POLÍTICA
Aniversariante do dia, Gilberto Gil já quis ser prefeito de Salvador
Cantor chegou a ser apoiado por Mário Kértesz, mas teve planos frustrados por governador
Por Lula Bonfim

Gilberto Passos Gil Moreira completa 83 anos de idade nesta quinta-feira, 26. Além do histórico internacionalmente reconhecido como cantor e compositor, ele também ficou marcado por sua passagem pela política: entre 2003 e 2008, o artista foi ministro da Cultura, durante a maior parte dos dois primeiros mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Mas isso não é tudo. Muito antes disso, devido à forma e ao conteúdo de sua arte, Gil foi preso pela ditadura militar em 1968, além de exilado entre 1969 e 1972, ao lado de seu amigo, o também cantor e compositor Caetano Veloso. Quando voltou ao Brasil, enfrentou a censura algumas vezes, com destaque para a música “Cálice”, uma parceria com o carioca Chico Buarque de Hollanda.
Na reta final do processo de redemocratização do Brasil, o grupo de Antônio Carlos Magalhães (PFL), ex-aliado da ditadura militar, foi derrotado para a prefeitura de Salvador em 1985, com a eleição de Mário Kertész (PMDB), e para o governo da Bahia em 1986, com a vitória de Waldir Pires (PMDB).
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O clima de abertura fez com que acendesse em Gilberto Gil a vontade de participar diretamente da política partidária. O cantor, nascido em Salvador, morava no Rio de Janeiro e decidiu voltar para a capital baiana em 1987, com o plano de, no ano seguinte, se lançar candidato a prefeito de sua cidade natal.
Secretário de Cultura
Apoiado pelo então prefeito Mário Kertész em sua empreitada, Gilberto Gil foi nomeado presidente da Fundação Gregório de Mattos (FGM), um posto equivalente, na época, ao de secretário municipal de Cultura. A ideia era aproximar o artista do meio político soteropolitano, viabilizando assim sua candidatura.
À frente da FGM, Gil apostou na formação de uma cidadania cultural afro-baiana, avançando na regularização fundiária de terreiros de candomblé em Salvador e criando novos espaços, como a Casa do Benin, no Pelourinho, onde começaram a ser expostas peças que foram doadas pelo país africano.

A atuação de Gil no comando da pasta de Cultura aumentou a convicção de Kertész acerca de sua sucessão na prefeitura.
"Meu candidato preferido, que realmente tinha grande identidade ideológica, de pensamentos, da visão da cidade, era Gilberto Gil, que foi meu secretário da Cultura. Junto dele, tinha toda uma equipe: Eliana Kertész, Roberto Pinho, Antonio Risério, o grande Lelé, João Santana, várias outras pessoas, que construíram uma ideologia sobre a cidade, do ponto de vista de um renascimento cultural e, ao mesmo tempo, obras estruturantes nas áreas pobres", contou Mário, em publicação nas redes sociais.
“Eu Quero Gil”
A campanha “Eu Quero Gil” foi às ruas com força. A pré-candidatura de Gilberto Gil foi encampada não apenas por Kertész, mas também por grande parte dos intelectuais da cidade e pela ala mais à esquerda do PMDB.
Mas nem tudo era festa diante dessa movimentação. O PMDB reunia, ainda naquele momento, grande parte da oposição à antiga ditadura militar, unindo socialistas, sociais-democratas, liberais e conservadores. E esses dois últimos não eram simpáticos à possível candidatura de Gil, que não se vestia formalmente e tinha a defesa do meio-ambiente como uma de suas principais pautas.
“Lembro que fui conversar com Waldir [Pires] e ele me disse: ‘A sua candidatura vai implodir o PMDB’”, contou Gilberto Gil, em entrevista à Folha de S. Paulo.

Porém o próprio governador, segundo relata Mário Kertész, não era simpático ao nome do cantor para prefeito.
Eu fui conversar com Waldir Pires, tentando um candidato em comum acordo. Ele não aceitou. E mais: ele mandou Dr. Luiz Leal, médico, presidente do PMDB, uma grande figura humana, ir em minha casa dizer: 'Mário, você acha que Salvador está preparada para ter um prefeito que usa brinco?' [Sobre] Gilberto Gil.
"Eu não sei se no fundo é 'usa brinco e é negro'. Não sei. Mas pode ser. E aí foi vetado", concluiu Kertész.
Pode, Waldir?
O veto de Waldir Pires, principal líder do PMDB baiano naquele momento, gerou indignação em Gilberto Gil, que reagiu com força. O cantor lançou sua candidatura a vereador ao vivo na Globo, no programa do humorista Chico Anysio.
No mesmo programa, em rede nacional, ele também lançou a música “Pode, Waldir”, que expôs a ingerência do governador na sua pré-candidatura, ironizando os argumentos utilizados para barrar o seu sonho de ser prefeito.
Pra prefeito, não / Pra prefeito, não / E pra vereador / Pode, Waldir?
O candidato escolhido por Waldir, o radialista Fernando José (PMDB), se tornou prefeito de Salvador, eleito com 45,81% dos votos válidos, vencendo com folga os candidatos de PSDB, PFL e PT.
Gilberto Gil também foi eleito, como o vereador mais votado da cidade. O cantor obteve 11.111 votos, com mais de 2 mil votos de vantagem para o segundo colocado.
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