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A Tarde Memória

Por Andreia Santana e Priscila Dórea*

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 23 de agosto de 2025 às 9:36 h • Atualizada em 23/08/2025 às 12:30 | Autor:

Fatos históricos trágicos e mortes contribuíram para a má fama de agosto

Guerras mundiais, bombardeio nuclear e o luto nas artes, na política e na religião ajudaram a criar o mito de que o mês é azarado e traz desgosto

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No Rio, povo conduziu urna de Juscelino até o aeroporto Santos Dumont
No Rio, povo conduziu urna de Juscelino até o aeroporto Santos Dumont -

Em tese, agosto é considerado pelo senso comum o mês mais longo do ano. Um exagero, lógico, porque há outros meses com 31 dias no calendário. Embora, o caso de agosto com o dia a mais seja meio forçado e, no decorrer da leitura desse texto, explicamos o motivo. O que pesa é que muitos fatos históricos e mortes de pessoas importantes ocorreram em agosto, ajudando a aumentar a fama de sinistro e de azarado do mês, a ponto de existir até ditado popular: “Agosto, mês do desgosto”.

Olhando para a história, seja na Bahia, Brasil ou mundial, agosto acumula episódios marcantes como o início das duas grandes guerras, em 1914 e 1939; as bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki, no contexto da II Guerra; o suicídio de Getúlio Vargas; o acidente de carro que matou o ex-presidente Juscelino Kubitschek; as mortes do cineasta Glauber Rocha, da ialorixá Mãe Menininha do Gantois, das atrizes de Hollywood Carmen Miranda – também cantora -, e Marylin Monroe, da princesa Diana, do cantor Zelito Miranda, entre outros fatos.

Caixão da princesa Diana é carregado por membros da RAF - Real Força Aérea, em 31 de agosto de 1997
Caixão da princesa Diana é carregado por membros da RAF - Real Força Aérea, em 31 de agosto de 1997 | Foto: Johnny Eggipt - AFP/ Cedoc A TARDE/ 31-08-1997

Não há uma explicação oficial ou motivo específico para essas ocorrências se concentrarem no mesmo mês ao longo da história. Para os mais céticos, fica tudo por conta de uma coincidência infeliz. Os fatalistas vão dizer que é o destino e os místicos, que o mês tem um carma pesado. A astróloga e taróloga Livia Vallory, por sua vez, dá a sua interpretação:

“Agosto é um mês cansativo, sem feriado nacional e com 31 dias, o que já contribui para a sensação de lentidão. Em algumas regiões, é mais seco e frio, o que também afeta nosso humor coletivo. É o retorno das férias escolares, do trabalho, e tudo isso pesa. Além disso, há uma carga histórica e política que reforça essa percepção, porque o nosso cérebro tende a lembrar mais dos eventos negativos do que dos positivos. Embora não exista uma explicação fixa ou universal, há interpretações astrológicas que apontam movimentos celestes que podem intensificar esse período”, diz.

O dia do imperador

Originalmente, o mês se chamava "sextilis", o sexto mês do antigo calendário romano. Foi o primeiro imperador de Roma, César Augusto, sobrinho neto do chefe militar e político Júlio César e adotado por ele como filho e herdeiro, que renomeou o sextilis em sua própria homenagem, em 27 a.C (antes de Cristo). Nascido Caio Otávio, ele adotou o nome de César Augusto ao assumir o trono romano. O mês anterior a agosto, julho, homenageava Júlio César e tinha 31 dias. Augusto, então, quis que o “seu mês” também tivesse 31 dias.

A associação com eventos negativos, no entanto, começou séculos mais tarde, graças ao espírito supersticioso medieval. Em torno de 1400 e 1500, quando os portugueses saíram do país de origem para invadir as terras do Novo Mundo, a má fama de agosto começou a se propagar porque naquele período, dizia-se que “casar em agosto trazia desgosto”. Era nesse mês que as caravelas partiam, deixando as recém-casadas sem os maridos e, muitas, tornavam-se viúvas antes da lua de mel, devido aos naufrágios.

Os séculos passaram, mas a mácula permaneceu. As primeiras décadas do século XX, com a Europa assolada pela Primeira Guerra Mundial, todas as reviravoltas históricas decorridas do conflito e que culminaram em outra guerra, ajudaram a consolidar para o senso comum que, tal qual diziam os antigos portugueses, “agosto é o mês do desgosto”.

Getúlio governou o pais de 1930 a 1945, no Estado Novo, e de 1951 até o seu suicídio, em 1954
Getúlio governou o pais de 1930 a 1945, no Estado Novo, e de 1951 até o seu suicídio, em 1954 | Foto: Cedoc A TARDE

No dia 1 de agosto de 1914, A TARDE reuniu vários boletins informando a situação dos países que dariam início a I Grande Guerra, vindos de Haya: "O governo decretou a mobilisação geral do exercito. O decreto determina que todos os individuos sujeitos ao serviço militar, se apresentem com a maxima urgencia"; de Roma: "Telegramma recebido da Austria informa que os monitores austriacos que se acham em frente de Belgrado, bombardearam a cidade"; e de Londres: "Nas batalhas que se têm travado nas fronteiras da Servia, os austriacos aprisionaram uma divisão inimiga. Os mortos do lado attingem a 2.000 sendo que os austriacos tiveram 200 baixas", entre outras cidades envolvidas no confronto.

