VIOLÊNCIA DIÁRIA
Roubos, furtos, morte e sequestro: crimes que marcam a Avenida ACM
População diz que bandidos não têm hora para agir
Por Andrêzza Moura

A morte do técnico de informática Luís Eduardo Santos da Silva, de 38 anos, no último dia 6 de maio, no ponto de ônibus da passarela da Estação de Metrô Detran, na Avenida Antônio Carlos Magalhães, em Salvador, durante uma tentativa de assalto, traz à tona um problema persistente que afeta, há anos, a população que transita diariamente pela região: a insegurança.
Trabalhadores da área e pessoas que frequentam cotidianamente a extensa avenida, localizada no miolo da capital baiana e que margeia os bairros de Brotas, Itaigara, Pituba e Caminho das Árvores -'região do Iguatemi'-, relatam que o local é palco de inúmeras situações de violência e o caso de Luiz Eduardo, infelizmente, foi apenas mais um registrado.
"No dia em que o rapaz [Luiz] foi morto eu não estava aqui, não vim trabalhar. Mas, já presenciei um cara esfaqueando outro neste exato local, na frente de todo mundo. Ele [suspeito] já veio seguindo [vítima] e, quando parou, deu várias facadas. Foi a cena mais triste que já vi na minha vida", relembrou uma comerciante, que trabalha no ponto da Estação do Metrô Detran há mais de um ano.
Ainda segundo a comerciante, furtos na localidade são constantes. "Roubos aqui são todos os dias. É um trio. Às vezes, são dois homens e uma mulher ou duas mulheres e um homem. Eles aproveitam a 'muvuca' do pessoal entrando no ônibus para roubar", afirmou a mulher, sob anonimato.

Também com medo da exposição, uma professora de 47 anos que pega ônibus no ponto do 'Detran' há mais de um ano só aceitou conversar com o Portal A TARDE sob a condição de não se identificar. Ela revelou que tem receio de ficar no local e só o faz por necessidade. Geralmente, precisa esperar cerca de uma hora até o embarque.
"Graças a Deus, nunca fui vítima. Mas, já ouvi falar muitas coisas. No dia da situação com o rapaz [Luiz Eduardo] peguei ônibus aqui. Quando cheguei, ele já estava no chão aguardando atendimento médico. Agora, está tudo claro, iluminado, mas não era assim", contou a professora, lembrando que antes da morte do técnico de informática, o ponto era totalmente escuro.
Poucos metros depois, em uma parada próximo ao prédio da Central de Flagrantes da Polícia Civil, as reclamações são as mesmas. O empresário Ronald Araújo tem uma barraquinha na avenida, há quase 9 anos, e afirma que roubos na localidade já faz parte da rotina de quem trabalha e frequenta a área. Segundo ele, as coisas pioraram desde que a delegacia foi fechada para reforma.

"Oxe! Aqui é assalto todo os dias. Não tem horário, não. É de manhã, de tarde e de noite. Aqui tem de tudo, até sequestro. No dia que mataram o rapaz [Luís Eduardo], meia hora antes, levaram a moto de um cara. Ele veio correndo para cá gritando: 'levaram minha moto, levaram minha moto'. Já era ruim, mas de uns anos para cá, piorou. Já vai fazer três anos que essa delegacia está fechada para reforma", relembrou o rapaz.
"Já fui furtado aqui. Ia entrar no ônibus, o cara fez que ia entrar também e pegou meu celular. Só percebi quando cheguei em casa. Tem uns quatro meses isso, estava saindo da igreja [Universal]", disse o auxiliar de serviços gerais Valdemir dos Santos Batista.
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Outros pontos críticos
A ACM é separada por um canteiro central, onde estão localizadas as Estações do BRT. O lado direito, para quem sai da Avenida Bonocô, no sentido Rio Vermelho, integra o bairro de Brotas. Já o lado esquerdo, para quem sai do Rio Vermelho, no sentido Iguatemi, é composto pelos bairros Itaigara, Pituba e Caminho das Árvores - 'região do Iguatemi'.
Nas noites da quinta-feira, 22, e na segunda-feira, 26, a reportagem do Portal A TARDE fez rondas nos dois sentidos e o que encontrou, além muitas reclamações e medo, foram alguns pontos sem iluminação, inclusive, alguns sem utilização, exatamente por não oferecerem segurança aos passageiros. Também foi possível verificar que algumas estruturas ficam iluminadas pelas luzes de estabelecimentos comerciais.

