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ENTREVISTA PING-PONG

"Não é só apontar, mas entender": MPBA busca soluções para educação na Bahia

Em entrevista, coordenador do Ceduc destacou ações do MPBA e da Uncme em 166 municípios e 900 escolas

Loren Beatriz Sousa

Por Loren Beatriz Sousa

06/09/2025 - 7:00 h
Promotor de Justiça Adriano Marques
Promotor de Justiça Adriano Marques -

O Ministério Público da Bahia (MPBA), em parceria com a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme-BA), promoveu a Semana de Ação simultânea do programa Saúde + Educação: transformando o novo milênio.

A mobilização alcançou 166 municípios, com visitas a 900 escolas da rede estadual e municipal, envolvendo promotores de Justiça, servidores do MPBA e conselheiros municipais de educação.

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A iniciativa reforçou a importância da participação social e institucional na defesa do direito fundamental à educação, além de possibilitar um diagnóstico detalhado sobre as condições das escolas públicas baianas.

O relatório resultante apontou inconformidades significativas. Na alimentação escolar, 60% das cozinhas não possuem telas de proteção, 34% não realizam dedetização regular e 20% apresentaram falhas no armazenamento de alimentos.

No campo da educação inclusiva, os dados revelaram que 86% das escolas não contam com piso tátil para alunos com deficiência visual, 73% não oferecem recursos de tecnologia assistiva como braille, Libras ou softwares específicos, 47% não possuem rotas de saída de emergência acessíveis e apenas 61% declararam elaborar o Plano Educacional Individualizado (PEI).

Já nos aspectos pedagógicos, 72% dos professores não são concursados, 41% das escolas não registram a evasão escolar e, em 51% dos casos, a escolha da direção não é feita pela comunidade escolar.

Em entrevista exclusiva a A TARDE, o coordenador do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Educação (Ceduc), promotor de Justiça, Adriano Marques, comentou os resultados da ação e as perspectivas para os próximos passos.

Confira entrevista completa

O que motivou o MPBA a realizar uma mobilização simultânea em mais de 160 municípios?

Essa já é uma prática antiga do Ministério Público. A gente tem esse projeto desde 2009, 2010. E agora que a gente tem um aplicativo com os questionários para as visitas, nós temos mais capilaridade e fizemos uma parceria com os conselhos municipais de educação, a Uncme-BA, para atingir mais unidades escolares e mais municípios baianos.

Então, isso resultou nesse número expressivo de 900 unidades visitadas em 166 municípios. Mas já era uma prática do promotor de justiça visitar escolas e preencher esses questionários que antes eram manuais, em papéis impressos.

O senhor comentou que é uma ação que já faz parte da rotina do órgão. Então, qual foi o principal diferencial desta ação em comparação às fiscalizações anteriores?

O principal diferencial foi a capilaridade, a quantidade de escolas que a gente conseguiu alcançar com o apoio dos conselheiros municipais de educação. Isso foi um fator decisivo para a gente alcançar mais unidades escolares e mais municípios.

E também o nosso aplicativo. Agora a gente consegue responder esses questionários através do aplicativo no celular, o aplicativo Milênio Mobile. E a gente tem essas informações em tempo real no nosso sistema atualmente.

O levantamento apontou problemas graves com relação à infraestrutura, alimentação... Entre os problemas identificados, quais mais chamaram a atenção do MP? Esses dados a gente conseguiu levantar as principais inconsistências. Então, a gente viu ali na estrutura algumas inconsistências relevantes. E não só na estrutura física, mas também na estrutura pedagógica, principalmente quando a gente faz um retrato da educação inclusiva no Estado da Bahia, tanto nas escolas municipais quanto estaduais.

Então, esses pontos estruturais, físicos e pedagógicos, chamam a nossa atenção para que a gente possa criar uma estratégia de atuação junto a essas gestões públicas, no sentido de sanar essas inconsistências.

O que a gente pretende fazer? Levantando todas essas inconsistências, pretendemos solicitar aos gestores municipais que apresentem um plano de ação para saneamento dessas inconsistências. E assim que eles apresentarem esses planos, a gente vai informar ao promotor de justiça a existência desses planos municipais para que eles monitorem o cumprimento e o saneamento dessas inconsistências.

O senhor comentou sobre essa questão da educação inclusiva. Também é outro dado bem alarmante apresentado no relatório do MPBA. Então, qual é o impacto da falta de estrutura para os alunos com deficiência e como o órgão pode atuar para que o direito à educação inclusiva seja de fato garantido?

