CRIME ORGANIZADO
Israel alerta Brasil sobre laços entre o PCC e grupo terrorista Hezbollah
Segundo a denúncia, a carteira de criptomoedas utilizada pelo PCC para guardar cerca de R$ 500 bilhões também era usada pelo grupo terrorista libanês
Por Luan Julião

A Operação Hydra, deflagrada pela Polícia Federal e pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), revelou um esquema complexo de lavagem de dinheiro do Primeiro Comando da Capital (PCC) que envolve fintechs, casas de apostas e bancos digitais. O caso ganhou um novo desdobramento internacional com um alerta de Israel ao Brasil, informando sobre a conexão financeira entre uma fintech utilizada pelo PCC e o grupo terrorista Hezbollah.
As fintechs 2GO Bank e Invbank foram identificadas como peças centrais na operação criminosa. Essas instituições financeiras alternativas às bancárias tradicionais permitiam ao PCC ocultar a origem do dinheiro, dificultando o rastreamento pelas autoridades. O modelo adotado pelas fintechs facilitava a movimentação rápida e discreta de grandes quantias, muitas vezes convertidas em criptomoedas para driblar os mecanismos de fiscalização financeira.
A investigação que levou à Operação Hydra começou com a delação premiada de Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, peça-chave do esquema, assassinado com tiros de fuzil no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Gritzbach revelou como as fintechs 2GO Bank e Invbank eram utilizadas pelo PCC para lavar dinheiro do tráfico de drogas e de outros crimes.

O ponto mais alarmante da investigação surgiu com um alerta emitido pelo Ministério da Defesa de Israel, que notificou o Brasil e órgãos financeiros internacionais sobre uma conexão financeira direta entre o PCC e o grupo terrorista Hezbollah. Segundo a denúncia, a carteira de criptomoedas utilizada pelo PCC para armazenar cerca de R$ 500 bilhões também era usada pelo Hezbollah, o que levanta suspeitas de colaboração financeira entre as organizações criminosas.
Embora essa relação tenha vindo à tona agora, as suspeitas de conexão entre traficantes brasileiros e criminosos de origem libanesa ligados ao Hezbollah remontam a 2006. Em 2014, serviços de inteligência brasileiros já indicavam que o PCC estabeleceu canais para o envio de armas através dessa parceria internacional.

Em entrevista concedida à Rádio Câmara em 2014, o então terceiro vice-presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, deputado João Campos (PSDB-GO), destacou a preocupação com os indícios da ligação:
"Já em 2007, eu presidi a Comissão de Segurança Pública e, naquele ano, já existiam rumores de uma célula terrorista atuando na Tríplice Fronteira. Naquele tempo, aprovamos requerimentos para realizar diligências na região, conversar com autoridades e verificar até que ponto havia dados que indicavam a veracidade dessas informações.
"Depois, realizamos uma audiência reservada com a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República e a Polícia Federal na Comissão de Segurança Pública. Naquele período, o Estado brasileiro afirmava que estava atento, mas que, efetivamente, a suspeita não procedia."
"Logo após, em 2011, começaram a surgir informações de que, de fato, existia a presença de uma célula terrorista, e nós voltamos a adotar alguns procedimentos."
"O PCC não tem esse perfil; eles são uma organização criminosa voltada para a criminalidade no Brasil, como assaltos, sequestros, assassinatos e extorsão. Já o Hezbollah não; é um grupo terrorista, com um viés político e ideológico. A mistura desses dois é complicada, pois passar essa experiência para o PCC e permitir que eles passem a operar nessas duas frentes representa um risco real. São grupos com atuações totalmente distintas que, ao se encontrarem, podem formar uma associação criminosa ainda mais perigosa."
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) também fez alertas sobre a atuação do Hezbollah no Brasil. Em um relatório publicado em 2021, que o Portal A TARDE teve acesso, o órgão indicou que havia movimentações financeiras suspeitas vinculadas ao grupo terrorista e a pessoas relacionadas a ele.

"No plano da detecção de atividades ilícitas, o Coaf informou sobre a existência de comunicações possivelmente vinculadas ao Hezbollah e/ou pessoas relacionadas. As comunicações foram motivadas principalmente pela existência de mídia desabonadora em nome dos envolvidos ou sua inclusão em lista restritiva estrangeira."abin
"Nas análises, verificou-se o recebimento de recursos em espécie, inclusive de forma fracionada, ou de empresas ligadas ao comércio de eletrônicos, seguido de transferências para empresas e/ou organização sem fins lucrativos, ou ainda para a aquisição de imóveis. A utilização de contas das citadas empresas em nome dos principais analisados teria o objetivo de dar aparente legalidade às movimentações financeiras. Verificou-se ainda, mais recentemente, a utilização de tipologias de lavagem de dinheiro por meio de comércio internacional."
Em 2023, a ligação entre o PCC e o Hezbollah tornou-se ainda mais evidente após uma operação policial que desmantelou um laboratório de produção do Dry Marroquino, uma variante de haxixe popular na Turquia e controlada pelo PCC. Durante a ação, foi preso Garip Uç, um químico turco de 38 anos que havia solicitado refúgio no Brasil em 2020.

As investigações revelaram que seu sobrenome já era conhecido por agências internacionais, incluindo a Drug Enforcement Administration (DEA), dos Estados Unidos. Isso porque seu irmão, Eray Uç, era apontado como integrante de uma rede de traficantes que destinava parte dos lucros do tráfico de drogas para financiar o Hezbollah.
Inicialmente, as autoridades acreditavam que o homem preso em São Paulo era Garip Uç, mas surgiram suspeitas de que, na verdade, ele fosse seu irmão Eray, que teria utilizado documentos falsos para circular no Brasil. A confirmação veio após um cruzamento de dados com bancos de informações internacionais.
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