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ACB em Foco

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ACERVO DA COLUNA
Publicado quarta-feira, 26 de março de 2025 às 4:40 h | Autor:

Vozes que fundam, silêncios que afundam

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Zilan Costa e Silva é advogado, jornalista e vice-presidente da ACB
Zilan Costa e Silva é advogado, jornalista e vice-presidente da ACB -

Em 1988, o Brasil ganhava uma nova Constituição formulada como promessa de um País reconstruído sobre as bases da dignidade humana, dos direitos sociais e da democracia pluralista. “Constituição Cidadã” foi o nome que lhe deram — não apenas por seu conteúdo generoso, mas porque resultava de uma pressão popular inédita, que irrompeu nas ruas, nas assembleias, nos sindicatos.

O Brasil viveu um momento constitucional autêntico: uma transição negociada, sim, mas atravessada por intensa mobilização social. Não foi uma emenda à ordem anterior, mas a refundação do pacto nacional. A Constituição consagrou não só direitos, mas esperanças — e foi reconhecida, desde o início, como fruto da soberania popular, ainda que mediada pelo Congresso Constituinte. A mobilização popular se deu nas ruas e, também, nos detalhes: em cada artigo que acolheu as vozes dos que antes eram silenciados. Mulheres, negros, indígenas, trabalhadores sem terra, sem teto, sem acesso. A Constituição Cidadã falou por eles.

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Mais de três décadas depois, essa mesma Constituição convive com paradoxos: multiplicam-se as emendas, cresce o protagonismo do Judiciário e a legitimidade do sistema político é colocada em xeque. Estaria o Brasil diante de um novo momento constitucional? Ou seguimos presos à rotina da política ordinária, sem ouvir a nova voz do povo?

O Judiciário assumiu papel central na reinterpretação do texto constitucional, influenciando questões como casamento homoafetivo, cotas raciais e financiamento de campanhas. Para alguns, isso reflete a evolução da sociedade; para outros, indica uma hipertrofia do Judiciário que desequilibra a democracia.

O dilema é claro: a Constituição deve ser vista como um freio ao poder ou um instrumento de transformação social? Em países marcados por desigualdades, a tensão entre promessa e realidade se torna evidente. A democracia precisa de instituições fortes, mas também de participação ativa da sociedade.

E, no entanto, nem sempre há coro. Às vezes, há silêncio — e o silêncio pode ser consentimento, mas também pode ser cansaço. A Constituição de 1988 ainda respira, mas seus pulmões parecem comprimidos por reformas em série, pela linguagem fria dos tecnocratas, pelas hesitações de quem deveria defendê-la. A crise da democracia representativa, o desencanto com os partidos, a fragmentação institucional e a escalada da judicialização da política colocam em xeque o equilíbrio delicado entre política ordinária e política constitucional.

Seria este um novo momento constitucional? Ou vivemos uma erosão sem substituição? Nem toda ruptura é legítima, e a voz do povo não pode ser confundida com a histeria polarizada. Aclamação não é gritaria. É construção, reconhecimento e sedimentação.

A Constituição não é apenas um texto, é uma travessia. Vive nos tribunais, nas escolas, nas ruas, nos conflitos e nas promessas. Precisa ser ouvida, não apenas lida. Em 1988, falamos. A questão é: estamos prontos para escutar novamente?

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