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ENTREVISTAS

Dado Schneider explica como a geração Z muda as regras do mundo do trabalho

Entrevista - Dado Schneider, professor, palestrante e escritor

Divo Araújo

Por Divo Araújo

27/10/2025 - 5:31 h
Imagem ilustrativa da imagem Dado Schneider explica como a geração Z muda as regras do mundo do trabalho
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A geração Z desafia velhos modelos de liderança, carreiras lineares e relações hierárquicas nas empresas. Nascida em meio à internet e às redes sociais, é a primeira geração 100% digital, impaciente com burocracias e avessa à obediência cega.

“Ela não olha mais de baixo para cima, olha no mesmo plano”, observa o palestrante e pesquisador Dado Schneider, especialista em mudança e cooperação entre gerações, nesta entrevista exclusiva ao A TARDE.

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Criador da marca ‘Claro’ e autor dos livros O mundo mudou… Bem na minha vez! e Desacomodado, Dado será o palestrante da abertura do FDC25 – Fórum do Comércio 2025, no dia 30 de outubro, das 14h às 15h, na Casa do Comércio, com o tema “Futuros Desejáveis: Desenvolvendo o Ambiente de Negócios”.

Para Dado, compreender o perfil das novas gerações não é uma escolha, mas uma questão de sobrevivência institucional, em um cenário em que pessoas de diferentes faixas etárias compartilham os mesmos ambientes de trabalho. Saiba mais na entrevista a zseguir.

Confira a entrevista completa

Por que promover o diálogo entre jovens e veteranos se tornou uma demanda estratégica nas organizações nesse contexto de constante inovação tecnológica?

Quando vi que a internet estava mudando o mundo, eu comecei a estudar a geração Z, desde que ela nasceu. E logo cedo descobri que ela tinha uma forma diferente de se relacionar com a autoridade. Ela não olhava mais de baixo para cima, ela olhava no mesmo plano.

Por que eu descobri isso? Porque uma pedagoga me disse, quando a minha mulher estava grávida do meu primeiro filho, em 2001. Se abaixe e olhe nos olhos da criança para falar com ela. Quando eu ouvi isso, descobri que vinha ao mundo a primeira geração que não olharia para os pais de baixo para cima. Ela passaria a não olhar para os professores e professoras de baixo para cima e consequentemente não olharia para o seu chefe de baixo para cima. Eu uso a palavra chefe, não uso a palavra líder.

Comecei a alertar as empresas já faz mais de 15 anos. Olha, vem aí uma geração que não vai temer a autoridade. Não é que ela não vai respeitar, ela não vai temer a autoridade. Então, a autoridade vai ter que se posicionar de uma outra forma. A autoridade não vai ser mais imposta, vai ser conquistada. É isso que está gerando esse conflito profundo entre as gerações nas organizações.

Neste mundo cada vez mais horizontalizado, com você explicou, como as organizações podem promover esse diálogo efetivo entre as diferentes gerações? Quais aspectos devem priorizar nesse processo?

Quando descobri que isso aconteceria, eu criei um jargão - ‘O mundo mudou… Bem na minha vez!’, que é o nome da minha palestra. Agora, estou com um mantra novo: ‘A gente vai ter que se entender’. Por quê? Porque não é só um lado que vai ter que ceder.

As diferentes gerações vão ter que descobrir um jeito de se integrar, por um simples motivo. Nós não vamos morrer tão cedo e tão fácil. Se hoje temos quatro, cinco gerações no mesmo ambiente de trabalho, daqui a sete, oito, dez anos, teremos seis, sete gerações.

Então, a gente tem que começar agora a diminuir esse afastamento e começar a se aproximar. Porque senão, daqui a dez anos, vira Mad Max. Como? Se desarmando. Primeiro, os jovens de hoje são a primeira geração que tem muito a ensinar aos mais velhos. Quando era jovem, não tinha muito para ensinar aos mais velhos. Mas agora o pessoal jovem tem. Na tecnologia digital, na IA, eles são melhores que nós.

Temos que seduzi-los e despertar neles interesses, como ética, valores, postura. Isso nós podemos ensinar a eles. Só que a gente aborda de uma forma não interessante. E eles não prestam atenção na gente.

Imagem ilustrativa da imagem Dado Schneider explica como a geração Z muda as regras do mundo do trabalho
| Foto: Divulgação

Aí entra o papel da humildade e da abertura para aprender...

