INTERNACIONAL!
Lenda francesa, Isabelle Huppert enaltece cinema brasileiro e Glauber Rocha
Atriz participou de sessão de cinema especial em Salvador e revelou interesse em filmes brasileiros

Por Beatriz Santos

A atriz francesa Isabelle Huppert esteve em Salvador nesta sexta-feira, 5, para um bate-papo após a exibição de A Mulher Mais Rica do Mundo, no Cine Glauber Rocha. Em entrevista ao Cineinsite A TARDE, ela comentou sobre o longa, sua relação com diretores internacionais e o desejo de se surpreender com o cinema brasileiro.
A passagem de Isabelle Huppert pela capital baiana foi um dos momentos mais aguardados do Festival de Cinema Francês do Brasil 2025, que acontece entre 27 de novembro e 10 de dezembro.
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Com mais de 50 anos de carreira, mais de 160 créditos e inúmeras colaborações internacionais, a artista é considerada um ícone do cinema mundial, e sua visita reafirmou a importância da preservação das salas de cinema em Salvador.
Huppert e o olhar para o cinema brasileiro
Durante a entrevista, Isabelle Huppert demonstrou admiração profunda pela cinematografia do país. “O Brasil tem grandes diretores que admiro, e isso não é recente. Aqui estamos no Cinema Glauber Rocha. O Glauber Rocha, por exemplo, especialmente para os povos europeus, sempre foi visto como uma figura mítica: pelos filmes e pela sua forma de fazer cinema.”
Ela também citou obras e autores contemporâneos: “E depois Cidade de Deus, Fernando Meirelles. Walter Salles e Kleber Mendonça, diretores mais recentes. A nova geração também. Karim Aïnouz — eu gosto muito dele.”
A atriz afirmou que gostaria de filmar com cineastas brasileiros, mantendo sua tradição de parcerias internacionais: “Eu gostaria, claro. Sempre me atraí por trabalhar longe do meu país — como quando fiz filmes na Ásia, com pessoas como Hong Sang-soo, na Coreia; Rithy Panh, no Camboja; ou Brillante Mendoza, nas Filipinas.”
Tive muitas experiências em países fora da França e gostaria de trabalhar aqui, fazendo um filme com um diretor brasileiro
Em tom de brincadeira, a atriz manteve o suspense sobre os nomes com os quais gostaria de trabalhar: “Sim, mas eu não vou te contar.”
Huppert reforçou ainda que espera diferenças — não semelhanças — entre o cinema francês e o brasileiro: “Eu acho que não vejo tantas similaridades, na verdade. É difícil. Eu acho que o cinema brasileiro é muito específico. Eu não espero nenhuma semelhança; ao contrário, eu espero ser surpreendida e ser levada para uma realidade diferente. Se não, não vale a pena fazer filmes. Se todos os filmes parecem como os outros, qual é o ponto?”
A Mulher Mais Rica do Mundo: poder, afeto e corrupção
Dirigido por Thierry Klifa, o longa acompanha Marianne Farrère (Huppert), dona da gigante Windler e considerada a mulher mais rica do planeta.
A relação inesperada com Pierre-Alain Fantin (Laurent Lafitte), um jovem escritor e fotógrafo, desencadeia uma trama de afeto, manipulação e um escândalo de corrupção que abala Paris. Inspirado no caso de Liliane Bettencourt, o filme combina thriller psicológico e drama numa abordagem ficcionalizada de uma história real.
Ao falar sobre a conexão do público com o longa, Huppert explicou: “É uma história muito francesa e baseada em uma história verdadeira. Espero que as pessoas aqui se conectem com a narrativa, porque o filme consegue apresentá-la como se fosse ficção — não como um documentário. Espero que as pessoas gostem.”

