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18/08/2024 às 9:35 - há XX semanas | Autor: Malu Fontes*

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Sílvio Santos: muitas vidas numa só

Confira artigo de Malu Fontes

Silvio Santos na época da Globo
Silvio Santos na época da Globo -

Em 60 anos de televisão e 93 de idade, Sílvio Santos, o maior apresentador de TV do Brasil, foi muitos. Um ícone da cultura pop. De camelô nos anos 50 a meme e sticker em 2024, passando por candidato a presidente da República, dono de banco e de emissora de televisão. Atravessou um século no auge da popularidade, não conheceu o ostracismo e morreu como gênio na história da televisão brasileira.

A tradução do tamanho de Senor Abravanel, o garoto carioca filho de pais judeus fugidos da Europa para o Brasil em 1924, nascido em 1930 no bairro da Lapa e morto neste sábado, em São Paulo, pôde ser visto no espaço ao vivo dado pela Rede Globo ao assunto imediatamente após o anúncio de sua morte. Em um mundo onde contratos milionários brifam cada frase que pode ir ao ar na TV aberta e em a briga por micropontos de audiência é severa, tal deferência ao dono de uma empresa concorrente é da ordem do extraordinário. E irrepetível.

Assim que a informação da morte de Sílvio foi dada oficialmente pela família, a Globo interrompeu imediatamente a programação normal, passou o dia inteiro exibindo um obituário sofisticado e escalou para isso suas maiores estrelas, do telejornalismo e do entretimento. Para quem não sabe, todos, todos os veículos de comunicação têm em seus arquivos obituários prontos de personalidades idosas ou pessoas hospitalizadas com doenças graves. Diante da morte, basta editar e publicizar.

A Globo tinha um material irretocável pronto. Ao vivo, o exibiu e convidou dezenas de personalidades cujas vidas foram marcadas de algum modo pela passagem pelos programas do dono do Baú. De estrelas de agora, como a atriz Maísa, a octogenários, como o apresentador Raul Gil e Ronnie Von, a nomes globais atuais, como Serginho Groisman, Angélica e Eliana.

Silêncio no SBT

Enquanto isso, o SBT, a emissora de Sílvio Santos, causava estranheza ao telespectador. Ignorou durante toda a manhã a morte do dono e manteve no ar a atração matinal de rotina, de nome involuntariamente improvável para o dia: “Sábado animado”, com a exibição do desenho Scooby-Doo. Somente às 11:30, o jornalismo do SBT levou ao ar uma vinheta de plantão, com um conteúdo sem a musculatura esperada para o tamanho da biografia de quem criou tudo aquilo.

Na cobertura extensa e contínua feita pela Globo, chamava atenção a quantidade de estrelas da casa contando do início ou de grande parte de suas carreiras tendo Silvio como patrão. Nesse capítulo, a apresentadora Eliana e a atriz Maísa são as mais novas migrantes, recém-chegadas à Globo, ambas com as respectivas carreiras construídas no SBT. De Jô Soares, já morto, a César Tralli, um dos mais respeitados jornalistas e âncoras globais, nos depoimentos predominavam as referências ao bom humor e à gentileza de Sílvio.

Os haters do X e a história

Em tempos de redes, polarização e haters, não demoraram a aparecer discursos de ódio dos corvos digitais que sobrevoam as plataformas. Misógino, machista, apoiador da ditadura, milionário que enriqueceu vendendo carnê do baú para pobres, perseguidor do Teatro Oficina, bolsonarista etc. Sim, em suas muitas vidas, Silvio Santos também foi tudo isso, como devem ser quase todos os homens do seu tempo e estando onde esteve.

O hype dos haters é combater o tal discurso da essencialização, que não é outra coisa senão reduzir os diferentes de si às piores características. Não há nuances. É-se santo ou abjeto. E definir personalidades não é sobre pureza ou maniqueísmo, mas sobre a complexidade da condição humana.

Sim, Silvio Santos, ao morrer, não entrou na fila da canonização – nem cristão era, mas judeu. Foi um gênio da comunicação no Brasil, criou um império a partir do próprio carisma, apoiou a ditadura, como todos os empresários da comunicação no país na época, e alinhou-se a Jair Bolsonaro, no governo de quem seu genro, Fábio Faria, foi ministro das comunicações.

Apoiar os militares e criar um quadro fixo em seu programa, ‘A semana do presidente”, não anula a revolução pessoal que Sílvio fez na história do entretenimento televisivo brasileiro. Fora dos posts de ódio do X, nem nas enciclopédias mais reles a misoginia de Sílvio Santos será colocada em prateleiras acima do seu talento como apresentador, comunicador, empresário, ídolo popular e ícone pop.

Morre Sílvio Santos. Começa uma nova era da televisão Brasileira. Assis Chateubriand, Roberto Marinho, Sílvio Santos. Não há historiografia oficial da televisão no Brasil sem esses nomes. E o tema desta redação não é caráter, virtude ou bondade, mas talento para o protagonismo. Cada um com seus métodos. Na História, ninguém é santo.

Quem quer dinheiro?

Aos 93 anos, morto, Sílvio continuará por muito tempo a ser um parâmetro de talento para quem busca a receita de comunicação eficaz com o público de diferentes classes sociais. Poucos nomes da comunicação no país dominaram tão bem a fórmula para capturar a atenção do povo brasileiro. Era uma criança diante de crianças em seu palco e fazia rir com suas gafes monumentais até quem se incomodava com elas por dissonantes que se tornaram quando a gramática da televisão impunha proibições.

Nenhum brasileiro vivo razoável pode negar, por falta de argumentos, que Sílvio não foi o maior apresentador da história da televisão nacional. Dizem que ele nunca dava ordem a suas plateias. Convidava, perguntava, oferecia o microfone, convidada para cantar e dançar. E, assim, gravou no imaginário musiquinhas onomatopeicas das vinhetas de seus programas e bordões inesquecíveis para quem viu TV nas últimas seis décadas: ‘Quem quer dinheiro?’ ‘Qual é a música?’ E as piadinhas de duplo sentido com o ‘Roletrando’.

A ‘Succession’ das Abravanel e o futuro

A morte de Sílvio, em 2024, quando se anuncia uma nova forma de televisão aberta, a TV 3.0, mais interativa, plugada ao digital, com o controle remoto conversando em tempo real com plataformas de engajamento e de compras online dos produtos da tela, é o fechamento preciso de um ciclo em que ele foi protagonista, do primeiro ao último capítulo, sem nunca ter passado pelo ocaso.

Sua morte abre um capítulo novo na gestão do SBT. Sílvio deixa seis filhas, de dois casamentos. Por ser uma família discreta, pouco dada a declarações públicas sobre negócios e sucessão, a de fora dos palcos, pouco se sabe do que virá. Referindo-se à premiadíssima série ‘Succession’ (2018-2023), uma das mais incensadas pelo público, há quem se refira com algum humor a uma suposta ‘Succession das irmãs Abravanel’, as seis filhas e a viúva decidindo o quê e como farão com a gestão dos negócios e da fortuna.

*Malu Fontes é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas e professora de Jornalismo na Facom/UFBA.

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