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HIV explode entre jovens: “Eles acham que nada vai acontecer”

Comportamento de risco ameaça avanço

Gilson Jorge

Por Gilson Jorge

14/12/2025 - 6:06 h
Por que testar mais salva vidas? Infectologista explica boom de diagnósticos na Bahia
Por que testar mais salva vidas? Infectologista explica boom de diagnósticos na Bahia -

Segundo a Secretaria da Saúde da Bahia (Sesab), mais de 22 mil novos casos de HIV/Aids foram notificados entre 2019 e 2024. E entre janeiro de 2023 e agosto de 2025, o estado registrou mais de 11 mil novos diagnósticos. Em Salvador, a atenção se volta basicamente para homens de 20 a 34 anos, grupo que concentra a maior parte dos diagnósticos.

A mortalidade ainda é um alerta. A Bahia registra 10,8 óbitos por 100 mil habitantes, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde. Mas, há sinais positivos: o Brasil alcançou, em 2023, a menor mortalidade padronizada por Aids desde 2013, conforme divulgado no Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde.

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Para entender esses números, A TARDE ouviu a médica infectologista Isabella Nóbrega, doutora em medicina e saúde pela Ufba e referência no tratamento de pacientes com HIV na Bahia.

Dados sobre a contaminação por HIV divulgados recentemente apontam um maior número de casos notificados e ao mesmo tempo uma redução nos óbitos causados pela Aids...

Pela primeira vez, houve uma diminuição nos casos de óbito por Aids. A gente nunca esteve nos níveis de hoje. Desde o momento em que esse indicador começou a ser analisado, esse foi o ano de maior queda. Por outro lado, a gente nunca teve tanta testagem como no último ano. Aumentou muito o número de testes rápidos distribuídos e de pessoas realizando as testagens.

Como você tem um número maior de pessoas tendo acesso aos testes, mais pessoas foram diagnosticadas. Isso não significa que houve um aumento de casos, uma piora no quadro ou que a situação esteja descontrolada. Isso reflete uma melhor capacidade de diagnosticar as pessoas que estão vivendo com o vírus. O que aconteceu esse ano de diferente foi isso. Uma melhor cobertura na testagem. E aí, consequentemente, mais gente se testando, mais gente diagnosticada. É, digamos, um "defeito bom" que menos pessoas tenham morrido por Aids, isso reflete uma melhor assistência.

As pessoas tendo acesso ao tratamento, mais pessoas se tratando precocemente, tratamentos mais eficazes, pessoas indetectando carga viral. E, consequentemente, menos pessoas morrendo por Aids, que é a doença da imunodeficiência humana. Existe uma diferença entre conviver com o vírus e ter a doença. Os dados mostraram a diminuição dos óbitos e o aumento nos casos novos à custa do aumento da testagem.

E os novos casos estão entre os mais jovens...

Isso, na faixa-etária entre 20 e 29 anos é onde a gente tem uma concentração maior de novos diagnósticos.

A gente pode pensar que entre os mais novos há uma despreocupação excessiva com o vírus?

Isso é multifatorial. Dentre outras coisas, eu acho que sim. O jovem de uma forma geral é meio...como eu posso dizer? ... não sei se o termo é esse...ele é um pouco inconsequente. Ele se expõe mais ao risco de uma forma geral, ele corre mais com o seu automóvel, ele bebe mais, ele bebe e dirige. Então, ele é mais inconsequente, digamos assim. Ele é mais imaturo. Isso para tudo. Inclusive em relação ao sexo, ele acha que nada vai acontecer com ele, que o carro não vai bater, ele não vai passar mal bebendo, ele não vai pegar uma infecção sexualmente transmissível. Ele se acha meio um super-herói. Isso se reflete em vários aspectos da vida, inclusive no comportamento sexual.

É claro que as novas gerações não passaram pelo que as gerações mais antigas já passaram. Eles não viram aqueles estereótipos das pessoas caquéticas indo a óbito sem tratamento, porque não havia tratamento naquela época. Depois, surgiu o tratamento, mas ele não era tão eficaz. Hoje, as pessoas que estão recebendo o diagnóstico têm um tratamento em outra fase, totalmente diferente do que há duas ou três décadas. Antes, você esperava a imunidade cair para começar o tratamento. Hoje, você diagnostica e, independentemente de estar ou não com a imunidade preservada, você inicia o tratamento. Hoje as pessoas começam a se tratar, na maioria das vezes, antes mesmo de adoecerem. Então, elas não têm visto a quantidade de pessoas doentes como era antes. Realmente, isso faz com que elas imaginem que ninguém mais adoece. O que não é verdade.

