PATRIMÔNIO
Imóveis perdem até 50% do valor de mercado por detalhe importante
Falta de regulamentação compromete a valorização do bem, além de impactar o desenvolvimento urbano
Por Joana Lopes

Dos 60 milhões de domicílios urbanos do Brasil, 30 milhões não possuem escritura, ou seja, metade estão irregulares, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Regional (MIDR).
Além de impactar diretamente o desenvolvimento urbano, contribuindo para a expansão desorganizada de cidades, esse cenário compromete a valorização patrimonial dos bens.
Um imóvel irregular pode perder entre 35% e 50% do seu valor de mercado, segundo levantamento realizado pela Associação de Notários e Registradores do Brasil.
Especialistas explicam que a escritura de compra e venda pode até ser considerada válida entre as partes, mas não confere ao comprador a propriedade legal do imóvel.
O que estabelece o Código Civil
O Código Civil estabelece que a transferência da propriedade só ocorre com a inscrição do título no Cartório de Registro de Imóveis, por meio da certidão de matrícula, que tem validade de 30 dias para transações imobiliárias.
Esse documento inclui a identificação da propriedade, os dados dos donos, histórico de registros (compra e venda, hipoteca, financiamento etc) e informações sobre quaisquer ônus, como medidas cautelares ou ações judiciais que pesem sobre o imóvel.
“Antes de efetuar uma compra, é importante verificar se o imóvel descrito na certidão de matrícula corresponde à realidade. Também é preciso conferir se todas as informações estão atualizadas. Às vezes, algo simples como um erro no estado civil do vendedor pode atrasar a transferência da propriedade para o comprador”, orienta Wendell Leonardo, advogado especialista em Direito Imobiliário.
Leia Também:
Ele também recomenda averiguar a certidão fiscal do imóvel, como o IPTU, no caso de propriedades urbanas, e o ITR (Imposto sobre a Propriedade Rural). “Se o imóvel faz parte de um condomínio, vale conferir ainda a declaração de débitos condominiais”, acrescenta.
Leonardo lembra que, principalmente em cidades menores, é comum que as pessoas comprem um terreno e, depois de algum tempo, realizem uma construção nele, sem atualizar a certidão de matrícula com a inclusão dessa propriedade. Esse é mais um cenário que gera insegurança jurídica. Tem gente que compra um terreno, constrói e não regulariza a construção.
“Um imóvel irregular não pode ser usado como garantia em empréstimos ou financiamentos, tanto para aquisição quanto para reformas. Isso limita as possibilidades de investimento e impede o acesso a crédito imobiliário. Esse bem tampouco pode ser legalmente doado ou deixado como herança de forma automática, o que pode gerar conflitos familiares ou entraves em inventários”, explica.
Dívidas e tributos
O advogado ressalta ainda que, legalmente, as dívidas e os tributos vinculados ao imóvel continuam sendo responsabilidade de quem consta na matrícula, ou seja, do antigo dono., mas, na prática, porém, quem passa a morar no local geralmente assume essas despesas, como IPTU e ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis).
No Brasil, o usucapião é um instrumento amparado pela legislação, que permite adquirir a titularidade de um imóvel após determinado período de ocupação, que varia entre cinco e 15 anos. Para esse reconhecimento, a ocupação deve ser contínua, sem oposição de terceiros, conhecida na vizinhança e feita com intenção de ser dono, não apenas como inquilino ou morador provisório.
Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil, em 2015, o processo de usucapião deixou de ser exclusivamente judicial. Agora, é possível fazer a regularização diretamente em cartório, sem precisar abrir uma ação na Justiça, o que representa um avanço para quem busca agilidade e menos burocracia. “Também existe a alternativa de adjudicação compulsória extrajudicial, um procedimento cabível quando o comprador quitou o imóvel, mas não possui escritura definitiva por inércia do vendedor”, explica Giselle Farinhas, advogada especialista em Direito Imobiliário.
Segundo ela, para realizar a regularização extrajudicial, é preciso reunir documentos como a planta do imóvel e memorial descritivo, elaborados por profissional habilitado e assinados pelos vizinhos; provas do tempo de posse, como contas antigas, declarações de testemunhas ou contratos informais; certidões que comprovem a ausência de disputas judiciais sobre a propriedade; e a declaração de posse, lavrada em cartório com firma reconhecida.
O processo deve ser acompanhado por um advogado, e o pedido é analisado pelo Cartório de Registro de Imóveis competente. O Ministério Público também será notificado. Se não houver contestações, o cartório emite o registro definitivo, garantindo ao requerente a propriedade legal do bem. “É uma solução acessível para quem ocupa imóveis de forma pacífica e contínua, mas nunca teve os meios ou a orientação para formalizar a propriedade”, conclui Farinhas.
Compartilhe essa notícia com seus amigos
Siga nossas redes