Em um ponto em frente a um hospital particular encontramos a auxiliar de farmácia Patrícia Souza, 52. Um pouco recuada e separada dos demais passageiros, ela aguardava o ônibus. A a posição estratégica, resguardada atrás das estruturas da parada pouco iluminada era para evitar ser vítima de assaltos. "Fico ligada. Aqui tem muitos assaltos. Fico aqui fora do ponto, um pouco mais distante", contou ela.
Entre as pessoas que não se sentem seguras em esperar o transporte público em um ponto próximo a uma loja de móveis, em frente a Estação BRT Cidadela, está a empregada doméstica Ana Paula Pratt. A encontramos caminhado em passos largos na ACM e resolvemos acompanhá-la. Há três anos, a mulher diz preferir caminhar do Alto do Itaigara, onde trabalha, até a parada que fica em frente ao Shopping da Bahia, para pegar o ônibus, por medo de ser assaltada.
"Moro no Conjunto Pirajá, pego [ônibus] Estação Pirajá. Se eu perder ele, tenho que esperar uma hora ou mais para vir outro. Não fico naquele ponto [loja de móveis] porque é muito escuro, não fica ninguém porque tem muito assalto. Prefiro andar isso tudo do que pegar BRT e Metrô. Se pegar eles, chego em casa muito tarde, tenho que pegar um BRT, dois metrôs e ainda ônibus", explicou a trabalhadora, o motivo pelo qual opta por caminhar uma longa distância retornar para casa.

Outro cenário tem preocupado quem precisa passar pela ACM de carro: a constante presença de pessoas em situação de rua, no canteiro central da avenida, nas proximidades de uma famosa hamburgueria e da localidade Polêmica, no bairro Brotas. Durante a 'ronda', na noite da segunda-feira, 26, flagramos um casal fazendo uso de entorpecentes. Um grupo estava mais adiante. É neste ponto, que, segundo denúncias, estão ocorrendo arrastões e motoristas de veículos estão sendo roubados.
"Agora, está tudo tranquilo. Mas, cedo, no final da tarde, quando está tudo engarrafado, tudo parado, eles aproveitam para roubar os motoristas. Fazem arrastão. Você precisa vir mais cedo para ver, é uma loucura", sugeriu um homem, que trabalha na região.
A ´patrulha' terminou no ponto em frente ao Shopping da Bahia, o mesmo que Ana Paula se sente mais segura. Era por volta das 20h30, quando paramos por lá e encontramos o repositor de frios José Carlos Carvalho Soares, 31. Frequentador assíduo do ponto, diferentemente da empregada doméstica, ele não vê segurança em ficar muito tempo no local.

"Já ouvi muitas coisas que aconteceram aqui, de roubos, de levarem bolsas de mulheres. Mas, acho que esse ponto é o mais tranquilo da região. Graças a Deus, comigo nunca aconteceu nada", festejou o rapaz, revelando que, pelo menos, três vezes na semana, pega ônibus na parada.
Iluminação e ônibus
Com relação a falta de iluminação e demora dos ônibus, o Portal A TARDE procurou a Diretoria de Serviços de Iluminação Pública (DSIP) e Secretaria Municipal de Mobilidade (Semob), órgãos vinculados à Prefeitura de Salvador. Tanto a DSIP, quanto a Semob se pronunciaram por meio de nota.
Conforme o DSIP, todos os pontos de ônibus da ACM foram beneficiados pelo programa Meu Ponto Iluminado (MPI) e, portanto, não tem nenhum sem iluminação.
"O Meu Ponto Iluminado, é um programa da Prefeitura de Salvador, através da Diretoria de Serviços de Iluminação Pública (DSIP), para implantar braços e luminárias LED em pontos de ônibus. O objetivo é melhorar a segurança, dar mais conforto ao usuário, garantir economia e melhorias estéticas.