Nós atuamos nesse aspecto de uma forma muito positiva. Nós temos um projeto aqui no Ministério Público chamado ‘Todas as escolas são para todos os alunos', em que a gente, a partir de uma adesão do município, constrói um passo a passo para aplicar de forma concreta a lei brasileira de inclusão.

Então, esses passos consistem na sensibilização da comunidade escolar sobre o que é inclusão, o que é educação inclusiva, a formação de uma equipe multidisciplinar para a educação, envolvendo psicopedagogos, psicólogos, pedagogos, assistentes sociais.

Além da criação dessa equipe multidisciplinar, a formação contínua dos professores sobre a educação inclusiva, muitos deles ainda não sabem aplicar esses materiais, esses instrumentos pedagógicos de inclusão, porque não viram isso na faculdade. É um tema realmente novo ainda, que merece uma atenção especial das universidades brasileiras.

A gente criou um protótipo de uma ferramenta digital também, para que todos esses documentos fiquem armazenados e disponíveis para a família, dando transparência ao Plano Educacional Individualizado (PEI) do seu filho, do aluno com deficiência, e também que possa haver uma contribuição da equipe médica que acompanha esse aluno para a construção do PEI, que nós achamos importante no sentido de firmar que o critério é psicossocial pedagógico e não é um critério médico, não é o médico que diz o que deve acontecer dentro da escola para aquele aluno, mas sinalizando que a contribuição dele para o professor na construção desse material pedagógico é importante.

Então, nós atuamos já em vários municípios. É um projeto de adesão. O município procura o Ministério Público e demonstra a vontade de ter esse projeto aplicado junto com nossos parceiros que são as universidades, o SESI, enfim… A luta é grande mas é um projeto bem bonito que realmente transforma vidas.

O relatório também mostra que 72% dos professores não são concursados e mais da metade das direções não é eleita pela comunidade. Como o Ministério avalia esse cenário e como essa falta de concursos e de estabilidade impacta na qualidade do ensino?

A gente está vendo agora um resultado bem ruim no índice de alfabetização aqui da Bahia. Nós estamos ocupando o último lugar e vários são os fatores que nos levam a isso. E um deles, inclusive, é a grande quantidade de professores temporários. Por que isso gera um impacto negativo na educação? Porque é uma rotatividade muito grande. Não há uma continuidade desses professores. Não tem como uma formação continuada desses professores gerarem frutos se eles são periodicamente alterados, modificados, substituídos.

Então, a gente entende que o número de professores temporários impacta negativamente no cenário educacional baiano. É um alerta para que os municípios tenham consciência de que a educação precisa de professores compromissados com um projeto educacional e não com um plano anual ou com um plano de uma gestão apenas, mas sim com um projeto permanente, perene, em que a formação continuada dele vai ser revertida em qualidade para os alunos. E a falta de professores concursados nos leva a essa conclusão.

Obviamente que podemos ter algum índice diferente, positivo, em alguma escola que tenha, em algum município que tenha uma grande quantidade de professores temporários. Mas isso não é a realidade. Nós verificamos e os próprios estudos sociais demonstram que a quantidade de professores temporários enfraquece a qualidade do ensino nos municípios baianos.

O MP pretende unir essas forças? Pretende integrar Estado e municípios para enfrentar esse cenário?

Nós já participamos do Comitê Bahia Alfabetizada que já tem os procedimentos em vários municípios no sentido de fiscalizar como anda a qualidade da educação nesses municípios, principalmente para alunos do Fundamental I [...] Obviamente, os reflexos disso vão ocorrer para todos os demais alunos de todos os grupos, de todas as séries.

O que a gente precisa esclarecer é que esse projeto não é só um projeto de fiscalização, é um projeto também de um caminhar junto com o município, no sentido de mostrar um raio-x da educação naquele município, e uma estratégia política, pedagógica, no sentido de melhorar a educação.

Então, se temos muitos professores que não são concursados, nós precisamos entender o que está faltando naquele município para fazer concurso público. É falta de recursos? É o limite orçamentário? É a lei de responsabilidade fiscal? São muitos professores afastados por motivos diversos. Precisamos entender quais são as dificuldades do município na execução de concursos públicos para a contratação de professores. Não é só apontar, mas entender quais são as dificuldades para podermos criar uma estratégia conjunta.

