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NOVINHOS CANSADOS

“Geração cansada”: por que os jovens estão abandonando a festas noturnas?

Cultura do dia ganha força entre jovens baianos que trocam baladas por encontros caseiros

Por Pedro Hijo

29/06/2025 - 7:00 h
O estudante de medicina Felipe Gildo, 19 anos, está no grupo de jovens cansados da noite
O estudante de medicina Felipe Gildo, 19 anos, está no grupo de jovens cansados da noite -

Para o estudante de medicina Felipe Gildo, 19 anos, a noite perfeita é assistindo a um filme, no conforto do lar e com tranquilidade. Quando sai, a programação é quase sempre diurna. “Não é por falta de opção, é porque eu não vejo sentido em virar a noite acordado na rua”, explica. Felipe não está só. O fenômeno do declínio das madrugadas tem sido observado em várias partes do mundo e também em Salvador, onde a cultura do dia tem se imposto como um jeito de viver, consumir e ocupar a cidade.

O escanteio do protagonismo das noites reflete as transformações culturais e de comportamento dos consumidores. O que antes simbolizava liberdade, sobretudo para os mais jovens, hoje perde força diante de novos hábitos, especialmente após a pandemia. É o que mostra o estudo A morte lenta das madrugadas urbanas, da consultoria FutureFuture. De acordo com a pesquisa, a geração Z, formada por pessoas nascidas entre 1995 e 2010, não enxerga mais na vida noturna uma forma de afirmar identidade.

A relações públicas Mayana Jucá, 29 anos, até tentou ser baladeira, mas desistiu depois que percebeu o impacto que sair à noite causava na rotina. “Desregula a minha vida toda, e passo o dia seguinte inteiro com sono, não é para mim”, conta. “Quando eu penso em boates, me dá preguiça”. Para Mayana, sair com os amigos deve ser sempre durante o dia. Na lista de atividades diurnas, feiras, praia e encontro com amigas para tomar café da manhã.

Menos álcool, mais café

Imagem ilustrativa da imagem “Geração cansada”: por que os jovens estão abandonando a festas noturnas?
| Foto: Reprodução | Freepik

Alguns fatores interferem no desejo dos jovens de permanecer em casa. A insegurança das grandes cidades e a crise econômica interferem na decisão de sair. Outro ponto é a queda do consumo de álcool. A sommelier e especialista em bebidas brasileiras Isadora Fornari afirma que a geração atual bebe menos em comparação com a anterior. “Eles estão optando por consumir outras bebidas, como refrigerantes e drinks sem álcool”, explica.

Para acompanhar a demanda, praticamente todas as grandes marcas de cerveja passaram a oferecer versões sem álcool, seguindo uma tendência crescente de consumo consciente. Bebidas não alcóolicas também têm ganhado mais espaço nos cardápios baianos. “Em Salvador é cada vez mais comum encontrar essas opções em bares e restaurantes”, afirma Isadora, que aponta a mudança como uma renovação de mercado.

Curadora da Xodó Cafés Especiais, Brenda Matos notou o esvaziamento da vida noturna em Salvador e criou uma opção de festa para aqueles que preferem o dia. A segunda edição da SSA Coffee Party foi realizada no bairro do Bonfim há duas semanas, e contou com tudo o que uma balada tem direito, só que de dia.

Um DJ embalou jovens que preferem hábitos mais saudáveis, mas não abrem mão da música e do encontro com os amigos. De acordo com Brenda, este tipo de festa surgiu na Europa, migrou para os Estados Unidos e, timidamente, chegou ao Brasil. O público? Os novinhos e os adultos com mais de 30 anos. “É a geração cansada de balada”, observa Brenda.

O cardápio da SSA Coffee Party conta apenas com cafés e drinks sem álcool. A decisão de não incluir bebidas etílicas foi estratégica. “O comportamento das pessoas muda muito com o álcool”, afirma a organizadora. “Esse é um evento voltado para o bem-estar, para a pessoa se sentir bem”.

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Baladas à luz do dia

O CEO do grupo San Sebastian, José Augusto Vasconcelos, não sentiu o desânimo do público baiano nas três boates que fazem parte da empresa. “Acompanhamos o que está acontecendo no mercado, mas, até aqui, o interesse pelas nossas festas e casas segue firme”, afirma o sócio da empresa que comanda as casas San, Amsterdam e XXX Club, em Salvador. Nos últimos anos, o grupo tem diversificado a oferta investindo mais em festas de rua, blocos de Carnaval e grandes eventos diurnos.

