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31/08/2024 às 7:00 • Atualizada em 31/08/2024 às 15:30 - há XX semanas | Autor: Felipe Sena

SAÚDE

Desconfiança dos pais na ciência alimenta grupos antivacina nas redes

Grupos estimulam pais a não vacinarem os filhos e especialistas alertam para os perigos

Imagem ilustrativa da imagem Desconfiança dos pais na ciência alimenta grupos antivacina nas redes
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“Eu, enquanto adulto, posso decidir se vou tomar uma vacina ou não. Mas, no caso de pais que decidem não vacinar um filho menor de idade, incapaz de si, fica a questão: será que este filho iria escolher ter uma doença?". O alerta é da da presidente da Sociedade Baiana de Pediatria (Sobape), Ana Paz, que acrescenta que a escolha pela não vacinação coloca a vida desses menores em risco, tornando-se um problema de saúde pública.

Pedro Santos*, de 30 anos, que faz parte de um grupo antivacina no Facebook, tem uma filha de 4 anos de idade. Ele e a esposa optaram por não vaciná-la contra qualquer tipo de doença. “Ela tem uma saúde muito boa. Já os primos que tomam todas as vacinas, estão sempre com algo e ficam dependendo da vacina para isso, e remédio para aquilo”, diz.

Boa parte da opinião de Pedro* é influenciada pelo grupo que participa, além de vídeos do YouTube de influenciadores que se dizem analistas do mundo contemporâneo e criam teorias da conspiração, além de análises sem embasamento científico. Para Pedro*, o esquema de vacinação em massa é “uma guerra entre o poder da maçonaria [instituição filosófica, filantrópica, educativa e progressista] contra o povo de Deus. Essas doenças não são causadas por morcegos ou macacos, mas sim por pessoas mal intencionadas”, diz se referindo a Mpox, Raiva, Histoplasmose e Leptospirose.

Além disso, ele acredita que muitas pessoas se vacinam contra doenças por que são “manipuladas pela mídia e pelo sistema”, que, para ele, interferem em outros fatores. “Ano que vem, preciso matricular minha filha em um colégio, onde ela será obrigada a estudar com essa idade [4 anos]. Um estudo que prioriza transformar a criança em mais um rato para girar a roda do sistema”, defende. Pedro* diz que planeja “se mudar para uma cidade pequena e tentar burlar o sistema de vacinação”.

Já Eduarda Santana*, de 28 anos, além de fazer parte de um grupo antivacina no Facebook, também discute suas ideias com outras pessoas sobre o movimento em grupo de WhatsApp. Mãe de um menino de 3 anos de idade, também não o vacinou contra qualquer tipo de doença, mas afirma que em consultas é constatado que ele tem deficiência de vitamina C, mas está “entrando com suplementação”.

“Eu tenho um filho que vai completar quatro anos e começou a ir para a escola, e eu não vou vaciná-lo contra a Covid, nem contra a gripe. Eu vi que tem vários pais que também não vacinam. O importante é deixar as crianças com a imunidade alta”, diz. Eduarda* afirma que já viu casos de crianças que ficaram com alergias após a vacinação contra a Covid, além de acreditar que as vacinas baixam a imunidade e causam a própria gripe e feridas pelo corpo.

Movimentos antivacina

Uma pesquisa feita pelo Conselho do Ministério Público, com o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) e a Universidade Santo Amaro (Unisa), entre janeiro e fevereiro de 2023, mostrou que 21% de 3 mil entrevistados em todas as regiões do Brasil, disseram já ter deixado de vacinar seus filhos após terem visto informação negativa sobre imunizantes em redes sociais e WhatsApp. Em sua maioria, essas publicações não são apresentadas através de profissionais da saúde, além de serem consideradas fake news, desestimulando a vacinação e causando o fenômeno chamado de hesitação vacinal.

A hesitação vacinal é considerada a recusa ou resistência em se vacinar, mesmo dispondo dos imunizantes de forma acessível, e gratuita. Para a pediatra e especialista em saúde do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Tati Andrade, a influência dos grupos antivacina na decisão dos pais sobre a vacinação infantil é preocupante. “Existe um movimento antivacina, que é muito presente em outros países, mas que nos últimos anos tem crescido no Brasil, além disso, existem decisões que as famílias tomam, que colocam em risco a vida das crianças”, explica.

