SAÚDE
Especialistas alertam riscos no uso recreativo de Viagra em jovens
Utilização do medicamento sem prescrição médica pode acarretar em problemas psicológicos e na saúde do usuário
Por Filipe Ribeiro
O citrato de sildenafila surgiu na década de 1990, derivado de uma das pesquisas do laboratório norte-americano Pfizer. Inicialmente, com testes para encontrar um medicamento para hipertensão e doenças cardiovasculares, as propriedades da droga criaram novos horizontes para o tratamento da disfunção erétil, já que ofereceria a oportunidade de retornar a sua vida sexual ativa.
Patenteado em 1996, o medicamento ficou popularmente conhecido como Viagra, e começou a ser comercializado para os tratamentos clínicos. Atualmente, dados apontam que a disfunção erétil atinge 59% dos homens com idade entre 40 e 69 anos, de acordo com os dados da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU).
A droga se popularizou e ganhou as farmácias de todo o Brasil, o que fomentou o uso recreativo, ou seja, sem prescrição médica e por conta própria. O uso do Viagra antes dos 30 anos se tornou uma alternativa para contornar fatores como a insegurança e ansiedade, condição que se tornou comum entre os jovens, é o que explica a Sexóloga Clínica e psicóloga Mayara Magalhães.
“Os jovens recorrem aos remédios de ereção por curiosidade, busca por melhor desempenho sexual ou por medo de falhar, a insegurança. Para comprar esse tipo de medicamento, não é necessário apresentar receita médica na farmácia, o que torna o acesso fácil e o uso, muitas vezes, indiscriminado”, diz Mayara.
Um estudo da psicóloga canadense Sheri Madigan, em 2021, apontou que 1 em cada 5 jovens já experimentou sintomas de ansiedade clinicamente elevados. Ao A TARDE, a sexóloga também apontou as motivações que costumam desencadear os problemas psicológicos, como por exemplo, o consumo de pornografia de forma exagerada e precoce.
“A pornografia tradicional vende uma imagem de sexo performático (muito diferente do que se encontra entre quatro paredes), criando uma expectativa irreal da relação sexual. Muitos jovens se espelham nesses modelos, buscando reproduzir padrões na cama. Isso gera ansiedade de desempenho, que nada mais é, que a preocupação em desempenhar determinado papel, além de cobranças e frustrações por não alcançar o resultado desejado. Esse tipo de conteúdo adulto também não leva em consideração prazer feminino, ensinando aos jovens um sexo focado apenas na penetração. Vale lembrar que nos filmes pornôs, a resposta sexual geralmente é exagerada (ereção, desenvoltura, orgasmo, ejaculação). Seguir esses roteiros ditados pela indústria pornográfica pode ser um passo para lidar com problemas sexuais no futuro”, explicou.
Foi por insegurança que um jovem, que não terá sua identidade revelada, relatou o uso do medicamento. “Eu tenho pavor de ficar pelado na frente das pessoas, evitei relacionamentos por causa da minha vergonha, desde os 18 anos sempre evitei contato sexual. A primeira vez usei Viagra por insegurança”, declarou.
E pela curiosidade que um outro relatou ao A TARDE a experiência que teve. “Descobri esse remédio através do meu chefe, que tomava direto. Resolvi experimentar em uma das minhas idas a um clube noturno”, explicou. O consumo acabou sendo isolado, e o rapaz teve receio de retomar à prática em outras oportunidades. “Para uso diário ou para um encontro eu não uso, já que que pode dar problemas no coração e até passar a gerar problemas com ereção”, pontuou.
O medo do usuário é ratificado pelo médico urologista Jailton Campos, que explica as possíveis consequências pelo uso recreativo contínuo e exagerado do medicamento. “Existe casos de dependência psicológica da medicação. Em casos mais raros, o homem pode apresentar um quadro de priapismo – a ereção persistente muito dolorosa que exige cuidados de urgência para preservar as funções do órgão sexual. [...] As substâncias ainda podem virar hábito”, apontou Jailton.
Médico e titular da Sociedade Brasileira de Urologia, Felipe Pinho reforçou as consequências psicológicas que podem ser causadas a longo prazo pelo uso recreativo do Viagra. No entanto, ele pondera quanto ao termo 'vício', uma vez que existem pacientes jovens que utilizam a medicação por uma necessidade.
“Para os pacientes que precisam comprovadamente fazer o uso, seja de forma contínua ou sob demanda, não se pode falar em vício, mas em necessidade. Por outro lado, em homens que não apresentam disfunção erétil e fazem uso de forma recreativa, o vício que o medicamento traz não é orgânico, mas sim psicológico. Muitos homens acreditam que não vão ter uma performance tão boa sem ele e se tornam dependentes”, pontuou Felipe.
O corpo também dá seus sinais do consumo indiscriminado e rotineiro do medicamento. Entre os sintomas que podem ser apresentados, estão a cefaleia, rubor facial, tontura, dispepsia e congestão nasal. Mesmo alertando aos riscos, Felipe Pinho traz que não se deve haver uma 'condenação' do medicamento, entretanto, a utilização deste deve ser feita com a orientação de um especialista.
"A medicação em si, é segura e eficaz. Mas vale lembrar que remédio é para quem tem doença, e a automedicação sem orientação de um especialista é contraindicada em qualquer situação", completou.
Tratamento
Indicada para o tratamento da disfunção erétil, a droga também pode ser utilizada em casos de aumento da próstata. Embora clinicamente, as substâncias sejam prescritas, Jailton Campos abordou sobre outras alternativas para este tratamento.
“Mudanças do estilo de vida e modificação dos fatores de risco. A terapia psicossexual pode ser empregada de forma isolada ou associada a qualquer alternativa terapêutica, podendo ter resultados variáveis. Há a terapia de reposição de testosterona, em caso de disfunção erétil de origem hormonal, além da vacuoterapia, que pode ser empregada em pacientes que têm um relacionamento estável”, explicou Jailton.
Por fim, o acompanhamento direto com profissional da área de sexologia também se torna essencial na quebra de tabus, preconceitos e no entendimento do próprio corpo e seus limites.
“O profissional pode ajudar principalmente a quebrar essas crenças de que o homem tem que ser uma máquina sexual, a entender que todo ser humano é passível de falhas e que o sexo natural é muito mais gostoso do que o performático (daqueles que assistimos nos filmes pornôs). Além disso, o sexólogo dispõe de técnicas para quebrar bloqueios que podem estar interferindo na resposta sexual, seja no desejo, na excitação (ereção ou lubrificação) ou no orgasmo”, concluiu a sexóloga Mayara.
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