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Polícia usa termo 'narcocultura' contra MC Poze; juristas criticam
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Por Redação

A Polícia Civil do Rio de Janeiro usou o termo "narcocultura" na prisão de MC Poze, que aconteceu no dia 29 de maio. Juristas e estudiosos afirmam que a expressão não tem validade penal e reforça a perseguição à cultura periférica.
Pose foi preso acusado de apologia ao crime e associação ao tráfico. Segundo a polícia, suas músicas e shows exaltariam a facção Comando Vermelho (CV), em uma suposta "narcocultura" que romantiza o tráfico.
"Cantor de funk que propagava a narcocultura foi preso por apologia ao crime e por envolvimento com o Comando Vermelho", diz uma publicação da Polícia Civil. A legenda ainda afirma que a prisão é "um recado para todos que ajudam a disseminar a narcocultura".
De acordo com UOL, juristas entrevistados criticam o conteúdo por violar princípios constitucionais e antecipar a culpa do investigado. "O delegado deve manter sua neutralidade, sendo imparcial em relação aos fatos. O compromisso da investigação é com a verdade, não com a acusação", afirma o advogado criminalista Guilherme Gama.
Para Gama, a publicação da Polícia Civil viola o princípio da impessoalidade previsto no artigo 37 da Constituição. Ele também alerta para o risco de contaminação da opinião pública. "Isso antecipa um juízo condenatório com viés político, sem permitir o contraditório e a ampla defesa".
Segundo o jurista, a culpa só pode ser declarada após o trânsito em julgado.
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Liberdade artística
O advogado criminalista Luiz Rutis afirma que a prisão é ilegal e viola a liberdade artística. "A prisão temporária só se justifica se o agente for perigoso". "Defender a narcocultura não exprime perigo". "Trata-se, em princípio, de uma atividade protegida pela liberdade artística", disse.
Para ele, criminalizar músicas de funk com base em interpretação subjetiva de autoridade é censura indireta. "O critério sobre o que é permitido ou proibido deve ser sempre objetivo e claro". Em caso de dúvida, deve prevalecer uma presunção de legitimidade da manifestação cultural, explica.
Rutis vê flagrante violação ao princípio da proporcionalidade. "Sem elementos objetivos de periculosidade concreta, o uso da prisão como resposta à manifestação simbólica é um excesso arbitrário. Isso subverte a lógica do Estado de Direito", declara.
Repressão simbólica
Morgado afirma que artistas negros e periféricos são alvo preferencial da repressão simbólica. Ele se refere a outros gêneros musicais, como o sertanejo, o rock e o punk, que também falam de armas e violência e não sofrem o mesmo tipo de perseguição. "Isso revela seletividade e racismo estrutural", diz o especialista.
O antropólogo Vinícius Rodrigues alerta que o uso do termo pelo Estado é político, e não técnico. Ele explica que o termo pode ser uma ferramenta analítica, mas que está sendo usado como rótulo acusatório. Isso reforça a estigmatização do funk e da juventude negra, em sua opinião.
Para ele, retratar a desigualdade social em letras de música não é crime. "Como separar o que é fruto da imaginação do que é apologia? A aplicação da lei recai seletivamente sobre artistas periféricos".
Rodrigues também aponta censura velada como estratégia de controle. Para ele, usar MC Poze como exemplo é uma forma de impor medo a outros artistas. "Isso limita a liberdade de denúncia e expressão cultural das periferias", esclarece.
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