Exatamente. Quando a gente era jovem, lá no século XX, a maioria dos chefes não tinha muita consideração. Era assim: você não foi pago para pensar, foi pago para executar. A gente recebeu muita ordem - comando e controle. E a gente tinha que acatar.

Só que quando vem essa nova geração Z - e agora a alfa vai ser pior - lidando de forma diferente com os pais dentro de casa, lidando de forma diferente com os professores na sala de aula... Eles chegam no meio de trabalho e não reconhecem essa autoridade de baixo pra cima, feita por coação. Eles têm que aderir. Eu digo: terminou a autoridade por coação e entrou a autoridade por adesão. Ou eles aderem ao que a gente está propondo, ou não vão fazer. E é isso que deixa muitos dos gestores atuais aturdidos. Às vezes o cara tem 35 anos e já não entende o cara de 25. Imagina o de 60 anos.

Como você disse, convivemos nas organizações com várias gerações: baby boomers, geração X, millenials (ou geração Y) e geração Z. É possível resumir, em poucas palavras, as principais características de cada uma delas?

Os baby boomers lá de 1945 a 1961, 62, e os da geração X, nascidos entre 1962 e 1980, hoje são muito parecidos, porque foram criados do mesmo jeito lá atrás. Eles foram criados num regime militar, com mais disciplina. Fizeram fila para entrar na sala de aula, cantaram o hino. E quando vem a redemocratização, começa a mudar o ensino, e muitas das coisas que eram de educação moral e física - como foram associadas à direita, pararam de ser ensinadas. E não tinha nada a ver com direita ou esquerda. Civismo é civismo. Boas maneiras são boas maneiras. Mas aí, dentro de casa também, isso começou a diminuir.

Então com os millenials, que é a geração Y, ficou menos rígida a educação dentro de casa. Isso também foi para escola. Então, os millenials já mudaram um pouco o comportamento em relação a baby boomers e geração X. Lá no início do século, os meus alunos eram millenials. Eu tinha 40 anos e eles entre 18 e 20. E eu dizia: ó, eu comecei a estudar a geração que começou a suceder vocês. Vocês ainda são muito diferentes de nós. (Porque eles eram jovens e eu já era um homem de 40 anos). Mas quando vocês ficarem com a minha idade, vão ficar mais parecidos conosco do que com a geração que vem aí.

Porque a geração Z é a primeira geração feita de outro material. Porque até os millenials brincaram na rua, jogaram bola no terreno baldio. Só que a geração Z já chegou à borda da internet. São os primeiros nativos digitais. Hoje eu brinco com os millenials nas palestras. Eu digo: sabe, acertei a previsão. Porque vocês são muito mais parecidos com a gente. De virar a noite trabalhando, de trabalhar depois do expediente, de entregar o trabalho que foi demandado. E a geração Z, a 18 horas e 1 minuto, terminou o expediente. Amanhã eu continuo. E eles não estão de todo errado.

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Isso explica o Relatório de Tendências de Gestão de Pessoas 2025, da consultoria Great Place to Work (GPTW), que aponta a Geração Z como a mais desafiadora para a gestão de pessoas?

Sim, concordo 100%. Pelo seguinte: quem não entendeu e fomos nós, os mais experientes. Há uns 12 anos, surgiu uma expressão que agora foi requentada pela IA, que é a seguinte: 70, 80% das profissões do futuro ainda não foram inventadas. Isso não é de agora. Lá atrás, em 2012, eu peguei 100 pré-adolescentes da faixa de 12, 13 anos. Hoje o pré-adolescente tem 9, 10 anos. Mas lá em 2012, eu perguntei para 100 pré-adolescentes de todas as classes sociais de todas as regiões do Brasil. Eu circulo muito e aproveito para fazer pesquisa. E perguntei: você já sabe o que quer fazer no futuro? E eles me disseram, todos: Não. E vários, mais da metade me disse algo semelhante a isso: mas não quero fazer o que meu pai faz, nem o que a minha mãe faz.

O que deduzi? Eu deduzi que viria aí uma geração que não se espelharia nas gerações anteriores na forma de trabalhar. Eu fui mais a fundo, fiz mais pesquisa qualitativa, obtive respostas como: meu pai e minha mãe chegam em casa, estressados, reclamando do trabalho, e não têm tempo para mim. Então, eu não quero trabalhar do jeito que eles trabalham.

