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PIONEIRO

Expande Capão encerra com debates lotados sobre ancestralidade, ciência e futuro

Povos indígenas, ciência psicodélica e comunidade lotam coreto em evento inédito

Isabela Cardoso

Por Isabela Cardoso

23/11/2025 - 20:24 h
Comunidade lota mesas sobre psicodelia brasileira
Comunidade lota mesas sobre psicodelia brasileira -

O Vale do Capão se despediu, neste sábado, 22, de uma primeira edição histórica do Expande Capão. Foram três dias em que o coreto da vila, iluminado por luzes, símbolos e cores, se transformou em um grande círculo de conversa, um espaço quente e receptivo de trocas profundas. Moradores, visitantes, estudiosos e curiosos sentaram lado a lado para ouvir, perguntar e refletir sobre cuidado, ancestralidade, ciência e futuro.

Em todos os encontros, o público lotou o espaço, ocupando cada cadeira, degrau, canto, sempre com olhares atentos e corações abertos. A cada fala, o coreto parecia respirar junto: vibrava, aplaudia, se emocionava. Um organismo vivo, pulsante, aprendendo em tempo real.

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Mais do que um fórum, o Expande Capão nasceu como um movimento de reconexão com o território, com as memórias ancestrais, com a ciência em prol da saúde mental, com as comunidades tradicionais que guardam saberes milenares e o potencial transformador dos estados ampliados de consciência.

Foi um encontro inédito entre povos originários e a ciência psicodélica, abrindo espaço para temas como território, pertencimento, regulação, comunicação, medicina indígena, cannabis, psicodelia brasileira e ética do cuidado foram debatidos por 18 convidados. Durante os três dias, ficou claro: o Capão quer debater, quer entender, quer cuidar e quer fazer isso coletivamente.

Representante da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência no Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas e um dos curadores do evento, Diogo Busse destacou que a primeira edição do evento foi um grande sucesso e trouxe reconexão com as raízes de cada um.

“A primeira coisa que eu posso testemunhar é que algo aconteceu aqui. O meu sentimento nesse momento é de pura e plena realização, porque o nosso objetivo foi alcançado. É gerar uma reflexão, mas também uma experiência, uma vivência de reconexão. Eu sinto e todos nós que nos envolvemos nesse projeto, que não se trata de uma busca, daquilo que nos fizeram a gente acreditar, o tempo todo tendo que buscar algo, entregar algo, produzir algo. Talvez seja uma lembrança e eu acho que isso foi alcançado aqui, vivenciaram uma verdadeira experiência de reconexão com as nossas raízes, com quem nós somos, na essência. A unidade, aquela essência que nos une”, ressaltou Diogo.

Sábado de integração e futuro

O último dia do evento foi dedicado ao eixo “Cuidado, integração e futuro”, reunindo pesquisadores, terapeutas e lideranças indígenas em conversas sobre novos modelos terapêuticos e o que esperar das regulações que se aproximam.

Glauber Loures de Assis (doutor em Sociologia e fundador da igreja do Santo Daime Céu da Divina Estrela), Adana Kambeba (primeira médica do seu povo e articuladora entre medicina indígena e científica) e Marco Algorta (pioneiro no desenvolvimento da indústria canábica na América Latina) abriram a tarde discutindo formas mais comunitárias e afetivas de cuidado na mesa “Novos modelos: famílias psicodélicas”.

“Existe um tabu ligado a cosmofobia, a guerra às pessoas minoritárias, às comunidades pretas, às comunidades indígenas, que impede qualquer debate sincero e saudável sobre as famílias que se reúnem dentro de comunidades que utilizam plantas sagradas, como é o caso da Ayahuasca, como é o caso dos cogumelos. Só que isso não é só uma questão de perseguir drogas, é uma questão que está impedindo as pessoas terem seus direitos humanos respeitados. No Brasil, por exemplo, existe o risco das famílias perderem as custódias das crianças porque elas fazem parte de comunidades ayahuasqueiras”, conta Glauber.

Glauber reforçou ainda a necessidade de fazer uma mudança de paradigma em olhar para a cura, não somente do ponto de vista clínico, mas também do ponto de vista integral e social.

“Psicodélicos são também sobre as nossas relações sociais, sobre as nossas relações familiares e, no momento que a gente está com a condição de expandir a nossa consciência,a gente entende que é também sobre a nossa relação com as plantas, com a floresta, com os rios, com as montanhas e com todas as bioculturas e os biomas”, completa.

Imagem ilustrativa da imagem Expande Capão encerra com debates lotados sobre ancestralidade, ciência e futuro
| Foto: Divulgação | Olhos de Lince

Na segunda mesa, a “Integração e preparação: o antes e o depois da experiência”, Iago Lobo (psicólogo e fundador do observatório Micélio de Notícias), Tábata Gerk (psicoterapeuta co-fundadora da rede latina Hijas del Sur), e Dra. Cecília Nizarala (médica prescritora canábica e representante da igreja do Santo Daime Centro Livre Estrela Azul) abordaram o que muitas vezes fica fora dos holofotes: o tempo que antecede e sucede os rituais, cerimônias ou terapias.

Fechando o dia, Augusto Vitale (socioanalista e pesquisador pela Universidad de la República do Uruguai), Jairo Lima (indigenista e conselheiro sênior do Instituto Yorenka Tasorentsi), Diogo Busse e a Dra. Mariane Ventura (médica prescritora canábica) discutiram caminhos possíveis para políticas públicas que respeitem saberes tradicionais, garantam segurança e evitem retrocessos, na mesa “Regulações do futuro: queremos regular os psicodélicos?”.

