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Atividades do dia-a-dia estão cada vez mais imersas no Metaverso

Brasileiros demonstram otimismo com novas tecnologias e diversos setores fazem uso da realidade virtual em seus cotidianos

Publicado sexta-feira, 22 de julho de 2022 às 06:00 h | Autor: Daniel Brito
Metaverso promove a interação do usuário com a realidade virtual e a realidade aumentada
Metaverso promove a interação do usuário com a realidade virtual e a realidade aumentada -

Há nove meses, o presidente do Facebook, Mark Zuckerberg, surpreendeu muita gente ao redor do mundo no momento de anunciar que a empresa que capitaneia uma das principais redes sociais do mundo estava mudando de nome. Da denominação tradicional, a companhia decidiu se reinventar e passou a se chamar “Meta”. 

A mudança ocorreu para marcar uma nova era, cujo foco seria o chamado metaverso, ou seja, um mundo virtual no qual as pessoas podem utilizar tecnologias como a realidade virtual e a realidade aumentada para interagir.

O nome “metaverso” foi criado em 1992, pelo escritor estadunidense Neal Stephenson, no romance intitulado Snow Crash. O termo designava uma espécie de universo virtual do futuro. Na obra, esse universo é um ambiente onde as pessoas podem acessá-lo por meio de óculos especiais, próprios para esse fim.

E se, antes, esse conceito era aplicado apenas às narrativas de ficção científica, especialmente filmes, hoje ele está cada vez mais inserido no mundo real. E isso não se restringe apenas às redes sociais; ao contrário, diversos setores têm se valido dele para aplicá-lo nas atividades cotidianas, inclusive aqui na Bahia.

Pesquisas demonstram otimismo

Para além do cenário local, levantamentos dão indícios de que essa tendência vem crescendo cada vez mais, nacional e globalmente. Um estudo realizado pelo instituto Ipsos, que teve seu resultado divulgado em junho, trouxe dados reveladores sobre o quanto os brasileiros têm demonstrado otimismo com o metaverso, mais até do que outros países ao redor do mundo.

Segundo a pesquisa “Como as pessoas veem o metaverso e a realidade aumentada”, realizada em 29 países de todos os continentes, 60% da população do Brasil enxerga como positivas as tecnologias de realidade aumentada e virtual. E, apesar de ter ficado atrás de países como a China, Índia e Peru, onde essa percepção foi de 78%, 75% e 74%, respectivamente, o resultado brasileiro foi superior à média global, de 50%.

Outro dado importante é de que cerca de 67% dos brasileiros concordam que, nos próximos 10 anos, o metaverso deve promover grandes impactos em diversas áreas, como entretenimento, trabalho, aprendizagem virtual e recursos de saúde. Em outros países, essa média foi de 58%.

A população do Brasil também se revelou bem informada sobre o metaverso, segundo o levantamento do Ipsos. Do total, 63% dos entrevistados da pesquisa afirmaram estar muito ou um pouco ambientados com o assunto.

Em nível global, outra pesquisa, realizada pela empresa de tecnologia Gartner e divulgada em fevereiro deste ano, mostrou que, até 2026, 25% das pessoas vão passar pelo menos uma hora por dia no metaverso para trabalhar, fazer compras, estudar, socializar e se entreter.

Educação e indústria

Em março, o Centro Universitário Senai Cimatec, referência em educação nas áreas de ciência e tecnologia no estado, ficou conhecido por ter realizado a primeira aula dentro do metaverso, utilizando um ambiente virtual e imersivo. 

Intitulada “Desenvolvimento de produto no metaverso: reflexões para a indústria automotiva”, a atividade, conduzida pelos professores Ingrid Winkler, idealizadora do projeto, e Marcus Mendes, possibilitou a participação dos alunos do grupo de Pesquisa Realidade Virtual e Realidade Aumentada para inovação na Indústria, Saúde e Educação. 

No entanto, a aula realizada em março não foi exatamente a estreia da imersão do grupo de pesquisa do Cimatec dentro do metaverso, muito menos uma atividade isolada. Ao contrário: pelo menos desde 2017, docentes e alunos investigam realidade virtual e realidade aumentada aplicada à inovação na indústria, segundo Ingrid. Portanto, quando o Facebook anunciou a mudança de nome para Meta, ao menos para eles isso não foi nenhuma surpresa, já que a investigação dava esses sinais.

“Eu costumo falar que existem metaversos, no plural, porque quando se fala em Metaverso, com inicial maiúscula, fica parecendo que a referência é o da Meta, que era o Facebook antes de mudar de nome. Quando falamos em metaversos, são as várias plataformas que existem hoje e estão disputando espaços em vários nichos diferentes”, pontua.

A coordenadora ressalta, entretanto, que a mudança de nome da empresa que gere a rede social tornou mais natural a realização de atividades dentro dessas plataformas. Depois da aula de março, outras tarefas, encontros e workshops têm sido feitos com o objetivo de experimentar esses ambientes para entender o que eles podem trazer de inovação e, além disso, preparar os futuros profissionais que passam pela instituição.

“Estamos falando de pesquisadores de mestrado e doutorado que estão na indústria, desenvolvem atividades nesses locais e utilizam no dia-a-dia a realidade virtual. A indústria automotiva, por exemplo, utiliza essas plataformas para fazer prototipagem, testar produtos e suas usabilidades na realidade virtual”, acrescenta.

No universo da leitura

Quem também se jogou no chamado metaverso foi o Goethe-Institut Salvador-Bahia, regional soteropolitana de uma instituição alemã sem fins lucrativos que tem como objetivo divulgar e promover a língua do país ao redor do mundo. Presente na cidade desde 1962, a filial localizada no Corredor da Vitória estreou, no final de 2021, a exposição Temporão #Metaverso, onde foram mostradas obras de 10 artistas nacionais e internacionais em um universo de realidade virtual.

