A TARDE ESG
O paradoxo da mineração brasileira
O subsolo está pronto. A superfície, não
Por Ronierisson Silva*

A nova corrida global por minerais críticos já começou. O Brasil está dentro — mas ainda sem um mapa claro. Enquanto os números impressionam, a base jurídica permanece instável. E, num jogo geopolítico guiado por velocidade, previsibilidade vale mais do que potência.
Hoje, os minerais críticos ocupam o centro do tabuleiro global. Eles passaram a definir estratégias de segurança energética, industrialização verde e redes internacionais de suprimento. A América Latina está no radar de governos e investidores. E o Brasil, pelas suas reservas, ocupa uma posição estratégica nesse xadrez. As projeções confirmam a tendência.
Segundo estimativas da Wood Mackenzie e da Agência Internacional de Energia, a demanda global por terras raras, cobre, lítio e níquel deve crescer entre 30% e 50% até 2030. Esse movimento é impulsionado por compromissos internacionais com: descarbonização, mobilidade elétrica, reindustrialização de baixo carbono.
O Brasil, nesse contexto, tem peso: 3ª maior reserva mundial de terras raras (atrás de China e Vietnã), 3º maior produtor global de grafite (essencial para baterias), reservas estratégicas de níquel, vanádio e nióbio — minérios centrais nas novas cadeias globais. Do lado financeiro, os sinais também são positivos: os investimentos previstos entre 2025 e 2029 ultrapassam US$ 68 bilhões.
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Mas enquanto os vetores geológicos e econômicos se alinham, a base jurídica que deveria sustentar essa expansão ainda não foi atualizada. Hoje, o Brasil carece de um marco normativo específico para minerais críticos — capaz de reconhecer sua natureza estratégica e disciplinar, com clareza, todas as etapas do ciclo: da pesquisa geológica ao beneficiamento; da governança territorial à política industrial.
Faltam também diretrizes operacionais consolidadas para os elos mais sensíveis da cadeia: regularização fundiária,
licenciamentos, processamento local, pactuação territorial. O resultado é conhecido: projetos travados, insegurança possessória e dominial, e imprevisibilidade institucional — especialmente em áreas de alto potencial.
Na Bahia, uma das maiores forças minerais do país, o paradoxo se acentua. O subsolo é promissor — mas a superfície ainda exige definições que travam projetos relevantes. É comum vermos projetos com alto grau de maturidade técnica, travar por indefinição dominial ou por ausência de pactuação territorial mínima.
Enquanto países como Austrália, Canadá e China estruturaram estratégias nacionais robustas para seus minerais críticos — o Brasil ainda opera com um marco legal fragmentado e passivos fundiários históricos que ameaçam a viabilidade de projetos importantes. Se os minerais críticos representam uma oportunidade geopolítica concreta, a ausência de uma estrutura jurídica firme pode convertê-los em risco institucional.
O ativo geológico, sem base legal correspondente, torna-se vulnerável. É por isso que a presença de uma inteligência jurídica especializada - com foco em regularização fundiária - tem sido decisiva para antecipar riscos, ordenar território e assegurar viabilidade legal dos empreendimentos, antes que o investimento se perca no emaranhado dominial que paralisa tantos projetos.
É exatamente nesse ponto que a atuação do operador de direito com visão ESG se insere: proteger o valor antes que ele se perca. A ausência desse suporte, por outro lado, significa avançar com tudo — menos com o que sustenta tudo: a posse legítima, o domínio definido e a segurança institucional para operar.
Transformar o ativo geológico em desenvolvimento concreto, sustentável, exige mais do que potencial. Exige base regularizada, dominialidade clara e previsibilidade jurídica desde a origem. Como sustentar a nova corrida por minerais críticos, se ainda não definimos onde ela começa — no próprio acesso à superfície?
* Ronierisson Silva é advogado especialista em Direito Minerário, Direito Imobiliário e Regularização Fundiária. [email protected]
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