DIA DA VISIBILIDADE BISSEXUAL
Somos todos bissexuais: polêmica frase de Freud debate a natureza humana
Descubra como a visão de Freud sobre bissexualidade amplia a compreensão da sexualidade

Por Isabela Cardoso

O que Sigmund Freud, considerado como o "pai da psicanálise", quis dizer quando afirmou que todos somos bissexuais?
A frase, polêmica até hoje, não trata apenas da orientação sexual. Ele acreditava que nossa mente é construída a partir de identificações com traços masculinos e femininos, e que a sexualidade é mais ampla do que o simples ato de se relacionar com um gênero ou outro.
No Dia da Visibilidade Bissexual, celebrado nesta terça-feira, 23, o Portal A TARDE traz uma reflexão sobre a sexualidade fluída e a identidade afetiva.
Para a psicoterapeuta e neurocientista Ana Chaves, entender isso ajuda a enxergar a sexualidade de forma mais ampla.
“Na teoria psicanalítica, Freud acreditava que a psique humana carrega em si tendências tanto masculinas quanto femininas. Então, para ele, desde o início do desenvolvimento de cada um de nós, de cada indivíduo, a gente nasce com uma disposição bissexual. Ou seja, a possibilidade de sentir atração, desejo ou ao mesmo tempo se identificar por aspectos de ambos os sexos”, explica.
A profissional reforça que a ideia não se limita à sexualidade física. É sobre como nos relacionamos com o mundo e com os outros.
“A gente pode dizer de forma simples que Freud via todos nós como possuidores de uma mistura interna de masculino e feminino. Que isso não significa que todas as pessoas vão se relacionar sexualmente com ambos os sexos, mas que nossa mente e nossa forma de amar carregam, na visão dele, traços de identificação e desejo que não se limitam a uma só polaridade”, acrescenta.

Uma mistura interna de masculino e feminino
A teoria pode soar abstrata, mas também pode ser traduzida de forma simples: todos carregamos uma espécie de mistura interna. Não significa que todas as pessoas vão viver relações com homens e mulheres, mas sim que nossas formas de amar e de desejar não se limitam a uma única polaridade.
“A gente pode dizer de forma simples que Freud via todos nós como possuidores de uma mistura interna de masculino e feminino. Que isso não significa que todas as pessoas vão se relacionar sexualmente com ambos os sexos, mas que nossa mente e nossa forma de amar carregam, na visão dele, traços de identificação e desejo que não se limitam a uma só polaridade”, diz Ana Chaves.
Como a bissexualidade psíquica se manifesta
Mas como essa bissexualidade aparece na vida real? Freud dizia que ela se expressa em diferentes camadas, que vão das identificações familiares até os sonhos e desejos inconscientes.
“A bissexualidade psíquica, ela aparece em forma de identificações, para que vocês se entendam melhor. Homens podem se identificar com figuras femininas, como a mãe, a professora, a irmã. Assim como as mulheres podem se identificar com figuras masculinas, como o pai, o irmão, o chefe, um amigo. E também na forma de atrações simbólicas, que não se trata apenas de atração sexual, mas de ter um reconhecimento de qualidades do outro sexo em si mesmo ou também no outro”, explica a psicoterapeuta.

Segundo a profissional, mesmo pessoas heterossexuais carregam esse campo de possibilidades.
“Freud traz que onde pode se encontrar nos sonhos, fantasias, desejos inconscientes, muitas vezes elementos masculinos e femininos que podem ser encontrados de forma misturada, ou seja, mesmo alguém heterossexual pode ter dentro de si esse campo de possibilidades psíquicas que não se expressam diretamente com a orientação sexual de cada um", destaca.
Liberdade, descoberta e riscos
Para além da teoria, jovens bissexuais também relatam como essa vivência se traduz em sentimentos, afetos e desafios no dia a dia. Amora Lima, coralista Coro Juveni do Neojiba, de 21 anos, descreve a experiência como múltipla e cheia de contrastes.
“Não é só atração sexual, são sentimentos e conexões bem diferentes quando se trata de homens e mulheres, são ritmos e cores totalmente diferentes. Com mulheres me sinto em casa, como se ali todos entendem sua história e suas dores, já com homens é algo mais perigoso ou arriscado, onde temos que ter muito mais cuidado ao confiar e se entregar, uma vez que existe esse abismo social que incita o ódio às mulheres na formação de cada homem”, diz.
Para Amora, viver a bissexualidade é também viver a identidade e os modos de se apresentar ao mundo.
“A bissexualidade envolve também estilos diferentes, numa identidade que flutua entre ser mais feminina ou mais masculina, para equilibrar as relações e também explorar a própria personalidade, viver isso hoje pra mim é sinônimo de liberdade e descoberta", completa.
A advogada Milena Espírito Santo, de 24 anos, traz outra perspectiva sobre a experiência pessoal da bissexualidade, reforçando a importância da conexão emocional.
“Pra mim, ser bissexual não se resume só à atração sexual por mais de um gênero. Envolve conexão emocional, afetiva e de identificação. Após me descobrir, consegui me interessar pelas pessoas de formas diferentes, pelo jeito, pela energia e pela história delas, ultrapassando essa barreira física da atração", comenta.

Milena explica que entender a própria identidade ajuda a enfrentar preconceitos e estereótipos.
“Acredito que começar entendendo o básico é o melhor passo: a bissexualidade não é 'confusão' ou 'indecisão'. A bissexualidade faz parte de nós, mas não nos define por completo. Viver a identidade hoje é enfrentar estereótipos e mostrar que posso ser autêntica sem precisar me encaixar em caixinhas", completa a advogada.
Sexualidade como campo aberto
Ao olhar para o futuro, o pensamento freudiano pode ser visto como uma chave para combater preconceitos. Se todos carregamos, em algum grau, essa disposição bissexual, não faz sentido encarar a diversidade como exceção ou anormalidade.
“Freud abre espaço para que a gente entenda a sexualidade de uma forma mais fluida e complexa e não binária. Não é apenas uma forma fixa de viver o desejo. Cada pessoa pode apresentar diferentes nuances ao longo da sua vida. E a sexualidade não se reduz à genitália ou ao objeto sexual, mas ela envolve camadas emocionais, afetivas e inconscientes”, aponta Ana Chaves.
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Essa noção abre caminho para desconstruir estigmas, conforme explica a psicoterapeuta. “A noção de bissexualidade psíquica mostra que não existe uma linha rígida que separa hétero, homo ou bi, mas sim um campo amplo de experiências humanas. E isso contribui para reduzir o estigma contra pessoas bissexuais, porque a psicanálise reconhece que todos temos essa base comum”, completa.
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