Até maio de 2025, 370 pontos de ônibus da cidade já foram modernizados e 170 estão em execução. Sobre a falta de iluminação em pontos da Avenida ACM, todos já estão modernizados. A DSIP enviará uma equipe ao local para verificar a situação e tomar as devidas providências", diz a nota.
Também por meio da assessoria de comunicação, a Semob declarou que Salvador tem um serviço integrado de transporte que facilita a vida da população.
"A Semob informa que toda a cidade está conectada através da integração entre os modais – ônibus, metrô e BRT –, onde o usuário paga apenas uma tarifa no período de 2h através dos cartões de integração. A pasta ressalta que realiza constantemente pesquisas nas linhas de ônibus para garantir que o atendimento seja realizado de forma adequada, e recomenda que os usuários optem por utilizar o metrô ao se deslocarem entre as estações de transbordo", informou a pasta.
Policiamento e segurança
Na noite da quinta-feira, 22, a reportagem só registrou a presença de uma única viatura ao longo de toda extensão da Avenida Antônio Carlos Magalhães. O veículo estava posicionado a poucos metros do local onde o técnico de informática Luís Eduardo Santos da Silva, 38, foi morto a tiros, no último dia 6 de maio. Ele aguardava o transporte público, no ponto de ônibus da passarela da estação de Metrô Detran, quando foi atingido pelos tiros, durante uma tentativa de roubo.
Já na segunda-feira, 26, duas viaturas foram vistas em frente ao Shopping da Bahia. Nos demais pontos da ACM não foi notado nenhum policiamento ostensivo. A major Poliana Fernandes, comandante da 35ª CIPM/ Caminho das Árvores, afirmou que o trabalho de segurança na região é realizado diuturnamente e que viaturas e motopatrulhas são posicionadas em pontos estratégicos.

"Temos uma operação a noite, a partir das 16h, que é a Operação Catraca. São policiais que ficam nas motos fazendo abordagens nos pontos de ônibus, e, às vezes, eles ficam ali parados para dar aquela sensação de segurança, que é a preservação da ordem públic. Se perceberem algum elemento suspeito, eles abordam. Então, nós temos locais que a gente intensifica o policiamento à medida que vai acontecendo alguma coisa. À medida que a gente vai vendo pessoas reclamarem que teve alguma situação, nós colocamos direção no policiamento", explicou a comandante.
Com relação as pessoas em situação de rua que ficam no canteiro central da avenida, a major revelou não ter muito o que fazer, a não ser monitorá-las e fazer abordagens. Já que muitas vezes, elas estão apenas fazendo uso de entorpecentes.
Nós fazemos a abordagem e quando a gente percebe que ele está com alguma coisa, se for substância, a gente conduz à delegacia. Mas, a depender da quantidade, nem sempre é aceito na delegacia. Porque se o cara for só usuário, a delegacia não aceita. E quando a gente encontra eles com algum elemento perfuro cortante, a gente recolhe para evitar que eles pratiquem com algum assalto. Mas, se eles não estiverem fazendo nenhuma outra coisa, ou seja, cometendo crime, a gente não tem como simplesmente tirás-lo dali", afirmou Fernandes.

Na noite da terça-feira, 27, a major Poliana, o coronel Saulo Roberto, comandante de Policiamento Regional Atlântico (CPRC-A), o major Zaqueu Vinagre, comandante da 13ª CIPM/ Amaralina, e o major Danilo Mascarenhas, da 12ª CIPM/ Rio Vermelho, se reuniram com lideranças e comerciantes da localidade para discutir estratégias para a segurança.
A reportagem tentou falar com o comando da 26ª CIPM/ Brotas, mas não obteve sucesso. O Departamento de Comunicação Social (DCS) da Polícia Militar também foi contatada por meio de e-mail, mas, até a publicação dessa matéria, não deu retorno.
Suspeitos presos
Na última quarta-feira, 28, e na quinta-feira, 29, investigadores do Departamento Especializado de Investigações Criminais (Deic), por meio da Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos (DRFR), prenderam os dois homens suspeitos de matar Luís Eduardo.
O primeiro, um homem, de 33 anos, foi localizado no Complexo do Nordeste de Amaralina. Já o segundo estava no bairro de Águas Claras, quando foi detido. Além de envolvimento no assassinato do técnico de informática, a dupla também é investigada por alguns roubos em Itapuã e por subtrair uma motocicleta em Brotas, no início do mês de maio.
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