MUITO
Dança para todos nos cursos livres da Ufba
Inscrições de cursos custam R$ 60 por quinzena, R$ 100 por mês ou R$ 300 por trimestre
Por Gilson Jorge

Mais do que impulsionar uma carreira como dançarina ou dançarino, cursos livres de dança costumam ser uma boa chance de socializar e de se aproximar de outros universos através do corpo. É apostando nisso que há 13 anos a Escola de Dança da Ufba oferece turmas em diversos estilos musicais. Também com o propósito de chamar para dançar pessoas que, normalmente, não sairiam do seu cantinho, por acreditar que a universidade é um mundo muito distante do seu.
A partir de abril, serão oferecidas turmas de dança de salão, danças urbanas (com ênfase no hip hop), dança contemporânea, ballet clássico e outras onze formas de se mover na pista ou no tablado. As inscrições de quase todos os cursos custam R$ 60 por quinzena, R$ 100 por mês ou R$ 300 por trimestre. A exceção é o curso livre de extensão Dança para todos, que usa também elementos terapêuticos e é completamente gratuito.
Para entender melhor as dinâmicas dos cursos, ouvimos quatro professores, que contam suas experiências com a dança e explicam por que esperam que você tenha ânimo para chacoalhar o esqueleto e tirar novos amigos para dançar.
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A sul-matogrossense Camila Nantes começou a fazer dança de salão em sua cidade natal, Campo Grande, em 2012, aos 13 anos, para acompanhar a sua mãe, que dançava em academias e clubes e não tinha quem tomasse conta da filha no primeiro dia de aula. "Minha mãe disse que eu teria que ir com ela. Eu fui e nunca mais parei", conta a jovem, que ainda adolescente passou a acompanhar a mãe, a psicóloga Neide Machado, em bailes, serestas e pagodes.
Antes de praticar dança de salão, Camila frequentou uma escola, que era uma ONG e tinha artes cênicas. Lá, a então adolescente teve contato com danças praticadas nas regiões de fronteira, como a polca paraguaia e o chamamé, e aprendeu semelhanças entre as culturas. "O samba de gafieira se conecta até com o tango. As danças vão se misturando na formação cultural da América Latina", aposta a jovem.
Mas Camila também teve contato com o jeito de dançar de outras regiões do Brasil. "Eu aprendi muitas danças populares lá. Eu tive contato com o maracatu, com o frevo, com o forró", lembra a centro-oestina, que começou a dançar ao som de música sertaneja e teve a sua vida influenciada pela descoberta da capoeira.
Praticante da umbanda, Camila Nantes veio para Salvador estudar dança na Ufba, há sete anos, interessada na cultura afro-baiana, e atualmente cursa o mestrado na Escola de Dança. Ex-professora da Funceb, a jovem é responsável, pela primeira vez este ano, pelo curso livre de dança de salão da Ufba, e espera contar com um público diverso.
"Quando a gente pensa em dança de salão, o legal é estar em contato com o outro. Acho que é um bom lugar para a gente aprender a lidar com a diferença e fazer da diferença uma potência para a gente, para criar danças", afirma Camila, ao apontar na dança de salão uma tradição heteronormativa, da dança entre cavalheiros e damas. O curso de Camila será dado às terças, das 18h às 20h.
Um dos professores do curso de danças urbanas, juntamente com Luana Sanches, Sérgio Neves, o Saga, destaca que esse segmento é mais amplo do que as pessoas costumam pensar. "A gente viu recentemente na Olimpíada o break e tem muita gente que associa as danças urbanas somente ao break, mas é algo muito mais amplo", avalia Saga, que neste curso faz um recorte específico no hip hop, estilo que começou a praticar em 2012, quando tinha 18 anos, no antigo estúdio JKL. Depois de fazer aulas por 10 anos, e de participar do Rio H2K, um dos maiores festivais de danças urbanas da América Latina, Saga entrou para a graduação em dança na Ufba e deve se formar ainda este ano.

