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ECOSSISTEMA MARINHO

Bahia registra maior número de encalhes de jubartes em 2022 no país

Costa baiana registra 44% dos casos nacionais e liga alerta da população; Especialistas atestam "normalidade"

Por Rafaela Souza

21/09/2022 - 6:00 h | Atualizada em 08/05/2023 - 14:12
Baleia jubarte em Abrolhos
Baleia jubarte em Abrolhos -

Em tempos de discussão acerca de preservação ambiental e aquecimento global, a incidência acentuada de casos envolvendo o encalhe de baleias jubartes no Brasil, e na Bahia, tem ligado o alerta de ambientalistas de todo o país.

Até o momento, a costa baiana registrou 30 casos de encalhes em 2022, o que representa 44% dos 69 registrados no país de acordo com dados do Projeto Baleia Jubarte em parceria com as instituições da Rede de Encalhes de Mamíferos Aquáticos do Brasil (Remab).

Apesar do aumento e das dúvidas da população, que tem se assustado ao ver os gigantes do mar em praias e faixas de areia por todo o litoral baiano, a situação está "dentro da normalidade", de acordo com o médico veterinário e coordenador de pesquisa do Instituto Baleia Jubarte, Milton Marcondes.

"A Bahia acompanha o crescimento dos encalhes no Brasil. Os números estão dentro do normal e voltou para uma situação esperada. A tendência de aumento dos encalhes também está relacionada com o crescimento da população, que começou lá em 2002, com 3.400 baleias. Na época, a gente tinha mais ou menos uns 20 encalhes por ano no Brasil. Atualmente, a população é de mais de 20 mil baleias, consequentemente, os encalhes também aumentaram", explicou.

Em busca do calor das águas tropicais, as baleias jubartes fogem do inverno da Antártida, onde se alimentam, e migram para a costa brasileira todos os anos durante sua temporada de reprodução, entre junho e novembro. Nesse período, os animais fazem da Região dos Abrolhos, localizada entre o sul da Bahia e norte do Espírito Santo, o mais importante berçário do Atlântico Sul.

No entanto, durante a viagem, muitas baleias não conseguem concluir o percurso e acabam encalhando nas praias, inclusive em toda costa baiana. As causas dos encalhes podem estar ligadas às questões de saúde do animal, doenças, idade, indíviduos que se perdem do grupo, ataque de predadores e ações humanas.

"Mortalidade por causa natural não tem como modificar, mas os encalhes causados por atividades humanas, como atropelamento por embarcações, lixo no mar, emalhe em rede de pesca, podemos tentar reduzir e intervir", alertou.

Segundo o especialista, a expectativa é de que os encalhes recuem no país. “Já estamos observando uma queda no número de encalhes em setembro, o que era esperado. Em agosto, houve um encalhe por dia, em média. Fechamos o mês com 32 encalhes. Até a metade deste mês, tivemos 12 encalhes”.

Equipe do Projeto Baleia Jubarte fazendo monitoramento de encalhe em praia de Baixio, no litoral norte da Bahia
Equipe do Projeto Baleia Jubarte fazendo monitoramento de encalhe em praia de Baixio, no litoral norte da Bahia | Foto: Acervo Projeto Baleia Jubarte

Recorde

O ano de 2021 foi atípico para os números esperados no litoral brasileiro. Ainda conforme os dados do Projeto Baleia Jubarte, 230 encalhes foram registrados no país. A maioria dos casos ocorreu nas regiões sul e sudeste. A Bahia só teve nove encalhes nesse período.

A situação foi considerada alarmante pelos especialistas, tendo em vista que as baleias quase entraram em extinção antes do trabalho de preservação da espécie, que vem sendo desenvolvido há mais de 20 anos.

Para Milton Marcondes, a principal hipótese para tentar explicar o aumento expressivo dos encalhes no ano passado é a redução do krill, que são minúsculos crustáceos. O krill é um dos principais alimentos das jubartes, que também comem pequenos peixes.

Além disso, houve outra questão atípica nos dados. A maioria dos animais encalhados eram juvenis- baleias de 1 até 5 anos de idade, quando atingem a maturidade sexual. "Ano passado, a gente teve praticamente 95% dos encalhes de juvenis, que estavam magros ou vinham para perto da praia buscar comida e acabaram se enroscando em equipamento de pesca. Isso aconteceu principalmente em Santa Catarina e São Paulo. Com isso, a gente teve poucas baleias no litoral baiano e tivemos poucos encalhes", pontuou.

Médico veterinário e coordenador de pesquisa do Instituto Baleia Jubarte, Milton Marcondes, realizando biópsia em uma baleia
Médico veterinário e coordenador de pesquisa do Instituto Baleia Jubarte, Milton Marcondes, realizando biópsia em uma baleia | Foto: Acervo Projeto Baleia Jubarte

O especialista explicou que o aumento da mortalidade dessa categoria pode ter sido causado pela falta de krill. Isso porque a escassez de alimentos e pouca experiência de vida no mar comprometeram a nutrição dos mais jovens, que chegaram ao litoral brasileiro sem terem se alimentado de forma adequada.

