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A Tarde Memória

Por Priscila Dórea*

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 20 de setembro de 2025 às 7:17 h | Autor:

Primeiro do estado, Museu de Arte da Bahia busca conexão com a comunidade

Espaço tem 36 coleções, 20 mil peças no acervo e prepara programação de oficinas e atividades para a Primavera dos Museus 2025

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MAB ocupou antiga sede da Secretaria de Educação e Saúde a partir de 1982
MAB ocupou antiga sede da Secretaria de Educação e Saúde a partir de 1982 -

O primeiro instalado no Estado e na lista dos primeiros do país, o Museu de Arte da Bahia (MAB) acumula camadas de história, cultura e identidade. Fundado em 1918, possui o maior acervo museológico baiano, com 36 coleções e quase 20 mil peças históricas, científicas e etnográficas datadas dos séculos XVII ao XX, que contam sobre a nossa arte e formação cultural. Este ano, na Primavera dos Museus, evento que está na 19ª edição e começa na segunda-feira, 22, o MAB terá programação gratuita para toda a família.

No dia 23 de julho de 1918, o espaço nasceu como Museu do Estado da Bahia, no prédio anexo ao Arquivo Público. Sua criação teve como inspiração o popular modelo de museu enciclopédico em vigor na Europa do século XIX. Esse tipo de local, reunia objetos de diferentes culturas, oferecendo aos visitantes muita informação sobre histórias locais e globais.

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"No início, era um museu para contar, basicamente, a história da Bahia", explica a historiadora e mestre em museologia, Camila Guerreiro, assessora da direção do MAB. Pinacoteca (quadros), numismática (moedas, cédulas e medalhas), porcelanas, joias, azulejaria, gravuras, desenhos e fotografias foram as primeiras peças a compor o acervo do museu, muitas oriundas de doações feitas pela elite baiana, prefeitura e governo estadual.

Biblioteca do Museu de Arte da Bahia nos anos 1980
Biblioteca do Museu de Arte da Bahia nos anos 1980 | Foto: CEDOC A TARDE/18/12/1987

"O Museu do Estado recebeu ante-hontem as offertas de uma taça offerecida pela municipalidade e de duas batutas historicas e um cartão, offerecidos pelo governo do Estado", informava a edição de A TARDE do dia 13 de novembro de 1920, uma das muitas referências a MAB na coleção de edições do jornal.

Relíquias nacionais

No artigo "O Museu do Estado da Bahia, entre ideais e realidades (1918 a 1959)", a historiadora e mestre em ciência da informação e documentação, Suely Moraes Ceravolo, explica que nos museus a história patriótica é materializada em objetos: "Na prática, a história aderia-se a objetos emblemáticos relativos a aspectos particulares da história brasileira, nacional e local. (...) no sentido de enaltecimento de pessoas e eventos exemplares no contexto de uma certa ideia de imortalidade conferida a eles pelos museus, muitas vezes, através das coleções doadas".

Na área da museologia, aponta Camila Guerreiro, essas peças são chamadas de relíquias da pátria. “Eles guardavam o que, naquela época, acreditavam ser o mais interessante a se perpetuar para as futuras gerações. Então o acervo não era voltado para a arte visual ou tinha uma linha curatorial", explica.

Foi na década de 1920, com a instalação da Pinacoteca do Estado, que o acervo do MAB começou a ganhar mais volume, em especial com a aquisição de cerca de 200 quadros de artistas estrangeiros e baianos que pertenciam a coleção pessoal do médico inglês Jonathan Abott. Após a morte dele, a viúva do médico vendeu as peças ao Estado.

O acervo continuou crescendo e logo o espaço ocupado ao lado do Arquivo Público ficou pequeno demais. Em 1931, ocorreu a mudança do museu para o Solar Pacífico Pereira, às margens da Praça Dois de Julho (Campo Grande), no terreno que hoje abriga o Teatro Castro Alves (TCA). O solar ainda passava por reformas para abrigar o museu quando a transferência das peças começou. Na época, a cobertura de A TARDE foi intensa, acompanhando tanto o avanço das obras, quanto o volume de itens doados.

