VEJA IMPRESSÕES (SEM SPOILER)
Polêmico, "Barbie" vai além do rosa para criticar machismo
Com muito humor, filme reflete sobre o mundo real e a dominação masculina
Por Bianca Carneiro
Viver no mundo da fantasia pode ser muito bom, até a realidade bater à porta e mostrar que quase nada é cor de rosa. Esse é o enredo de “Barbie: O Filme”. A produção, uma das mais esperadas do ano e recorde de bilheteria já na pré-venda, estreia oficialmente nos cinemas nesta quinta-feira, 20, e foi vista pelo Cineinsite A TARDE em primeira mão.
O filme acompanha uma das bonecas Barbie, interpretada pela atriz Margot Robbie, em um dia que parece ser normal na idílica e plástica “Barbielândia”. No entanto, a rotina perfeita de festas e bate-papo com as amigas muda drasticamente quando a boneca começa a ter pensamentos sombrios e pasmem, pés chatos, que dificultam o uso de salto alto. Ao lado do companheiro inseparável - ou pelo menos é o que pensávamos - Ken (Ryan Gosling), ela parte em uma jornada no mundo real para decifrar o que está causando estas “anomalias”.
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Antes de mais nada, é preciso reforçar: Barbie não é um filme indicado para crianças, e a classificação indicativa de 12 anos comprova isso. Apesar de ser centrado em um brinquedo, o longa é acima de tudo, uma reflexão sobre autoconhecimento, as dificuldades do mundo real, dominação masculina, machismo e patriarcado.
É tanto que os diálogos afiados e filosóficos, especialmente no ato final, exigem um certo nível de maturidade e de conhecimento da história e de questões sociais. Os homens conseguem sempre fazer o que querem? As mulheres têm espaço real na sociedade? E a que preço? Essas são algumas das problematizações feitas no filme.
E no meio do balaio nem o debate sobre o corpo da própria boneca escapa. A Barbie foi criada nos anos 50 pela empresária norte-americana Ruth Handler, fundadora da Mattel, como alternativa às tradicionais bonecas infantis da época, que retratavam bebês e crianças para brincadeiras de casinha. O momento, como todos já sabem devido a um dos teasers, foi recriado no filme com o exato look da Barbie: um maiô preto e branco.
A promessa era de que com uma boneca Barbie, as meninas podiam sonhar em ser o que quisessem quando fossem adultas: astronautas, médicas, professoras, presidentes…Mas será que ter o corpo padrão, magro e voluptuoso ajudava? Ou apenas faria com que essas crianças se sentissem rejeitadas por não terem a mesma aparência? E qual o impacto da boneca Barbie na sexualização das mulheres?
E o Oscar…vem?
As primeiras reações de Barbie apontavam para chances de Oscar para os atores, especialmente para Ryan Gosling. De fato, as atuações do filme são autênticas e dão um show à parte: Margot Robbie entrega uma Barbie afetuosa e complexa, totalmente absorvida em suas confusas emoções. Já o Ken de Gosling toma para si o protagonismo em diversos momentos, e funciona como uma crítica perfeita ao machismo. Ponto também para o Ken de Simu Liu, que deixa um gostinho de quero mais, Michael Cera e seu Allan estranhamente divertido, e para America Ferrera que traz um dos monólogos mais emocionantes do longa.
No equilíbrio entre a comédia que faz o público rir dos absurdos da sociedade machista e o drama que faz refletir sobre vários dos problemas reais que as mulheres enfrentam, a diretora e também roteirista Greta Gerwig entrega um roteiro potente e preciso, com poucas pontas soltas. O tempo passa rápido e é difícil não se envolver com as várias subtramas da história, algumas que mereciam até um desenvolvimento maior.
O cenário pink, que dá o tom (literalmente) ao estilo de vida utópico da Barbielândia, em contraste com o mundo real, cria uma dinâmica certeira dentro da sátira agridoce que o longa propõe. O público mais atento e nostálgico, especialmente aqueles que já brincaram de Barbie, vão notar diversas referências aos mobiliários, figurinos e acessórios da boneca. A composição, nos mínimos detalhes, é perfeita e até enjoativa às vezes, como um mundo de plástico seria. Se a atuação não for suficiente, certamente a fotografia e o figurino do filme valem um olhar mais atento da Academia.
Nem tudo é de plástico
Em um filme sobre bonecas, injusta surpresa seria se a imaginação não tivesse espaço. E felizmente, Barbie lida muito bem com isso: Greta Gerwig e seu marido, o co-roteirista Noah Baumbach, parecem ter tido bastante liberdade para jogar contra a própria Mattel. A empresa, que é a própria “casa” da Barbie, não foi poupada de críticas ácidas sobre sexismo e capitalismo.
E falando no capitalismo, é impossível falar de Barbie sem citar o super marketing envolvido na empreitada. Uma ida a qualquer shopping - e agora até mesmo ao tabuleiro da baiana de acarajé - se transforma em uma experiência cor de rosa, empurrada não só em itens de vestuário, mas também em comidas, e outros produtos inusitados. Outro triunfo da Warner Bros. é ter conseguido deixar uma trama tão complexa em quase que total segredo. Assistindo o conjunto da obra, é possível atestar: o que os trailers e teasers revelaram é quase nada do filme. E que bom!
Por outro lado, tal ambiguidade pode decepcionar quem espera um filme infantilizado e nos moldes fantásticos das animações que até hoje fazem tanto sucesso nas plataformas de streaming. Além disso, o discurso feminista, que ainda encontra barreiras de aceitação entre o público, pode, a longo prazo, afastar alguns homens - e até mulheres - da bilheteria. Inventivo, dramático, mas também autenticamente divertido, e um pouco musical, Barbie é um filme para ser visto de mente aberta, tal como uma criança que brinca com sua boneca fica livre para pensar. É deixar a imaginação fluir e se encantar.
Confira o horário das sessões de Barbie e de outros filmes em Salvador e Lauro de Freitas aqui.
Trailer
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