Diferente dos juvenis, os animais adultos têm maior capacidade para armazenar gordura e, assim, ter mais energia para completar a viagem para a temporada de reprodução. Uma baleia adulta pode medir até 16 metros e pesar entre 25 e 30 toneladas, em média.

Sul da Bahia

Em outro caso registrado no último mês, dois filhotes de baleias jubartes foram encontrados mortos em praias de Ilhéus, no sul baiano.

O médico veterinário e coordenador de encalhes do Projeto (a)mar, que atua em prol da conservação marinha entre Maraú e Canavieiras, Wellington Laudano, relatou que em um dos encalhes o animal apresentou sinais de predação.

"Os filhotes se perdem por algum motivo da mãe e a chance de sobreviver é muito baixa. Ele voltou a encalhar porque estava muito magro. A redução do aporte alimentar impossibilita que as baleias completem o percurso", apontou.

De acordo com o veterinário, que realiza monitoramento de várias espécies marinhas, a interferência humana é grave e precisa ser fiscalizada.

"Além das jubartes, as tartarugas e aves marinhas, todas sofrem com a ação humana. A gente atua na orientação e conscientização da população, dos pescadores, mas precisamos de mais fiscalização para que as pessoas saibam da legislação. Precisamos preservar o mar, explorá-lo de forma mais sustentavel", afirmou.

Médico veterinário e coordenador de encalhes do Projeto (a)mar, Wellington Laudano, que atua em prol da conservação marinha entre Maraú e Canavieiras, no sul da Bahia
Médico veterinário e coordenador de encalhes do Projeto (a)mar, Wellington Laudano, que atua em prol da conservação marinha entre Maraú e Canavieiras, no sul da Bahia | Foto: Acervo Projeto (a)mar

Além dos dois encalhes de jubartes registrados pelo projeto, outros 215 animais marinhos foram encontrados encalhados neste ano. Entre eles estão tartarugas e aves marinhas, botos cinza, golfinhos.

Remoção de baleias encalhadas

A remoção é responsabilidade da prefeitura do município onde a baleia encalhou. Segundo informações do Projeto Baleia Jubarte, que pode ser acionado para o monitoramento e análise do encalhe, a população não deve se aproximar e nem tocar no animal.

No último dia 14, moradores denunciaram a remoção inadequada de uma baleia jubarte na praia de Aratuba, localizada na Ilha de Vera Cruz, executada pela prefeitura do município. Isso porque o animal, que foi enterrado no dia 4 de setembro, voltou a ter uma parte exposta no local devido à maré alta desde o dia 10.

A população se queixou do forte odor provocado pela decomposição da baleia e dos riscos que a situação pode causar à saúde. A baleia encalhou no dia 29 de agosto, mas a remoção só foi realizada uma semana depois.

Em outro caso, a Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpurb) foi acionada para a remoção do corpo de um filhote de Jubarte que foi encontrado morto na praia de Ipitanga, na região metropolitana de Salvador. De acordo com o órgão, o animal, que foi removido com o uso de um caminhão guindaste, foi enterrado em um aterro com orientação do Projeto Jubarte.

Corpo de animal foi removido por equipe especializada
Corpo de animal foi removido por equipe especializada | Foto: Divulgação | Limpurb

Preservação do ecossistema marinho

O Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Aquáticos (CMA), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), conduz a Rede de Encalhes de Mamíferos Aquáticos do Brasil (Remab) em que, perto de outras 50 instituições, atuam no atendimento aos animais encalhados, além de desenvolver ações relacionadas à preservação da biodiversidade marinha.

"O ICMBio coordena o plano de ação de cetáceos marinhos, que inclui as jubartes, que, embora não estejam ameaçadas, se encontram na categoria NT (quase ameaçado) e ainda merecem atenção para que não retornem a classe de ameaçadas", explicou a coordenadora do CMA, Fábia Luna.

Além do plano de ação, Luna disse que a instituição também "acompanha as pesquisas que são desenvolvidas com a espécie, bem como as de mudanças climáticas, aquecimento global, e de atividades antrópicas que causam impactos sobre os animais".

O diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Francisco Kelmo, ressaltou a importância da preservação das baleias jubartes. "Até um tempo atrás, elas estavam em extinção. Após um processo de educação ambiental, foi possível recuperar sua população", pontuou.

Diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Francisco Kelmo
Diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Francisco Kelmo | Foto: Raphael Muller | Ag. A TARDE

Kelmo também citou as consequências das ações humanas em relação ao ecossistema marinho e a responsabilidade do poder público. "A falta de conscientização ambiental é um ponto impeditivo muito grande. Precisamos de mais educação ambiental, políticas públicas e investimentos na pesquisa. Precisamos ter o conhecimento básico do ambiente que queremos preservar. A educação é a base de tudo", completou.

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