FÉ E ARTE
Exposição transforma canções de Luiz Gonzaga em arte no Pelourinho
Força da fé e da arte nordestina inspira exposição gratuita em Salvador

Por Eugênio Afonso

Outubro é tempo de celebrar a nordestinidade. No último dia 8, por exemplo, foi comemorado o Dia do Nordestino. Uma gente considerada forte, valente, resiliente e, sobretudo, resistente.
Além disso, o Nordeste, no campo das artes, desde sempre tem nos presenteado com artistas ilustres como o compositor pernambucano Luiz Gonzaga (1912-1989), nosso eterno Rei do Baião, ícone da música brasileira, sobretudo por ter disseminado ritmos como baião, xote e xaxado pelo País inteiro.
Para festejar ainda mais esta região brasileira tão rica culturalmente, Salvador ganhou uma exposição inspirada nas composições de Gonzagão. Sertão de Fé - A Fé Sertaneja nas Canções de Luiz Gonzaga reúne gravuras produzidas pelo artista plástico e músico soteropolitano Bi Morais, 40, e fica em cartaz até o próximo dia 04 de novembro no Espaço Uno (Rua da Ordem Terceira, 1, Pelourinho).
A ideia é ilustrar a fé obstinada do povo nordestino presente em inúmeras canções de Gonzagão. “Mostrando as agruras do povo sertanejo, nossa fé e a nossa festa presentes em canções como Festa de Santo Antônio, Baião da garoa, que tratam a fé de forma festiva”, detalha Morais.
Unindo ilustrações acompanhadas por textos em cordel criados pelo músico pernambucano Rodrigo Chianca, a mostra exibe 14 obras, divididas entre gravuras feitas em serigrafia e poemas visuais ilustrados e produzidos em arte digital, além de livretos em cordel.
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Memória afetiva

Inspiradas no traço das xilogravuras, as gravuras – através do auxílio luxuoso do cordel – narram histórias e causos relativos à religiosidade popular, dando à mostra um caráter multiartístico.
Como forrozeiro e pesquisador de música brasileira, Bi Morais confidencia que foi extremamente natural se inspirar no Rei do Baião para idealizar a mostra. “Tenho um grande acervo de LPs da nossa música, e em especial, de Luiz Gonzaga. Além disso, sou filho de um sertanejo, da cidade de Xique-Xique, aqui na Bahia, onde vivi os momentos mais felizes da minha infância e adolescência”.
“E durante a pandemia, eu aproveitei ao máximo o fato de estar em reclusão para me desafiar, estudar música e, nas artes plásticas, criar um novo traço, baseado na cultura popular nordestina, vista e vivida por mim, através dos discos, dos livros de Ariano Suassuna, das xilogravuras de artistas que admiro e de tantas viagens que fiz e faço por esse Nordeste e, principalmente, nas minhas memórias afetivas do sertão baiano”, alinhava.
Subversão do cordel

E depois de muita pesquisa e perceber a recorrência de alguns temas presentes na obra de Gonzagão, sendo um deles a religiosidade sertaneja, Bi Morais decidiu criar desenhos baseados nas xilogravuras nordestinas, mas com uma identidade particularmente própria.
Ele conta que convidou Chianca para fazer um caminho oposto à história entre xilogravura e cordel, já que, originalmente, as gravuras eram feitas pra ilustrar os folhetos.
“Eu quis fazer o contrário, onde ele iria olhar minha obra e ilustrar poeticamente as mesmas, tendo também como referência, as canções de Gonzaga. E aí deixei ele usar toda a criatividade. E sabe o que é melhor? Ele topou. Pra minha sorte”, explana, feliz, Morais.
Incumbido de traduzir, em palavras e rimas, a visão que Bi teve sobre as canções de Luiz Gonzaga ao elaborar as gravuras, Chianca explica que “a ideia foi subverter um pouco a dinâmica tradicional do cordel: em vez de a gravura ilustrar o cordel, como costuma acontecer, foi o cordel que passou a ilustrar a obra”.
“Claro que sempre respeitando a ideia original das músicas de Gonzagão e a forma tão singular e mágica como o sertanejo enxerga a fé. No final, cada obra apresenta três pontos de vista diferentes: o original, o de Bi e o meu”, arremata o cordelista.
Morais argumenta ainda que, inicialmente, optou por destacar a religiosidade nas obras de Gonzagão em função de – durante o período pandêmico – estar à cata de um tema para um projeto de mestrado.
“Buscava algo que já não tivesse sido falado, ou pelo menos não com essa abordagem, sobre a obra de Gonzaga, e esse tema, que é de grande relevância. Além disso, a religiosidade esteve presente em minha vida desde a infância”. E, para finalizar, Bi Morais informa que dedica a exposição à memória de sua mãe, que partiu este ano.
Sertão de Fé — a Fé Sertaneja nas Canções de Luiz Gonzaga foi contemplada nos editais da Paulo Gustavo Bahia e tem apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura, Ministério da Cultura, Governo Federal.
Sertão de Fé — a Fé Sertaneja nas Canções de Luiz Gonzaga / até 04 de novembro / Espaço Uno (Rua da Ordem Terceira, 1, Pelourinho) / Gratuito
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