoas de outras realidades e desafiar o meu corpo”. Na capital gaúcha, por exemplo, Gabriel correu no frio de 9ºC.

Augusto Cruz conta que aproveita as viagens que faz com a esposa para participar de provas em casal no Brasil e em outros países. Em destinos nacionais, os dois já correram em São Paulo, Rio de Janeiro e Florianópolis. E, fora do país, em Dubai, Kuala Lumpur, São Francisco, Nova York e Berlim. “Independentemente de prova, para onde viajo, a lazer ou a trabalho, levo um par de tênis”, diz o advogado.

Na experiência que teve numa maratona em Kuala Lumpur, em 2017, Augusto aprendeu a enxergar a corrida como parte da vida e não exclusivamente como um exercício para desopilar. “Na altura do quilômetro 12, passamos por uma mesquita e os alto-falantes ecoavam a Adhan, o chamado para a oração”. Nesse momento, conta o advogado, um corredor parou, estendeu um tapete de oração e se ajoelhou para rezar.

“Foi um momento muito bonito e repleto de símbolos”, reflete. Augusto entendeu ali como a corrida coexiste com outros aspectos da vida. “Para mim, corrida, trabalho, família, amizades, literatura e viagens estão no mesmo pacote que integra a minha vida”. O advogado considera que, com a corrida, ele aprendeu a ter mais resiliência.

Benefícios e dicas

Gabriel afirma que a corrida traz benefícios antes, durante e depois do exercício. Antes, por conta da preparação. Durante, pelo desprendimento das obrigações do dia. “É como meditar em movimento, você se conecta muito consigo durante a corrida”, complementa. E depois, pelo bem-estar promovido pelo exercício físico: “A corrida não deixa que o cansaço diário me transforme em uma pessoa prostrada, pouco ativa”.

Além do acompanhamento profissional sugerido por Stella e Gabriel, Flavio Simas recomenda disciplina e constância na prática da corrida. O profissional de Educação Física destaca que começar é difícil, mas que é preciso passar da fase inicial para transformar o esporte em prática. “É cansativo, tem um esforço envolvido, mas todo mundo quer ter um corpo mais saudável e, para isso, é preciso disciplina, constância e regularidade”, diz Flavio.

Franqueado das lojas da Track&Field na Bahia, o empresário Matheus de Medeiros, 32, organiza as corridas da marca no estado. Como dica aos iniciantes no esporte, ele afirma que “a grande sacada da corrida é entender que não existe primeiro lugar”. “Pode ser uma prova com cinco mil pessoas, cada uma está correndo atrás de um objetivo e todas podem ser ganhadoras”, elabora.

Em 2024, a Track&Field deve organizar seis provas em Salvador, no total. A última, no mês passado, reuniu três mil corredores. A próxima será no domingo, 12, no bairro do Rio Vermelho, em Salvador. “As provas estão cheias como nunca”, diz Matheus. No aplicativo de celular em que os participantes se inscrevem, diz o empresário, o número de usuários saltou 52% entre 2022 e 2023.

A maioria das corridas coordenadas pela marca acontece em torno de shoppings, parceiros das lojas. Já Flavio Simas recomenda como local para a prática do esporte a Orla e a Praça dos Eucaliptos, no bairro do Caminho das Árvores. Essa experiência de correr em Salvador, diz Augusto Cruz, mudou a relação dele com a capital baiana: “Eu via a cidade pela janela de meu carro. Passei a me sentir parte de Salvador. A relação do corredor de rua com a cidade é muito intensa e respeitosa”.

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Tags:

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