E outra coisa, a gente foi induzido, educado, até adestrado, a fazer carreiras nos lugares. Porque tinha uma sequência de conquistas materiais - casa própria, matrimônio, etc. Eles vêm com a perspectiva de viver mais de 110, 120 anos. Como é que vão fazer carreira numa empresa só? Eles vêm com outra coisa. O mundo era muito mais distante. Eles estão prontos para circular pelo mundo.

E a Geração Alfa, que vem depois da Z, você acredita que será ainda mais digital? Como você vê esse grupo, ainda no início?

É muito divertido. Hoje eu estava entrevistando dois da geração Z que já estão no mercado de trabalho. E a leitura é a seguinte. A geração Z é chamada de primeira geração digital. Mas a relação da geração Z com a inteligência artificial é a mesma de baby boomers e millenials com a internet. Porque a internet surgiu e os millenials aderiram porque tinham 12, 13, 14 anos. E os baby boomers e a geração X esperaram para ver o que ia acontecer com a internet. Agora, com a inteligência artificial, está acontecendo isso nas gerações alfa e Z. Quando a Z está eventualmente consultando um ChatGPT, a alfa estará mergulhada em IA.

Estamos vendo uma similaridade de reações de gerações com outro movimento brutal de sociedade que um foi a internet lá atrás e agora é a IA. E tem mais uma coisa da alfa, que me preocupa bastante. A geração Z é um pouco frágil emocionalmente falando. Ela acha que o chefe é tóxico, que muita coisa que é assédio moral, bullying nem pensar. E as nossas gerações foram forjadas a bullying. Não estou dizendo que é melhor ou pior. Só constatando.

Só que o que eu estou vendo hoje, e eu estou pesquisando os pais da geração alfa e agora da década está surgindo, estou vendo o seguinte: por variadas razões e teorias de psicologia atuais e eu não estou discriminando. Estou curioso para entender por que é assim. Os pais não confrontam os filhos, não cerceiam em hipótese alguma, e não dão limites na maioria dos casos. É muito raro que os pais deem limites para geração alfa.

O que me preocupa é uma criança sem limite que já é agressiva com os pais. Eu estou assistindo criança bater em pai e mãe em público. Estou vendo criança e pré-adolescente bater em professor na sala de aula. E isso em todas as classes sociais. E eu estou começando a dizer: olha, se prepare, porque vai ter geração alfa frustrada no ambiente de trabalho, sendo repreendida, e vai arremessar o notebook na cara do chefe. Vai ser mais violenta que a Z quando surgiu. A Z não era violenta quando surgiu. E a alfa é.

Eu já ouvi você comentar que uma geração acaba sendo oposta à outra. Você falou sobre os baby boomers, que fizeram parte da geração hippie, e depois a geração X, que veio depois, foi mais comportada. Você acha que esse mesmo padrão se aplica também às novas gerações?

Sim, com certeza. A gente pode fazer até um paralelo. A geração Z está para os baby boomers, como a alfa estará para a X. Porque a X, não vou dizer que ela foi careta, mas foi menos libertária e menos revolucionária que a hippie. E a Z tem umas coisas da geração hippie - de estética, de bandeiras sociais. A geração X virou a geração yuppie. Enquanto a baby boomer foi hippie, a X foi yuppie. A Z é a geração da sustentabilidade, do planeta, e acho que a alfa vem mais conservadora. Acho, não. Ela vem mais conservadora, nos costumes e nas posições até políticas. E vem mais aguerrida. Estou fazendo uma previsão aqui: muitos da geração alfa, e principalmente as meninas da alfa, serão as chefes no futuro de muita gente da geração Z.

Estou vendo um movimento nas escolas de fora, que estão ficando mais analógicas. Aqui a gente teve a proibição de celulares em sala de aula. Como você vê essa questão? As escolas estão preparadas para lidar com a geração Z e, em breve, com a geração Alfa?

Não vou falar da questão mundial, mas do Brasil. O Brasil é pródigo em permitir tudo, e abruptamente passar a proibir tudo. Isso é a cara do Brasil. O grande problema não está na sala de aula, está dentro de casa. Porque eu fico observando os adultos. Eles não olham para as crianças, eles estão vidrados no celular.

As crianças ficam insuportáveis em volta deles, gritando mamãe, papai, presta atenção. E quem está à volta deles, em sala de médico, em restaurante, em parada de ônibus, não suporta aquelas crianças berrando porque os pais não olham para elas. O problema não está na sala de aula. Estão nos pais que não largam o celular.