Goethe-Institut lançou espaço interativo e virtual da biblioteca
Goethe-Institut lançou espaço interativo e virtual da biblioteca |  Foto: Olga Leiria | Ag. A TARDE
  

No espaço virtual, o instituto ofereceu não apenas a oportunidade de visitar as obras da exposição, mas reproduziu também a casa amarela da entidade, que conta com quatro espaços: galerias, pátio interno, teatro e biblioteca. A exposição, porém, representou apenas o início do projeto Metaverso. Em abril deste ano, foi a vez do lançamento do espaço interativo e virtual da biblioteca.

Para utilizar as tecnologias, foram várias as inspirações, entre elas bibliotecas dos países europeus que, durante a pandemia, utilizaram o metaverso para manter suas exposições em um período onde o isolamento social foi imposto e, consequentemente, atividades não essenciais, incluindo visitas, foram suspensas.

“Já temos uma biblioteca digital, onde é possível ler jornais e revistas da Alemanha, assistir filmes, ter acesso a audiobooks, jogos, entre outros. Então trabalhamos no sentido de criar um espaço na biblioteca onde é possível acessar todos esses universos”, conta o coordenador de programação cultural e idealizador do projeto #Metaverso no Goethe-Institut em Salvador, Leonel Henckes.

Henckes, no entanto, cita que limitações de ordem técnica, especialmente para possíveis novos usuários que possam acessar o espaço de casa, fizeram com que nesse primeiro momento pelo menos recursos mais avançados não fossem utilizados. “Se colocar muito conteúdo lá dentro, fica pesado. Então o usuário precisa ter um computador muito poderoso, desses do tipo gamer, por exemplo, para conseguir navegar de uma forma aceitável. Ou ter um óculos, coisa que nem todo mundo tem”, pontua. 

A biblioteca virtual pode ser acessada tanto de casa quanto presencialmente, no próprio instituto, onde os visitantes têm a oportunidade de utilizar um óculos para ter uma experiência mais imersiva e realista. Pelo computador, os usuários podem acessar por meio deste link

Aplicação no dia-a-dia

Um dos exemplos de como o metaverso tem mudado a realidade, segundo a professora Ingrid Winkler, está na área de usabilidade e prototipagem, fazendo com que esses processos na área da indústria sejam executados de forma mais completa e detalhada.

“É possível olhar para o protótipo, o componente, a peça ou o equipamento, em 3D, mas agora em um ambiente imersivo, onde é possível analisar em vários ângulos, trazer ele mais para perto, ampliar o tamanho. Dá para ter um carro em uma escala 1:1, abrir a porta de uma geladeira virtualmente”, explica. 

“É um meio do caminho entre o virtual, que ficava na tela plana do desktop, e o físico, que existia em um protótipo de outro material, mas agora ele existe nesse ambiente imersivo e é possível fazer coisas que, antes, não eram possíveis nem na tela 2D, nem na tela plana e no protótipo físico. Eu consigo, por exemplo, em um estalar de dedos, mudar a cor de uma geladeira, coisa que no físico não poderia ser feita”, adiciona.   

Uma das maiores demandas da indústria junto à instituição utilizando a realidade virtual, segundo a docente, está na área de segurança do trabalho. Ela revela que empresas têm procurado o Cimatec para oferecer capacitação aos seus funcionários em lidar com situações de risco e emergência, como incêndios, por exemplo, em substituição a simulações convencionais.

“O que esses ambientes imersivos permitem fazer é simular essas situações com uma sensação de presença muito mais forte. Simulamos dentro da realidade virtual como se a pessoa estivesse vivendo aquela situação crítica. Para um treinamento ou capacitação, isso é muito importante, pois quando isso é simulado no físico, às vezes não há a sensação de que aquilo está realmente acontecendo”, revela.

Embora as pesquisas revelem um otimismo de grande parte dos brasileiros quanto ao metaverso, por se tratar de uma novidade relativamente recente, nem todas as pessoas podem recebê-la com facilidade.

A engenheira de produção e estudante do programa de mestrado do Cimatec, Iolanda Chamusca, desenvolve um projeto que reúne diretrizes do design para guiar desenvolvedores de software na criação de ferramentas mais intuitivas, ou seja, para fazer com que profissionais de diversas áreas possam, no final das contas, utilizar essas ferramentas do metaverso de maneira mais fácil.

Ela, que iniciou a pesquisa no ano passado - com previsão de concluí-la no fim de 2022 - e trabalha em uma indústria automotiva que também desenvolve e aplica tecnologias do metaverso, conta que seu projeto, inicialmente, era mais voltado ao contexto da educação. No entanto, com o passar do tempo, avaliou que poderia haver outro direcionamento.

“Fomos percebendo que ela tinha potencial para abranger um gap [lacuna] que existe hoje no uso das tecnologias imersivas, que é uma grande gama de conhecimentos que é preciso ter para começar a desenvolver alguma coisa ali dentro [do metaverso]. Como facilitar a entrada de profissionais de outros ramos, sejam médicos, engenheiros ou professores, entre outros, nas tecnologias imersivas nos trabalhos deles?”, questiona. 

Por isso, ela considera que seu projeto é fundamental para reduzir possíveis resistências à sua utilização no dia-a-dia. “Acredito que esses esforços irão contribuir bastante com o metaverso, pois quanto mais ferramentas de autoria, de desenvolvimento do mundo virtual, e que sejam mais fáceis tivermos, mais pessoas irão conseguir mais conteúdos dentro dele. Espero que ele no final ele possa servir como guia inicial para usar essas ferramentas e democratizar cada vez mais a realidade virtual”, espera.

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