Apesar de ser de uma família de classe média, e ter crescido no Imbuí, Saga foi se identificando cada vez mais com as danças urbanas.
"Eu comecei a entender onde eu me encaixo nesse rolê. Eu não venho da periferia, da rua, mas desde que eu comecei a fazer aulas eu criei fortes conexões com pessoas", declara, mostrando que a dança pode lhe mover para outro lugar na sociedade.
O estudante, que admite-se privilegiado socialmente por seu tom de pele e origem, afirma que o hip hop o atravessou em relação a um outro tipo de discriminação. "Meu corpo é gordo, eu nunca consegui ocupar um espaço na mídia, em bandas, porque procuram sempre um corpo padrão. E eu descobri outras questões que me atravessam. A estrutura me fez chegar ao hip hop", afirma Saga.
Sobre a estética desse gênero, o professor do curso afirma que traz possibilidades além de mexer o corpo. "É muito mais do que algo legal para por em um vídeo que vai ser publicado nas redes sociais. Ele vai para uma coisa que todo mundo procura, que é a socialização", declara Saga, que ressalta a ligação que o ritmo tem com festas.
"É sobre você se vestir bem e ir para um lugar estar com as pessoas que te amam", completa. O curso de Saga acontece aos sábados, das 14h às 16h.
Sabor local
Loi Vieira ainda era uma criança quando o dançarino e coreógrafo colombiano Beto Perez criou, na década de 1990, uma mistura de ritmos latinos e a batizou de zumba. Uma invenção que o tornaria um próspero empresário nos Estados Unidos, explorando a marca Zumba.
"A zumba se espalhou pelo mundo todo e chegou aqui. Cada lugar segue uma linha desse modelo, colocando um pouco do sabor local", explica Loi, professor do curso livre de zumba, que também ensina em academias esse ritmo que conheceu há 15 anos.
Dançarino desde a infância em Itambé, no sudoeste baiano, Loi veio ter contato com a zumba depois que se mudou para Salvador. "Eu conheci professores e fiz um curso que a marca Zumba oferece para quem quer ser professor licenciado. Com a experiência de quem ensina zumba em diferentes academias, como a Agathon Fitness, no Bonfim, Loi aposta no poder de sociabilidade do ritmo.
"Nesse curso oferecido na extensão, o foco maior é na interação entre os participantes. Eu pretendo levar um clima de confraternização, de troca de experiências. Que sejam manhãs divertidas, sem muita preocupação em pegar coreografias já prontas", afirma Loi.
O professor considera que, às vezes, as pessoas se sentem podadas de fazer aulas de danças justamente por não saberem as coreografias que estão bombando nas redes sociais. "A zumba tem esse benefício. As pessoas podem participar sem que haja esse julgamento", declara Loi.

Um exemplo de como a dança pode mexer com a alma vem de duas alunas septuagenárias de Loi, moradoras de Plataforma, onde ele também ensina em uma academia: "Eu as chamo de minhas paquitas. Elas estão sempre na frente, são as primeiras a chegar na aula. Todas as sextas às 6h10 da manhã elas estão lá para as aulas. Dizem que passam a semana inteira esperando pela sexta". O curso de Loi acontece aos sábados, das 9h30 às 11h30.
Aquelas velhas coisas
Única opção gratuita nessa extensão, o curso livre Dança para todos - para se tornar o que se é mistura a expressão corporal com ferramentas da psicologia analítica junguiana. "A ideia surgiu a partir das necessidades de corpos que entram com vontade de dançar, mas cheios de preconceitos", assinala a professora, terapeuta e mestra em dança Tânia Bispo.
A professora afirma que muitas vezes as pessoas não entendem o que são os movimentos de seus corpos e entram com a cabeça poluída por complexos. "Aquelas velhas coisas, de achar que não se pode fazer uma coisa porque é gordo, porque é pequeno, porque não tem ritmo. Ou que quem dança não tem futuro", avalia Tânia.
A professora ouviu muitas considerações como essas ao longo dos 36 anos em que fez trabalho social em comunidades carentes de Salvador, como dançarina e coreógrafa, por meio do Serviço Social do Comércio (Sesc). E decidiu combater esses pensamentos com a sua especialização em terapia junguiana.
"Na psicologia analítica há algumas ferramentas que trabalham o inconsciente, tanto o pessoal quanto o coletivo. Eu uso desenhos e colagens de imagens aleatórias em trabalhos individuais e depois faço um questionamento com referências ao momento que a pessoa vive ou com a sua história de vida", diz Tania, que defendeu sua dissertação de mestrado em 2021 com o título Dança para todos - pela liberdade de ser o que se é.
Tânia conta que baseou sua pesquisa em sua experiência pessoal. Oriunda do balé folclórico, a dançarina sentiu-se discriminada e desencorajada a prosseguir os estudos quando chegou à graduação. A professora e terapeuta considera que esse questionamento traz à tona ideias que estão enraizadas nas pessoas. "Não é uma terapia, mas é uma forma de você acreditar no seu potencial", declara Tânia, que acredita nesse processo como uma forma de liberar o corpo para se movimentar. O curso da professora Tânia acontece às terças, das 9h às 11h.
Interação com a sociedade
O diretor da Escola de Dança da Ufba, Antrifo Sanches, destaca que a extensão é um dos pilares da universidade, juntamente com a pesquisa e o ensino. E que a ideia da extensão universitária é justamente fazer essa interação com a sociedade. "Ao ofertarmos esses cursos de dança, a gente também vai se atualizando sobre o que está acontecendo de dança na cidade, porque essas pessoas trazem para a universidade o que está do lado de fora", afirma o diretor, salientando que a universidade não é detentora de todo o conhecimento. "É uma troca que fazemos com a sociedade", completa.
Outro aspecto positivo destacado por Sanches é a socialização que acontece nos cursos, além da própria presença na instituição de pessoas que não são alunos regulares. "Parece que a universidade também é um lugar inalcançável. Para muita gente acaba sendo, de fato, pois sabemos as condições da população brasileira", analisa o diretor. Os interessados podem se inscrever a partir de 1º de abril e as aulas estão previstas para começar no dia 5. Mais informações, consulte www.danca.ufba.br ou escreva para [email protected].
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