Hoje, a gente ainda tem cerca de nove mil óbitos por ano relacionados à Aids no Brasil. Ainda é muita gente. É preciso melhorar absurdamente, mas esses números já foram o dobro décadas atrás. Aos poucos, ao longo dos últimos anos, a gente vem diminuindo. O fato de eles não verem a calamidade que já existiu, corrobora esse pensamento de que se eu me infectar não vou morrer porque tem tratamento. E os tratamentos hoje são extremamente eficazes. Você tem tratamento que é um comprimido uma vez ao dia super bem tolerado, que não causa praticamente qualquer efeito colateral relevante.

As pessoas hoje têm qualidade de vida, uma expectativa de vida praticamente semelhante a das outras pessoas da mesma faixa-etária e do mesmo local das pessoas que não vivem com o HIV. Isso faz realmente com que as pessoas temam menos. Você pega uma população que já se acha acima do bem e do mal, já imprudente e inconsequente em vários aspectos e que não viu a realidade como ela foi décadas atrás.

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Como funcionam os tratamentos PrEP e PEP?

A PrEP é a profilaxia pré-exposição ao vírus HIV. E a PEP é a profilaxia pós-exposição. A PrEP consiste em o indivíduo tomar o medicamento antes de ele ter uma relação sexual de risco. A pessoa que, por algum motivo, não consegue garantir o uso do preservativo em 100% das relações sexuais já tem aí um motivo para usar a PrEP, que hoje não é mais apenas para aquelas populações com maior vulnerabilidade.

Hoje a gente recomenda que o indivíduo, homem ou mulher, que não consegue garantir sempre o uso do preservativo e não sabe se a parceria dele vive ou não com o HIV, se está tratando ou não, ele toma esse medicamento uma vez ao dia. Isso vai diminuir bastante o risco de ele adquirir o vírus caso ele tenha uma relação sem preservativo ou que o preservativo tenha rompido. Isso vem sendo disponibilizado pelo SUS. A gente rem vários serviços de referência em Salvador que fornecem a PrEP, que também pode ser feita por uma rede privada.

E a PEP?

A PEP pode ser utilizada se a pessoa teve uma relação sexual sem preservativo, consensual ou não, um abuso sexual, uma violência. Ou até mesmo a exposição a material biológico, como uma pessoa que trabalha com reciclagem e furou o dedo com uma agulha, um profissional de saúde que durante um atendimento teve contato com algum sangue. Algumas possibilidades. Essa pessoa tem até 72 horas após esse evento de risco para iniciar o tratamento com os antiretrovirais, ela usa o medicamento durante 28 dias. Isso também diminui o risco de adquirir o vírus.

Na PrEP, você faz a combinação de dois antiretrovirais e vai tomando todos os dias. Já na PEP são três antiretrovirais só durante 28 dias. A PrEP oral é muito eficaz, protege em torno de 98%. E a gente tem uma novidade, a PrEP injetável, uma injeção a cada dois meses, uma outra a cada seis meses. Mas a injetável a gente ainda não tem no SUS. No. Brasil, só na rede privada. A injetável tem uma proteção acima de 99%.

E como está o nível da eficácia do tratamento para quem contraiu o vírus HIV?

O tratamento é extremamente eficaz. Hoje, todo mundo que está em tratamento correto, vai para as consultas e toma o medicamento todos os dias. Essas pessoas em poucos meses chegam à indetecção do vírus. A carga viral, a quantidade de vírus no sangue, desaparece. E a carga viral zerada, indetectável, é igual à intransmissibilidade. Mesmo que a pessoa tenha relação sexual sem preservativo, se ela tem a carga viral zerada, ela não transmite. Ela pode namorar uma pessoa sem o vírus e, mesmo sem preservativo, não haverá transmissão do vírus.

Apesar de a gente não ter ainda a cura total, a gente tem a chamada cura funcional. É como se a pessoa não vivesse mais com o vírus. Ela toma um comprimido uma vez ao dia e é vida que segue. Agora, é preciso diagnosticar e, em sabendo que o vírus está instalado, começar o tratamento. É muito importante que o indivíduo faça a checagem periódica, mesmo que ele não tenha os sintomas. O pulo do gato é ter o diagnóstico antes de adoecer. Depois que você está doente, a chance de ir a óbito ou ter alguma sequela grave é muito maior.

Hoje, você consegue começar o tratamento em até sete dias após o diagnóstico. Claro que não é em todos os lugares. Em alguns lugares ainda tem fila. Mas em Salvador há lugares em que você consegue passar pelo médico no mesmo dia do diagnóstico. Foram muitos os progressos. Então, esse relatório do Boletim Epidemiológico, em especial, traz outra coisa importante, que é a erradicação da transmissão vertical do vírus HIV, da mãe para o filho.

Em termos de saúde pública, a gente tem hoje tão poucos casos de transmissão vertical que em termos de saúde pública isso é considerado erradicação. Não significa que não haja mais nenhum caso. Mas a gente já chegou ao nível preconizado pela Organização Mundial de Saúde.

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