Ela também revelou que sua decisão de aceitar o papel não foi imediata. “Eu não me senti atraída pela história desde o início. Esperei até ler o roteiro, e o roteiro era muito bom; os diálogos eram bruscos e interessantes", disse.
"Então, ao ler, imediatamente percebi o potencial das caracterizações de todos os papéis. Antes de ler eu não estava tão segura, mas, quando li, fiquei mais confiante, porque era um roteiro realmente incrível”, completa a atriz.
"Ela tinha o sonho de conhecer Salvador"
Para Christian Boudier, curador e organizador do festival, a presença de Huppert confirma a força do evento e do público baiano. “Acho que demonstra a atratividade do Brasil e, particularmente, de Salvador. Porque, como afirmei para o público, ela veio para defender o filme, mas Salvador e a Bahia eram realmente um sonho que ela queria muito conhecer.”
Segundo Boudier, esse desejo pessoal influenciou diretamente a vinda da atriz: “Então, desde o começo, eu falei: ‘Isabelle, você vem ao festival, a gente leva você para Salvador e você vai conhecer a Bahia.’ E foi isso que fez com que ela viesse pela segunda vez ao Brasil, porque ela já tinha vindo antes”.
O festival, segundo ele, serve como resistência ao apagamento do cinema autoral: “Está cada vez mais difícil; cada ano é mais duro, é verdade. Isso é algo que o festival tenta resistir, essa dificuldade crescente de lançar filmes no Brasil”.
Ele enfatiza a importância da imprensa, do público e das salas de arte: “O festival e o próprio Glauber são uma espécie de resistência a esse circuito cada vez mais comercial. Estamos na guerrilha, com certeza. Mas, estamos aqui, e a gente precisa muito da imprensa, do público, do cinema.”
Para Cláudio Marques, diretor do Cine Glauber Rocha, a passagem de Isabelle Huppert por Salvador não foi apenas um gesto simbólico, foi a demonstração prática do quanto espaços independentes podem conectar o público local ao cinema mundial. A presença da atriz, segundo ele, revela o que está em jogo quando se fala em preservar salas como o Glauber.
Ele lembrou que a França mantém uma relação histórica de cuidado com a exibição cinematográfica, elemento que sustenta encontros como o que aconteceu nesta sexta.
“A França é um país que realmente ama o cinema; eles cuidam do cinema. E, quando eu digo que cuidam do cinema, é porque eles cuidam da exibição, das salas, das salas de rua. Eles entendem que, quando você tem a exibição garantida, você tem todo o resto”, afirma.

A chegada de alguém do porte de Huppert reforça essa lógica, mostrando que artistas do mundo inteiro reconhecem o valor de espaços dedicados ao cinema. “No momento em que a gente traz uma atriz tão apaixonada pelo cinema, que dedicou toda a vida à arte, é uma forma de reafirmar essa importância: os filmes precisam ser vistos. Ela só tem essa relevância mundial porque foi muito vista pelo mundo inteiro.”
Mas Cláudio faz questão de contrastar essa visão com a vulnerabilidade das salas brasileiras, que enfrentam desafios constantes. “No Brasil, a gente faz diferente: produzimos sem saber se os filmes vão ser exibidos. Hoje, temos uma quantidade absurda de filmes sendo feitos e que não são vistos por ninguém”.
A emoção de uma fã baiana
Entre o público, uma das mais emocionadas era Natália Barbosa, fã de Huppert há 13 anos.
Ela contou: “Isabelle é meu hiperfoco desde que eu tinha 17 anos. Hoje eu tenho 30. Para mim, hoje, eu acabei de me formar — literalmente saí da faculdade. Mas estou mais entusiasmada em ver a Isabelle do que com o meu diploma.”

Natália reconhece que o acesso ao cinema francês na cidade é limitado: “Como é muito difícil o acesso ao cinema francês aqui em Salvador, eu enfrento muita dificuldade, só as salas de arte mesmo e no Glauber Rocha”.
E descreveu sua relação com a atriz: “A gente vê Cannes todos os anos. Tenho uma amiga que fala francês — eu, infelizmente, não falo —, mas ela traduzia tudo para a gente quando chegava. Porque ela é a rainha do tapete vermelho de Cannes. Não tem como negar.”
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