A lei não deveria proibir celular na sala de aula. A lei deveria proibir olhar celular na frente de crianças. Eu adoraria que surgisse essa lei. Para desmoralizar o uso do celular, como foi desmoralizado o uso do cigarro. O cigarro demorou 40, 50 anos para sair de símbolo de status para desmoralização. A pessoa é perseguida quando ela fuma em público. Eu queria que os adultos fossem desestimulados e proibidos de usar o celular na frente de crianças. Porque a criança apenas repete o uso do celular. Não é proibindo na sala de aula, tem que proibir em casa.

Você sabia que já tem criança de 4, 5 anos desenhando os pais. Sabe quando a criança desenha a família? O rosto é uma bolinha, os braços e pernas palitinhos. Você sabia que já tem criança desenhando os pais com aquela bolinha como cabeça e palitinho iguais, como braços e pernas, mas com uma caixa-preta na altura dos olhos. É assustador.

A inteligência artificial tem um lado negativo, como a internet, que pode deixar as pessoas mais preguiçosas até para pensar. Como você vê os efeitos disso nessas novas gerações?

No momento que a gente parou de observar e contemplar, a gente está mergulhado na tela o tempo todo, se perde a absorção de informação, conteúdo e repertório que o ser humano tinha ao natural, que é o observar. Não surpreende que o índice de QI vem reduzindo de geração para geração. Por quê? Porque é menos tempo de leitura, de livro, menos tempo de escrita a mão.

É que os lógicos agora estão começando a resgatar no ensino. Eu vi um vídeo de um pesquisador, ele diz que quando a gente escreve a mão, quando a gente faz a letra B, por exemplo, que faz uma bolinha e vai lá pra cima, ativa uma área do cérebro. Quando a gente faz a letra C ou G, que vai para baixo, é outra área do cérebro. Quando a gente tecla, é a mesma área do cérebro que é ativada. No momento que a gente passa a teclar mais e escrever menos, vai desenvolvendo menos áreas do cérebro. É óbvio que vai haver um decréscimo de profundidade, questionamento, discussão, escrita.

A gente está voltando ao início da humanidade que é praticamente só comunicação oral. A gente faz áudios ao invés de escrever no WhatsApp. A gente faz áudios e a IA transcreve, porque a gente não quer escrever. Mas a IA transcreve do jeito que ela ouve, então não vem vírgula, não vem ponto. Isso não é um velho rabugento falando, é uma constatação. É surpreendente que a capacidade de pensar, produzir e criar, principalmente criar, está diminuindo Mas esse é o mundo novo, então a gente vai ter que se acostumar. É uma outra era.

Voltando às organizações, você acha que elas estão preparadas para lidar com a possível perda de cognição dos funcionários?

Tem gente que está ligada e atenta e tem que não. Mas tem uma coisa que é certa: toda a educação e todo o ensino que não for dado em casa e na escola, a empresa vai ter que assumir. Se ela quiser ter um profissional educado, que se comunique bem, que seja empático, que pense no coletivo, essas coisas não vem sendo nem ensinadas nem em forma de educação dentro de casa.

Então, a empresa, que já tem que pagar tanto imposto de fazer tantas coisas, vai ter que arcar com essa educação formal que não está vindo de berço, não está vindo da escola. É mais um fardo para a empresa. Algumas já estão fazendo isso e outras nem se deram conta. Não estou falando só de empresa grande. Uma coisa que me preocupa: vai chegar uma hora que muitos vão parar de contratar jovens. Porque eles vêm com lacunas graves de formação.

Falando de forma econômica, é mais barato ensinar o mundo digital e a inteligência artificial para uma pessoa mais velha, que é educada, que leu livros, que estudou numa escola que puxou a orelha quando ele ia mal e o cara repetia o ano. Vai ser mais fácil ensinar IA para essa pessoa do que ensinar todas essas coisas para alguém que é fera em IA

Para concluir, chegando à reta final, se você tivesse que dar um conselho aos pais dessas novas gerações para preparar melhor seus filhos, o que diria?

Larga o celular, olha para a criança, conta histórias para ela, faz ela observar o mundo, leva ela para a praça. E, principalmente, lê livros para ela. Criança que teve pais lendo livros para ela, passou a ler livros. E o jovem que lê livro é diferenciado em termos de escrita, postura. Começa com os pais. Larga o celular, dá aquele tempo de qualidade para a criança, brinca com ela, brinca, brinca de faz de conta, imagina coisas, faz ela despertar a imaginação, conta histórias e lê histórias para ela. É isso. Começa do basicão. Lá atrás.

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