“O Programa Nacional de Imunizações (PNI) é um programa sério, e nós [brasileiros] tínhamos o maior índice de cobertura vacinal do mundo. Isso caiu muito por causa de notícias falsas que têm sido divulgadas, envolvendo política, religião e que nós [médicos e cientistas] estamos falando de comprovação científica”, salienta a pediatra Ana Paz. Após analisar dados de vacinação no Brasil, o Observatório da Atenção Primária à Saúde da associação civil sem fins lucrativos Uname concluiu que em 2021, o Brasil teve a menor cobertura vacinal em 20 anos. A média nacional ficou em 52,1%, o que é preocupante, pois o país sempre foi referência mundial em cobertura vacinal graças ao PNI.

Segundo o observatório, de 2001 a 2015, a média nacional de cobertura vacinal se manteve acima dos 70%, contudo, em 2016, diminuiu para 59,9% e vem caindo desde 2019, atingindo os 52,1% em 2021. No entanto, o Brasil chegou a avançar na imunização infantil, em 2023, e saiu da lista dos 20 países com mais crianças não imunizadas no mundo, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde e da Unicef.

Em 2023, o governo brasileiro, anunciou o ‘Movimento Nacional pela Vacinação’, com o objetivo de retomar a confiança da população na ciência, no Sistema Único de Saúde (SUS) e nas vacinas. O relatório mostra que, no Brasil, o número de crianças que, por exemplo, não receberam nenhuma dose da DTP1, que protege contra a Difteria, o Tétano e o Coqueluche, caiu de 418 mil em 2022 para 103 mil em 2023. Entretanto, mesmo com os avanços, os números de taxa de vacinação ainda continuam baixos, e os grupos antivacina corroboram para isso.

De acordo com a pediatra Ana Paz, as redes sociais, onde se encontram alguns dos grupos antivacina que determinados pais participam, influenciam a sociedade de diversas formas, principalmente com a propagação de fake news. “As notícias falsas correm muito soltas e às vezes como um lobo em pele de cordeiro, que a depender da linguagem que usem, as pessoas caem realmente, mas do ponto de vista da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), não existe nenhum embasamento científico para que não se faça a vacinação”, explica.

Uma das preocupações de Eduarda*, em não vacinar o filho, são as reações e efeitos colaterais, após ver relatos de outros pais que já vacinaram os filhos, vinculando esse fator, a falta de eficácia dos imunizantes. Segundo a pediatra Ana Paz, alguns efeitos colaterais da vacinação são comuns e não significam um sinal de doença.

“Podem ocorrer eventualmente efeitos colaterais, mas nem de longe, pensando na criança ter doenças. Além disso, as vacinas não podem impedir que a criança tenha a doença, mas a doença, será muito minimizada, caso a criança venha a ter. Por exemplo, uma criança que foi vacinada contra a papeira, em que existe uma tríplice viral que inclui a caxumba, caso essa criança contraia o vírus, será de forma muito mais branda do que se ela não tivesse tomado, diminuindo assim a morbidade da doença”, explica.

De acordo com a infectologista pediátrica vinculada à Sobape, Anne Layze, a questão relacionada aos efeitos colaterais precisa ser desmistificada. “As pessoas acreditam que o que protege não vai gerar nenhum efeito colateral. Existem efeitos colaterais mais graves, que são efeitos adversos, mas diante de todo benefício da vacina, isso não é nada”, diz.

Anne Layze também explica que caso não vacinada, a criança venha contrair a doença, será um problema não só para os pais, mas um entrave de saúde pública. “Casos com grandes números de incidência e transmissão de doenças, como Coqueluche, Covid, Poliomielite, Rotavírus, que não só tem maiores gravidades nas crianças menores de dois anos de idade, mas também tem uma alta taxa de transmissibilidade e que pode levar a internações e óbitos, levando a um impacto em toda a saúde pública, não gerando só gastos de cuidados, mas reduzindo os dias ativos e pode causar uma pandemia, como o caso da Covid-19”, ressalta Anne. Para a especialista em saúde da Unicef, Tati Andrade, a falta de vacinação infantil também pode trazer problemas à vida de outras crianças ao redor, e inibir o convívio da criança não vacinada, pois seu corpo estará suscetível a vírus.

Tati Andrade afirma que é necessário continuar com esforços para alta das taxas de vacinação para que doenças como a Poliomielite, que causou um surto no Brasil na década de 1910, não retorne, além da globalização, que permite o fluxo de pessoas de um país para outro e pode proliferar rapidamente as doenças. “O Brasil é um dos países que mais oferece vacinas gratuitas para doenças graves, como a Meningite Meningocócica, uma doença que pode matar em menos de 24 horas. A vacina do HPV, que previne o câncer”, cita.

O diálogo é fundamental

A pediatra Ana Paz ressalta que o ponto principal para combater as fake news relacionadas à vacinação infantil é diferenciar o que são fake news e o que é verdade. “Muitas pessoas que fazem publicações contra a vacina nas redes sociais colocam o nome de um artigo e não o que está descrito sobre o assunto, que não são feitos por pessoas que estão pesquisando e estudando”, diz.

