TENSÃO CLIMÁTICA
COP30 expõe racha: países pobres cobram justiça e ricos impõem regras
UE endurece tom na COP30 e pressiona por metas mais rígidas

Por Georges Humbert*

A 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que segue até o dia 21, tem sido palco de intensas negociações e compromissos globais para enfrentar o aquecimento global. Até o momento, delegações de dezenas de países vêm se destacando por posições firmes em temas como financiamento climático, adaptação, transição justa e redução de emissões.
O evento revela uma divisão clara entre nações desenvolvidas e em desenvolvimento, especialmente no debate sobre responsabilidades históricas e acesso a recursos. A
Financiamento e Transição Energética no Centro do Debate
A União Europeia (UE) vem exercendo liderança ativa. Os europeus têm defendido a integridade do Acordo de Paris e proposto “guardrails” que garantam que a ambição climática global não retroceda. Nas consultas sobre as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), a UE reforçou que a transição dos combustíveis fósseis só será possível com forte cooperação internacional e mecanismos eficientes de mercado de carbono.
No dia 11, o bloco reiterou seu compromisso com o Novo Objetivo Coletivo Quantificado de Financiamento Climático (NCQG), destacando a necessidade de rastreamento transparente dos fluxos financeiros, alinhados ao Artigo 2.1c do Acordo de Paris, que trata da compatibilização dos investimentos globais com metas climáticas.
A UE também se colocou contra a criação de novas instituições para conduzir a transição justa, defendendo o uso de arranjos multilaterais já existentes. Quanto à adaptação, apoiou indicadores globais, mas com ressalvas quanto ao risco de que as métricas gerem novas obrigações ou responsabilidades legais para os países.
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Os Estados Unidos, embora com participação política mais discreta nesta fase inicial, foram frequentemente citados por outras delegações como peça-chave para aumentar a oferta de financiamento climático. Países vulneráveis demandaram que Washington avance em compromissos financeiros e na meta de mobilizar US$ 1,3 trilhão anuais até 2030. Os EUA também participaram das discussões sobre lacunas de ambição das NDCs, especialmente no tocante ao setor energético.
O Reino Unido (UK), alinhado à posição europeia, se opôs ao uso de plataformas digitais para o Programa de Trabalho de Mitigação (MWP), defendendo que os esforços devem se concentrar em ações práticas e não em sistemas paralelos de monitoramento. O país reforçou seu apoio ao NCQG e defendeu maior previsibilidade dos recursos para adaptação, ressaltando que os países vulneráveis precisam de segurança financeira para implementar ações de médio e longo prazo.
Países em Desenvolvimento: Justiça Climática e Recursos como Prioridade
Entre as nações do Sul Global, a palavra de ordem tem sido “equidade”. Países africanos, asiáticos e latino-americanos reforçaram que a transição energética precisa considerar as desigualdades históricas, defendendo que os desenvolvidos assumam compromissos mais robustos.
O Grupo Africano pediu que o novo financiamento climático seja “novo, adicional e previsível”, deixando claro que reembolsos ou empréstimos não podem substituir o financiamento climático real. A Coalizão das Nações Menos Desenvolvidas (LDCs) exigiu garantias para que os fundos cheguem diretamente a comunidades vulneráveis, sem burocracias excessivas.
Já o G77 + China enfatizou que a ambição global não pode ignorar o princípio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. O grupo também reforçou que adaptação deve receber a mesma centralidade dada à mitigação, especialmente diante do aumento de eventos extremos em países pobres.
Países Vulneráveis: Adaptação, Perdas e Danos no Centro das Negociações
Os pequenos Estados insulares (AOSIS) têm sido alguns dos mais vocais da COP30. Eles insistem que a limitação da temperatura a 1,5°C precisa sair do plano da retórica e entrar no plano da ação. Para eles, o avanço do oceano, o aumento das tempestades e a insegurança alimentar já são realidades irreversíveis em diversas ilhas do Pacífico e do Caribe.
AOSIS também pressionou por avanços rápidos no mecanismo de Perdas e Danos, criado na COP27, e exigiu clareza sobre como será financiado, quem contribuirá e como os recursos serão distribuídos.
América Latina e Caribe: Unidade Regional em Defesa da Floresta e do Clima
Países latino-americanos apresentaram postura mais articulada nesta COP. A Colômbia defendeu a criação de uma coalizão regional para proteção de florestas tropicais, enquanto o Peru reforçou a necessidade de financiamento para comunidades indígenas, consideradas guardiãs naturais dos biomas.
O México destacou o papel estratégico das cidades na mitigação e adaptação, propondo maior cooperação entre governos subnacionais. Já o Chile impulsionou o debate sobre mercados de carbono, pedindo reconhecimento dos esforços de descarbonização do setor energético sul-americano.
Uma COP marcada por Pressão, Expectativas e Divergências Estruturais
A COP30 tem evidenciado um cenário global complexo. Países desenvolvidos pressionam por regras mais rígidas de mitigação e mercados de carbono robustos. Países em desenvolvimento pedem justiça climática, recursos e flexibilidade. Pequeninas nações vulneráveis exigem sobrevivência.
No meio desse tabuleiro, Belém se torna o epicentro mundial de decisões que moldarão o planeta pelas próximas décadas.
Até aqui, a participação internacional mostra que, apesar das divergências, há consenso em um ponto: o tempo para negociar está acabando. Agora, é hora de agir — com responsabilidade, financiamento e, sobretudo, coragem política.
*Georges Humbert é correspondente de A TARDE na COP30, em Belém
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