Para José Augusto, a popularização de festas à luz do sol em Salvador é um complemento. “Não muda radicalmente o cenário. As festas ao ar livre, durante o dia, têm ganhado espaço e a gente até realiza algumas. Mas ainda não vejo isso como uma substituição do noturno”, comenta.

À noite, as boates da empresa seguem com intensa programação que agrada especialmente o público com mais de 30 anos. “São espaços que ainda têm lugar, principalmente para um público que cresceu com esse formato e ainda busca esse tipo de experiência”, diz José Augusto, se referindo aos clientes nascidos até o início da década de 1990. Ele ressalta, no entanto, que clientes com menos de 25 anos também seguem lotando baladas.

Na cena noturna há 16 anos, o DJ Ober é testemunha das mudanças na noite baiana. Para ele, as pessoas estão saindo menos e estão mais exigentes com a programação. “Quando elas querem sair tem que ser para um evento que realmente valha a pena gastar dinheiro e energia”, conta.

Depois da pandemia, aumentou o número de convites para Ober tocar em eventos diurnos ou que terminam mais cedo. De acordo com o DJ, as pessoas têm preferido participar de festas em lugares abertos e com hora de saída definida. “Depois de 2022, senti essa mudança muito fortemente”.

Amigos do fim

O auxiliar administrativo Lucas Cerqueira, 25 anos, faz parte do grupo dos novinhos cansados. “Eu trabalho muito durante a semana, então, para mim, o dia é para aproveitar e a noite, para descansar”, comenta. Quando era mais jovem, ele imaginava que seria um adulto fiel às baladas. "Mas, com o tempo, fui aprendendo a curtir em casa com os amigos".

Para Lucas, é muito difícil encaixar na rotina uma saída noturna. Além do trabalho, o jovem acorda cedo para praticar exercícios físicos, não dispensa as idas à praia e usa bicicleta como meio de transporte para alguns compromissos. Baladas e ressacas não são bem-vindas nesta programação. “Nem imagino passar o dia seguinte cansado”, pondera.

Outro fator que prende os jovens em casa é o avanço do streaming e dos serviços de delivery, ainda de acordo com o levantamento da consultoria FutureFuture. Antes, era necessário sair de casa para buscar diversão, refeições e convívio social. Hoje, essa experiência pode ser vivida no conforto do lar: amigos se reúnem em uma residência, assistem a conteúdos via streaming e recebem a comida de sua preferência por entrega, o que torna a casa o novo ponto de encontro.

Felipe Gildo é a favor das reuniões em casa
Felipe Gildo é a favor das reuniões em casa | Foto: Raphael Muller | Ag. A TARDE

Segundo a pesquisa Cultura nas Capitais, lançada em fevereiro deste ano, a população de Salvador acima de 16 anos frequenta menos atividades culturais como festas populares, shows e cinemas do que a média nacional. No levantamento, 61% dos entrevistados disseram que essas atividades acontecem longe do bairro onde moram, o que sinaliza mais um motivador para o soteropolitano permanecer em casa.

O estudante Felipe Gildo é a favor das reuniões em casa. A falta de segurança de Salvador é um fator determinante nesta escolha, sobretudo quando é necessário usar o carro para se deslocar. “Depois de estacionar, sair na rua tarde da noite é perigoso”, observa.

Para ele, o que realmente faz diferença são os encontros mais íntimos e tranquilos, geralmente na casa de amigos, onde é possível conversar e estar junto sem a pressão de se estender até altas horas. “Gosto de ir a lugares para ver pessoas, para conversar, e esses encontros normalmente não vão até a madrugada”, diz Felipe. Ele conta que, ocasionalmente, também participa de festas e eventos que duram até tarde, mas para ele, essa não é a regra.

Esse desejo por rotinas mais leves e encontros fora da madrugada também é percebido por Mayana. Ela relata uma tendência da troca de noites longas por manhãs produtivas entre amigos. “Eu vejo muito esse movimento”, diz. Mas essa escolha exige uma mudança de hábitos: dormir mais cedo, reduzir o tempo nas telas e criar uma rotina mais organizada. Tudo gira em torno de acordar bem, disposto, para aproveitar o dia. “É uma bola de neve positiva”, indica Mayana.

Para José Augusto, CEO do grupo San Sebastian, apesar da tendência diurna, o desejo do encontro presencial entre amigos segue firme. “Seja de dia ou de noite, numa praia ou numa boate”, complementa. Ele destaca que Salvador é uma cidade em que a cultura do evento é muito forte e com muitas particularidades. “O futuro é híbrido e é importante acompanhar essas mudanças”, aponta.

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