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Racismo velado: emojis e gifs são usados para driblar moderação nas redes
Observatório Racismo nas Redes identifica o crime em tom de humor nas plataformas Telegram e Instagram
Por Madson Souza

Estudo aponta que emojis, memes e gifs em tom humorístico são usados para disseminar discursos racistas em plataformas como Instagram e Telegram. Essa linguagem digital é usada para driblar a supervisão de plataformas online como o Instagram, ou para disfarçar de humor o conteúdo racista, como no Telegram, conforme pesquisa publicada pelo Observatório Racismo nas Redes, desenvolvida pelo Aláfia Lab, em parceria com Laboratório de Humanidades Digitais da Universidade Federal da Bahia (LABDH).
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No Telegram, rede de mensagem menos conhecida, os ataques racistas são mais escancarados segundo o levantamento. Em páginas com nome acompanhado das letras “kkk” são compartilhadas mensagens racistas por meio de um invólucro de “brincadeira" para grupos que precisam ir atrás desse conteúdo. Enquanto no Instagram, são evitados termos explicitamente racistas para driblar a moderação da plataforma. A linguagem usada para emitir preconceitos são os emojis e gifs - como os de macaco - e opiniões negativas, que ao driblar a moderação possuem uma ampla visibilidade das postagens e comentários acessíveis.
Ainda que disfarçados de brincadeira, os discursos racistas nas plataformas podem causar consequências, como explica a psicóloga clínica e docente do centro universitário Uniruy, Bárbara Guimarães.
Piadas racistas funcionam como formas de ‘micro agressões simbólicas’.
“Mesmo quando não são dirigidas pessoalmente, piadas racistas funcionam como formas de ‘micro agressões simbólicas’ que reforçam a desumanização e o desprezo social pela identidade negra. Essas experiências são estímulos que podem evocar sentimentos de insegurança, raiva, tristeza e até medo, além de funcionarem como gatilhos para sofrimento psicológico, como ansiedade, hipervigilância e sentimentos de inadequação”, afirma.
Dez entre dez pessoas negras afirmaram já terem se deparado com conteúdo racista nas redes sociais em levantamento feito pela reportagem.
“É o que a gente mais vê na internet. Disfarçam com emoji do macaquinho. Uso muito Instagram e vejo comentários sobre a cor da pele de pessoas negras, biotipo, e isso é frustrante demais. Parece que a gente não pode fazer nada”, conta a cozinheira Larissa Bispo, de 29 anos.
Percebemos que ataques com esses emojis, gifs, são mais difícieis de serem percebidos.
“Percebemos que ataques com esses emojis, gifs, são mais difícieis de serem percebidos. As pessoas que cometem esses crimes usam esse gênero textual para apagar seu crime, porque você só vai perceber o discurso de ódio dentro do contexto. Uma máquina não consegue perceber que aquele emoji está sendo dado por uma causa racista. É o humor usado como uma ferramenta para a disseminação de discurso de ódio”, explica Ellen Guerra, coordenadora de projetos da Aláfia Lab e uma das autoras da pesquisa.
A prática retrata pessoas negras como menos humanas, ou associadas a estereótipos negativos, muitas vezes direcionados a aspectos físicos, como o cabelo crespo. Experiência que a dona de casa Vivian Gomes, de 26, costuma ver nas redes sociais. “Vejo comentários bem explícitos sobre cabelo. Já é normal falarem dessas coisas ao ponto de as pessoas não ligarem muito”, diz.
Ambiente permissivo
Uma das conclusões do estudo da Aláfia Lab em parceria com a LABDH é que a moderação de conteúdo do Telegram é ineficiente para chats criados na plataforma no Brasil, que são de fácil acesso.
No Telegram há um ambiente mais permissivo para ataques abertamente racistas, enquanto no Instagram o racismo permanece de maneira velada, mas presente, como explica a socióloga e membro do LABDH, além de uma das autoras da pesquisa, Rosana Moore.
O que acontece no Telegram continua no subterrâneo.
“São várias as camadas de ataques que encontramos no Telegram, porque não estão sob o crivo de um olhar público, de um controle social. Esse mesmo conteúdo estando no Instagram, por exemplo, cai no crivo social, então as pessoas denunciam. O que acontece no Telegram continua no subterrâneo. O relatório está falando sobre racismo, mas não é um expediente novo. Na verdade, é só um outro cenário social para se falar sobre racismo no Brasil”, diz.
O estudo apresenta orientações para as plataformas combaterem essas violências: além da abordagem automatizada, moderação humana para identificar essas mensagens; treinamento constante para essa moderação humana identificar e combater discursos de ódio online; canais de denúncia acessíveis e com prazos rigorosos para análise; políticas claras e transparentes que devem ser estabelecidas e aplicadas de forma consistente; e colaboração com especialistas em diversidade e inclusão para aprimorar essas diretrizes e ferramentas.
Tais ações são indicadas como forma de diminuir o número das ocorrências em redes sociais.
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