DIA DE SÃO COSME E DAMIÃO
Quebra-Pote e Festa das Crianças: a tradição baiana no Dia de São Cosme e Damião
Uma celebração que vai muito além dos saquinhos de doces

Por Iarla Queiroz

Em 27 de setembro, que cai em um sábado este ano, a população da Bahia se prepara para um dos rituais mais esperados do calendário popular: o Dia de São Cosme e São Damião.
Conhecido nacionalmente pela distribuição de balas e guloseimas, o festejo baiano guarda práticas que atravessam séculos e misturam fé, solidariedade e diversão. Entre elas, o quebra-pote — brincadeira em que um pote de barro recheado de surpresas é suspenso e estourado no ar — transforma a rua em palco de alegria coletiva.
Raízes de fé e resistência
A devoção aos santos gêmeos remonta ao século IV, quando Cosme e Damião, médicos que atendiam sem cobrar, foram perseguidos e martirizados pelo Império Romano. A história chegou ao Brasil com os colonizadores portugueses e, durante a escravidão, encontrou eco nas religiões de matriz africana, que identificaram os irmãos cristãos com os Ibejis, orixás gêmeos ligados à infância e à pureza.
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Essa ponte entre culturas criou um sincretismo único: oferecer doces às crianças tornou-se forma de agradecer bênçãos, celebrar a vida e afirmar identidades.
Em muitos terreiros de candomblé, a festa é dedicada também a Erês, entidades infantis que representam alegria e inocência, reforçando a centralidade das crianças no dia.

O doce que leva o nome da brincadeira
Na Bahia, “quebra-pote” não é só diversão. Também batiza um doce crocante de amendoim e açúcar, presença certa nas cestas distribuídas no dia 27. Assim, o termo se desdobra em duas experiências que encantam os pequenos: a guloseima que estala a cada mordida e a disputa animada para romper o pote suspenso, liberando balas, brinquedos e moedas.
Entenda a brincadeira:
As crianças se juntam, cada uma com seu bastão, e a rua inteira participa da torcida. Quando o pote quebra, é uma explosão de gritos e correria.

Festa para os pequenos, força da comunidade
Famílias, vizinhos e terreiros organizam verdadeiros mutirões para preparar mesas de caruru, vatapá, pipoca e os tradicionais saquinhos de doces.
A entrega gratuita é promessa cumprida por graças recebidas, mas também ato de solidariedade: em muitos bairros, a celebração se transforma em ação social, com doação de alimentos, brinquedos e roupas.
O caruru é mais do que comida, é partilha. Cada ingrediente tem um significado de proteção e prosperidade.
Em algumas casas, a festa dura o dia inteiro, começando com rezas e cânticos e terminando com música, rodas de samba e, claro, o esperado quebra-pote.

Patrimônio imaterial e resistência cultural
Em 2024, o caruru de Cosme e Damião foi reconhecido como patrimônio imaterial da Bahia, reforçando a importância da festa para a identidade do estado.
O título chega em um momento em que a tradição enfrenta desafios: a intolerância religiosa ainda atinge praticantes de religiões afro-brasileiras, e a comercialização crescente pode esvaziar o sentido comunitário da celebração.
Mesmo assim, o brilho da festa resiste.

De ontem a amanhã
De Salvador ao Recôncavo, do Sertão ao Litoral Norte, o Dia de Cosme e Damião segue unindo gerações. Nas portas das casas, crianças com sacolinhas coloridas esperam doces; nos terreiros, tambores chamam para a roda; nas ruas, o pote suspenso desafia mãos ansiosas.
Quando a noite cai e os últimos doces são repartidos, fica a certeza de que essa tradição é mais que uma festa: é ato de fé, cultura e resistência, um jeito baiano de ensinar que infância é sagrada e que compartilhar é tão importante quanto celebrar.
Serviço
- Data: Sábado, 27 de setembro de 2025
- Onde: Ruas, praças, casas e terreiros em todo o estado
- Destaques: Distribuição de doces, caruru, brincadeira do quebra-pote e festas abertas às crianças
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