A Primeira Guerra só acabaria em 1918. Mas, 20 anos, 9 meses e 21 dias depois, coincidentemente no final de agosto de 1939, a Segunda Guerra Mundial teria início com todos os seus flagelos. O mês também abrigou outros eventos históricos, alguns de escala mundial, como o início da construção do Muro de Berlim, em 1961 [tema do A TARDE Memória do último dia 09], como consequência do pós-II Guerra.

Cogumelo da morte

No livro Minha Guerra Alheia, sobre sua infância na Itália de Mussolini, durante a Segunda Guerra, a escritora Marina Colasanti afirma que as bombas caem em silêncio e que, no segundo antes delas tocarem o solo e explodirem, o mundo faz uma pausa, como quando congelamos a imagem de um filme.

Durante esse conflito, outra cena poética, mas destruidora, também ficou gravada na memória coletiva mundial, a dos cogumelos que se formaram no horizonte quando as bombas atômicas explodiram sobre Hiroshima e Nagasaki, entre os dias 6 e 9 de agosto, em 1945.

A edição de A TARDE do dia 8 informava que todos os habitantes da cidade de Hiroshima “pereceram queimados ou esmagados pela enorme pressão do ar" e que outras bombas atômicas seriam lançadas sobre o Japão. "Esta bomba acrescenta nova e revolucionária destruição... Tais bombas estão agora em produção; novas e mais poderosas formas são estudadas", afirmava trecho da nota da Casa Branca citada na reportagem.

As cidades japonesas e sua população civil foram dizimadas por bombas atômicas lançadas pelos Estados Unidos como retaliação pelo bombardeio aéreo da base militar de Pearl Harbor, no Hawai. O Japão era aliado da Itália e da Alemanha. A Casa Branca chamou a situação de “dar o troco” pelas baixas em Pearl Harbor, mas a ameaça nuclear e o poder de destruição da bomba atômica passaram a assombrar o imaginário coletivo mundial desde então.

Mês arrastado

Lívia Vallory explica que, do ponto de vista da astrologia, há agostos que são mais intensos que outros e isso depende da somatória de forças celestes atuando ao mesmo tempo. "Quando há planetas retrógrados, eclipses e tensões entre astros mais lentos, que são geracionais, aumenta a chance de eventos coletivos de grande impacto e visibilidade”.

No Brasil, os 31 dias de agosto parecem se arrastar, o que contribui para a sensação de que é um período tenso e emocionalmente carregado. Mais de dez acidentes e incidentes aéreos foram registrados no país, desde 1915, em agosto, por exemplo. Entre eles o sequestro e roubo do Voo VASP 280, nos anos 2000; a queda do hidroavião Baby Clipper NC 16933 em 1939 e o incêndio e explosão em pleno ar da aeronave Douglas DC-3 PP-ANH, do consórcio Nacional Viabras.

No dia seguinte a esse acidente, a edição de A TARDE de 12 de agosto de 1952 publicou a nota oficial que a Viabras emitiu sobre a explosão da aeronave. "A diretoria da Viação Aérea Brasil S. A., cumpre o doloroso dever de comunicar um acidente sofrido, hoje, às 9:30 horas, aproximadamente, pela sua aeronave DC-3 prefixo PP-ANH, em vôo de Rio Verde para Goiania (...) A aeronave, foi localizada danificada, nas proximidades de Palmeiras, não possuindo a direção da emprêsa, até o momento em que foi redigida esta nota, noticias oficiais sobre o acidente", informava o texto.

Junto às tragédias aéreas, muitas mortes de figuras importantes no Brasil aconteceram no fatídico mês, como o infarto da cantora e atriz da era de ouro de Hollywood Carmem Miranda, em 1955; a morte da ialorixá Mãe Menininha, do Terreiro do Gantois, em 1986, manchete de A TARDE na edição de 13 de agosto daquele ano; a morte do cineasta Glauber Rocha, em 22 de agosto de 1981, na mesma data em que, cinco anos antes, 1976, morreu em um acidente de carro o ex-presidente Juscelino Kubitschek; além do já citado suicídio de Getúlio Vargas, no dia 24, em 1954.

O cineasta Glauber Rocha morreu em 22 de agosto de 1981
O cineasta Glauber Rocha morreu em 22 de agosto de 1981 | Foto: Cedoc A TARDE

"Suicidou-se na manhã de hoje, em seus aposentos particulares, no palácio do Catete, o sr. Getúlio Vargas. O fato ocorreu entre 8:30 e 8:40 horas desta manhã, causando a mais viva emoção em todo o país. Após prometer que ainda hoje passaria o govêrno ao vice-presidente da República, o sr. Getúlio recolheu-se aos seus aposentos de onde pouco depois, ouviu-se um estampido e o general Caiado de Castro, prevendo já uma tragédia, correu pressuroso aos aposentos presidenciais, onde ainda encontrou o presidente agonisante", detalhou a edição extraordinária de A TARDE, publicada no mesmo dia.

Mas, apesar da sequência de fatos negativos ocorridos nos agostos ao longo das décadas, Lívia Vallory olha para o mês sob uma ótica menos fatalista e adverte: “Não é só em agosto que as coisas acontecem: cada ano traz uma configuração diferente no céu”.

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*Com a colaboração de Tallita Lopes

*Os trechos retirados das edições históricas de A TARDE respeitam a grafia da época

*Material elaborado com base em edições de A TARDE e acervo do CEDOC/A TARDE

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