De acordo com o pneumologista vinculado à Fiocruz, Thiago Cerqueira, para alavancar a vacinação infantil, com números de taxa maiores, é necessário retomar o diálogo. “Não bastam campanhas de vacinação que apenas digam que é necessário vacinar as crianças, precisa ser dita qual a utilidade das vacinas, qual o impacto que as vacinas trouxeram para a sociedade. A distribuição de conteúdos sobre as vacinas e campanhas de vacinação também deve ser feita em outros meios de comunicação além da TV e rádio, como através das redes sociais, facilitando o acesso aos diferentes tipos de públicos”, sugere o especialista.

A infectologista e diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Balallai, afirma que é importante entender as formas que as pessoas antivacina pensam. “Para combater a hesitação vacinal é preciso ouvir as pessoas, tanto nas mídias sociais como nas comunidades, de forma presencial e entender quais são os seus receios e se antecipar a qualquer criação de desinformação, principalmente porque é complicado depois que a desinformação foi publicada, desfazer”, salienta.

A pediatra do Sobape, Anne Layze, afirma que hoje existem diversos canais confiáveis de informação sobre as vacinas infantis. “As fake news podem ser esclarecidas com os médicos, os profissionais de saúde de vacinação além de sites como o da SBP e SBIm, que são muito fáceis de tirar dúvidas, o que é mito, o que é fato na vacinação e conversar com o pediatra da criança se está em dúvida, que saiba esclarecer e fazer a orientação de modo adequado quanto a vacinação”, diz. O imunologista Thiago Cerqueira também cita sites confiáveis como o do “Ministério da Saúde, Organização Pan-Americana e Unicef”.

Falta de acessibilidade

Para a pediatra do Sobape, Anne Layze, também é importante compreender a diferença entre a hesitação vacinal e a falta de acessibilidade às pessoas que não conseguem vacinar seus filhos, o que é multifatorial. “Existe uma dificuldade no horário de vacinação, que muitas vezes não contempla as pessoas que trabalham em horário administrativo, que os filhos estão na creche”, diz.

Além disso, “muitas vezes a dose não está disponível no posto de saúde e isso é um problema sério, às vezes falta um lote do posto e por questões econômicas os pais não têm como se deslocar. O ideal é que tenha todas as vacinas disponíveis nos postos”, ressalta a pediatra Ana Paz, que salienta também a importância de propagandas televisivas científicas sobre a eficácia das vacinas infantis. De acordo com a pediatra Tati Andrade, assim como existem os grupos antivacina, é interessante a união de pais, famílias e escolas para a criação de grupos pró-vacina para dialogar e entender a importância da vacinação através das redes sociais.

Os cuidados com as crianças começam desde o pré-natal, na barriga da mãe, e a vacinação está entre eles. Na primeira infância, as crianças precisam tomar vacinas contra diversas doenças. “As vacinas na primeira infância protegem as crianças de diversas doenças como Hepatite B, Rubéola, Tétano, Meningite, dentre outras”, diz Thiago Cerqueira.

Para Anne Layze, “negar a vacina é negar viver em sociedade”, já que pode colocar outras pessoas em risco. Assim como Tati Andrade acredita que não há “nada mais importante para um pai ou para uma mãe do que a vida de seu filho ou da sua filha, então é importante não colocar a vida das crianças em risco”.

Em 2019, a Comissão de Seguridade e Família da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 3842/19, que prevê pena de detenção de um mês a um ano, além de multa, para quem deixar de vacinar crianças ou adolescentes. A proposta ainda acrescenta ao Código Penal o crime de “omissão e oposição à vacinação”.

Conforme o texto aprovado, incorre na mesma pena quem divulgar, propagar e disseminar, por qualquer meio, notícias falsas sobre as vacinas componentes de programas públicos de imunização, de acordo com a Agência da Câmara dos Deputados.

Confira as vacinas que as crianças devem tomar na primeira infância:

Ao nascer: BCG - ID

1 mês: Hepatite B e Vacina Hepatite B;

2 meses: Vacina Tetravalente (DTP + Hib), VOP (vacina oral contra pólio) e VOPH (Vacina Oral de Rotavírus Humano);

4 meses: Vacina Tetravalente, VOP e VORH;

6 meses: Vacina Tetravalente, VOP e Vacina Hepatite B;

9 meses: Vacina contra Febre Amarela

12 meses: SRC (tríplice viral)

15 meses: VOP e DTP (tríplice bacteriana)

4 - 6 anos: DTP e SRC

*A identidade dos entrevistados foi preservada nesta matéria

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