Com diferentes peças chegando não só pelas vias dos poderes executivos, mas também por colecionadores particulares, artistas e a elite baiana da época, em geral, não é de se espantar o quão diverso é o acervo do MAB atualmente. Durante todo o ano de 1931, inúmeras matérias e notas sobre as doações foram publicadas em A TARDE e elas preservam a memória da formação do acervo imenso e diverso do museu.

"Concorrendo para enriquecer as collecções de arte antiga do Museu do Estado o cel. Antonio Ferreira Bastos, negociante nesta praça, offereceu um antiquissimo nicho, obra de mais de 100 annos e que pertenceu à familia Gonçalves Bastos. Outros offerecimentos valiosos podem, desde já, ser registrados, entre elles, os dos srs. comm. Bernardo Catharino e Anísio Massorra", informava a edição de A TARDE de 20 de março de 1931.

Entrada do Museu de Arte da Bahia nos anos 1990
Entrada do Museu de Arte da Bahia nos anos 1990 | Foto: Gildo Lima/CEDOC A TARDE/10/05/1998

Entre as peças no acervo do MAB hoje, há pinturas de artistas como José Teófilo de Jesus, Prisciliano Silva e Almeida Júnior; móveis coloniais e imperiais; porcelanas europeias e orientais, cristais, prataria e azulejaria; e a coleção Riquezas do Brasil, com cerca de 600 tipos de madeiras brasileiras esculpidas em forma de livro.

Recentemente, o MAB instalou três grandes exposições: a “Fatumbi”, com fotografias de Pierre Verger e Emo de Medeiros; a “Bancos Indígenas do Brasil: Rituais”, com 100 peças de mobiliário indígena de 39 etnias; e a “Carybé e o Povo da Bahia”, que toma várias partes do museu com 227 desenhos originais em nanquim feitos por Carybé.

Artes visuais

A mudança do modelo enciclopédico para um museu mais voltado às artes visuais ocorreu aos poucos, mas se intensificou durante a gestão de José Valadares, "um homem de museu", como ele mesmo se autodenominava. Indicado como gestor do Museu do Estado em 1930, com 22 anos, ele permaneceu no cargo até sua morte, em 1959. Em meados da gestão, em 1946, o museu se mudou mais uma vez e foi para o Solar Góes Calmon, em Nazaré, onde hoje é a sede da Academia de Letras da Bahia.

Décadas depois, em 1982, já sob a direção do artista plástico Emanuel Araújo, o museu é transferido mais uma vez para a Avenida Sete de Setembro, no coração do Corredor da Vitória, onde se encontra até os dias atuais. O terreno da atual sede, ainda no século XIX, abrigava a residência de um ex-traficante de escravos, José Cerqueira Lima que, em 1858, vendeu o casarão ao professor Francisco de Almeida Sebrão, que o transformou no Colégio São João. Em 1879, o casarão foi adquirido pelo governo para ser residência dos Presidentes de Província e, posteriormente, Palácio dos Governadores.

Já em ruínas no final daquele século e sob a gestão do então governador Góes Calmon, o antigo prédio foi demolido para a construção do Solar Cerqueira Lima, que se tornaria a sede da Secretaria de Educação e Saúde, em 1927. "É interessante pensar, por exemplo, que Anísio Teixeira, titular da secretaria naquela época, trabalhava nessas salas. O museu só chegou nessa sede em 1982, alguns anos depois de mudar o nome de Museu do Estado para Museu de Arte da Bahia, ali em meados da década de 1970", diz Camila Guerreiro.

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A edição de A TARDE de 5 de fevereiro de 1982 anuncia a mudança do MAB para a nova sede e ressalta a importância da transferência, pois àquela altura o acervo era tão volumoso que estava espalhado pela cidade. “Segundo o seu diretor, Emanoel Araújo, depois da mudança, o Museu de Arte da Bahia deverá ser transformado num grande centro de atividades culturais integrado à comunidade", aponta o texto.