“Foi muito importante esse processo de discussão da regulamentação das chamadas substâncias psicodélicas que, no caso da Ayahuasca, prefiro chamar de biocultura. Isso é importante porque nos ajuda, com base nos dados que eu apresentei, a percebermos a amplitude da globalização da Ayahuasca e a necessidade de traçar, ao menos, certos acordos éticos para que possamos, a partir daí, construirmos todo um processo participativo e coletivo de regulação, se for necessário”, comentou Jairo.

A potência do encontro

Imagem ilustrativa da imagem Expande Capão encerra com debates lotados sobre ancestralidade, ciência e futuro
| Foto: Divulgação | Olhos de Lince

Durante todo o evento, a palavra “encontro” apareceu como um fio que costurou falas, gestos e desejos. Cada convidado, ao seu modo, trouxe visões que dialogaram entre si, revelando que o futuro do cuidado e da consciência é, necessariamente, plural.

E o público respondeu à altura: sejam moradores antigos, jovens pesquisadores, mulheres da comunidade, viajantes de passagem ou famílias que pararam para ouvir.

“Para mim foi incrível ver a grandiosidade dos profissionais que estão aqui oferecendo esse conhecimento de forma gratuita no Coreto. Esse último dia, especialmente o tema sobre famílias psicodélicas, me pegou muito porque esse olhar integrativo pra comunidade, pras famílias, é algo que precisa ser um pouco mais visto. Tudo me emocionou bastante porque é bem atual e é bem urgente, e ao mesmo tempo elucida, traz muita consciência”, disse Bianca Lutti, de 31 anos, moradora do Vale do Capão.

O evento também atraiu turistas de várias regiões. A baiana Ana Costa saiu de Barra dos Mendes, ao lado de quatro amigos, para acompanhar a programação no Coreto.

“Foi um evento de só aprendizado. Trocar experiências, perceber como o mundo dos psicodélicos está abrindo nova consciência na sociedade e isso é um estudo maravilhoso que enche o nosso coração de amor e de paz. É só gratidão por estar aqui, é só gratidão por tanta informação, é só gratidão por essas mesas incríveis que vieram discutir, assuntos que vão agregar ao nosso crescimento”, disse.

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Vale do Capão como território de consciência

Com a força deste primeiro encontro, o Expande Capão se despede anunciando apenas uma certeza: este foi só o começo. A vila, mais uma vez, se mostrou um território fértil para diálogos profundos e, ao mesmo tempo, um lugar onde a ciência caminha descalça ao lado da sabedoria ancestral.

Marco Algorta, curador do fórum ao lado de Diogo Busse, celebrou o resultado do evento e contou que ficou surpreendido pelo enagajemtno da comunidade com as palestras.

“Uma coisa que é muito melhor do que qualquer um de nós planificou, uma coisa que superou amplamente qualquer ideia pré-concebida nossa. O primeiro dia foi incrível, a fala do movimento indígena foi muito forte, muito batalhadora, o segundo dia foi falando sobre Cannabis Medicinal, vendo como todas as pessoas da comunidade estavam muito atentas ao assunto, depois veio as falas da ciência com o movimento indígena. A forma como a comunidade do Capão recebeu isso, respondeu, superou amplamente o meu maior desejo. Foi um portal de comunicação, um portal de democracia, um portal de conversa, um portal da comunidade, abraçando um projeto, foi maravilhoso”, pontuou Algorta.

A programação do Expande Capão aconteceu de forma paralela ao tradicional Capão in Blues, que movimentou o feriado da Consciência Negra no vale. Os debates e mesas aconteceram no turno da tarde, enquanto os shows do festival ocupavam a noite, criando uma experiência inédita que combina conhecimento, arte e celebração.

Sobre o Expande Capão

No primeiro dia do evento, o fórum contou com a participação de Dra. Cecília Nizarala, a multiartista e pesquisadora das medicinas da floresta Cris Nishimori; o jovem nativo do Capão e líder bantu Ayrã Nery; e o terapeuta e dirigente espiritual Jarbas Rodrigues Júnior, que abriram o encontro discutindo território, pertencimento e práticas seguras com enteógenos.

A programação também reuniu nomes de referência no diálogo entre ancestralidade e ciência, como Daiara Tukano, artista e cofundadora da Conferência Indígena da Ayahuasca; Dra. Adana Omágua Kambeba, Dr. Glauber Loures de Assis e Jairo Lima, vozes centrais no debate sobre biocultura, reconhecimento e equidade.

No segundo dia, compondo o eixo comunicação e ciência, participaram Tábata Gerk, Iago Lobo e a jornalista Caroline Apple, que discutiram como ampliar o diálogo social sobre psicodélicos. Em seguida, a Dra. Mariane Ventura e Leandro Stelitano aprofundaram os caminhos para uma regulação justa, eficiente e baseada em evidências.

A sexta-feira ainda trouxe um encontro marcante entre a psicodelia brasileira e a academia, com os neurocientistas Dr. Dráulio Barros de Araújo e Dra. Fernanda Palhano-Fontes, além das participações de Daiara Tukano e Dra. Adana Kambeba, refletindo sobre como aproximar ciência e sabedoria ancestral.

Expande Capão

O Expande Capão é organização e coordenação da Viramundo Produções, com produção executiva da Trevo Produções, além do apoio da Prefeitura de Palmeiras e patrocínio da aLeda.

A aLeda levou ao Vale do Capão uma ativação que aproximou ainda mais a marca do público. Durante os três dias de evento, representantes distribuíram produtos, apresentaram novidades e interagiram diretamente com visitantes de todas as idades. A ação reforçou o compromisso da marca com iniciativas que promovem informação, cuidado e liberdade.

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