A mudança para o Solar Cerqueira Lima foi enriquecida ainda com elementos que vieram da demolição de outras edificações, como o corrimão da escada, que veio do Convento e Igreja de Santo Antônio do Paraguaçu (Recôncavo Baiano) e a emblemática porta de jacarandá entalhada de 1674, que veio do Solar João de Matos Aguiar (situado na Ladeira da Praça). É a porta de entrada do museu e a arte esculpida na peça tornou-se a logo do MAB.

Novo perfil

Até́ 2015, o MAB tinha um perfil muito voltado para grandes exposições de longa duração. Mas, há 10 anos, a equipe iniciou a busca por formas de abrir mais espaço para o público. Começou com a abertura do auditório, onde pessoas e instituições sugerem pautas que vão de palestras e oficinas até recitais e batizados de capoeira. “Isso ampliou muito o papel do museu como espaço cultural ativo e participativo na cidade”, afirma Camila Guerreiro.

Fachada do Museu de Arte da Bahia, no Corredor da Vitória
Fachada do Museu de Arte da Bahia, no Corredor da Vitória | Foto: Antônio Saturnino/CEDOC A TARDE/18/05/1998

Outra decisão importante foi a de participar da Primavera dos Museus, um evento que busca intensificar a relação entre os museus e a sociedade. Parte da equipe que coordena as ações educativas do MAB, a pedagoga Clara Lua pesquisa a educação fora de espaços escolares e destaca o quanto a Primavera dos Museus, que a cada ano possui um tema, ajuda na conectividade dos acervos com a população. "No ano passado, por exemplo, o tema foi acessibilidade e mostrou como o museu se comporta diante de diferentes tipos de pessoas. Dentro da programação pensada para o evento, expomos obras de três artistas, o pintor Gustavo Reis, que é autista nível 2 de suporte, e dois fotógrafos, Jeff Carvalho, que é deficiente físico, e David Monteiro, que é cego", explica.

Sob o tema "Museus e Mudanças Climáticas", a 19ª Primavera dos Museus acontece entre os dias 22 e 28 de setembro deste ano. "Às vezes, parece que uma coisa não tem nada a ver com a outra, mas o museu enquanto instituição social e cultural da sociedade, e para a sociedade, precisa estar integrado e discutindo sobre essas questões. Para essa edição, vamos envolver não só o museu e seu acervo, mas todo o terreno. Então, além de visitas guiadas, vamos ter oficinas com a Feira Agroecológica e atividades para toda a família", enumera Clara Lua.

Preservando a história sem parar no tempo, a última grande virada do MAB aconteceu na pandemia da Covid-19. Na época, o museu precisava de uma reforma estrutural (telhado, pisos etc.), mas só isso não bastava. "Era preciso repensar o espaço como um todo. O Governo da Bahia, a Secult, o IPAC e o diretor Paulo Ribeiro decidiram que era preciso rever a concepção do museu. A antiga expografia imitava ambientes históricos, como o quarto do barão ou a sala de estado do século XIX, o que confundia o público e reforçava uma ideia de museu elitizado", explica Camila Guerreiro.

Apesar das ricas 36 coleções em seu acervo, poucas eram mostradas, e o foco ficava em móveis, pinturas e porcelanas. Após a virada de chave, o MAB tem se tornado mais e mais próximo da população. "Queremos mostrar quem produziu, quem usou, quem manipulou, não apenas quem comprou. Com o apoio de professores da UFBA e da UNEB, criamos a Comissão Curatorial do Acervo do MAB para pensar formas mais inclusivas, dinâmicas e representativas de apresentar esse patrimônio, que é, acima de tudo, do povo da Bahia”, define a historiadora Camila Guerreiro.

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*Com a colaboração de Tallita Lopes

*Os trechos retirados das edições históricas de A TARDE respeitam a grafia da época em que as reportagens foram originalmente publicadas

*Material elaborado com base no acervo do CEDOC/A TARDE

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