Sobre Programa Bahia Alfabetizada. Em agosto, o Ministério participou do Seminário Estadual e definiu como prioridade máxima a efetivação do Programa Bahia Alfabetizada, que prevê, até 2030, mais de 80% das crianças alfabetizadas até o segundo ano do Fundamental. Diante disso, de que forma os problemas estruturais identificados nas visitas como a falta de bibliotecas, internet e condições de inclusão podem comprometer essa meta? E como o órgão pretende com os gestores municipais e estaduais para buscar essas soluções, além do que o senhor já mencionou na fala anterior?

Nós já estamos dialogando. Na verdade, há uma grande força hoje no Estado da Bahia, com todos os municípios, todos os gestores municipais, secretários de educação, prefeitos, Ministério Público, Defensoria Pública, todos os órgãos que atuam junto a esses municípios na educação, estão de mãos dadas no sentido de mudar esse cenário na Bahia que não nos cabe.

É uma Bahia de tantos expoentes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Betânia, Jorge Amado. Não pode estar figurando em último lugar na alfabetização. Então, nós precisamos realmente tirar o Estado dessa posição e todas as instituições governamentais, não-governamentais, estão imbuídas no sentido de mudar esse cenário.

O Ministério Público vai fiscalizar os municípios no sentido de aderir ao Programa Bahia Alfabetizada e cumprir com todas as metas ali previstas. O que está faltando para que esse professor alfabetizador faça um bom trabalho? Como é que esses alunos estão sendo alfabetizados? É a evasão escolar que está prejudicando a formação desses alunos? Nós precisamos fazer a Busca Ativa. Então, também já disparamos isso para que o promotor fiscalize se a rede de Busca Ativa Escolar está funcionando bem. [...] Estamos fiscalizando as escolas para ver se essa parte estrutural, se a parte pedagógica tem inconsistências, essas inconsistências precisam ser sanadas.

Nós precisamos oferecer para o nosso aluno, para as famílias dos nossos alunos, uma educação de qualidade. Todos esses esforços, eles têm que ser concentrados por todos os agentes que atuam na educação.

O relatório vai subsidiar futuras ações judiciais. Que medidas práticas podemos esperar a curto prazo?

Eu não digo ações judiciais, mas eu digo procedimentos ministeriais, extrajudiciais dentro do Ministério Público. Nós vamos movimentar as promotorias no sentido de, com esses planos para saneamento de inconsistências, monitorar o trabalho dos municípios no sentido de adequar as escolas ao que realmente a gente entende como correto.

É uma escola inclusiva, é uma escola de qualidade, é uma escola que tem uma estrutura física ideal para o aprendizado. E isso cabe ao promotor de justiça construir com o gestor público a construção dessa escola de uma forma mais humana, mais digna e mais adequada para nossos alunos.

A gente vai monitorar o trabalho dos municípios, cobrar que essas reformas estruturais e pedagógicas sejam implantadas, que o aluno realmente tenha uma qualidade na educação, e caso o prefeito ou o secretário de Educação não adiram a esse plano ou não executam esse plano da forma adequada, aí sim a gente pode mover, movimentar o judiciário no sentido de cobrar judicialmente a execução desse plano.

Mas a ideia, sempre quando a gente fala sobre melhoras na educação, há uma receptividade muito grande dos gestores. Os gestores querem entregar uma educação melhor, uma educação de qualidade aos alunos. Às vezes, precisa apenas de um apoio para fazer isso acontecer, isso se tornar realidade. E é isso que o Ministério Público está fazendo agora, estendendo a mão para o gestor, no sentido de fazer a educação de qualidade acontecer no município.

O MP já planeja novas ações semelhantes este ano ou em 2026?

Excelente essa sua pergunta. Essa é a primeira visita e nós visitamos 900 escolas em 166 municípios. É um número realmente que deixa a gente muito feliz, ainda mais com essa parceria com a União dos Conselhos Municipais de Educação. Nós vamos voltar a visitar essas mesmas escolas que nós visitamos. A gente chama isso de revisita, e provavelmente essa revisita vai acontecer no mês de abril do ano de 2026.

Vamos revisitar essas escolas para saber se os planos apresentados pelos municípios para o saneamento dessas inconsistências, eles foram executados e se essas inconsistências já não existem mais naquela escola. Caso essas inconsistências ainda venham a existir, o Ministério Público vai realmente atuar de uma forma mais coercitiva junto aos municípios no sentido de obrigar que essas inconsistências sejam sanadas.

Nós costumamos fazer três ações simultâneas por ano. Então, provavelmente, no ano que vem, os municípios que não foram visitados esse ano de 2025 serão visitados. Queremos visitar o máximo de escolas possível nos 417 municípios do Estado da Bahia. Vamos fazer isso com muita calma, com muita tranquilidade. A ideia também não é só a quantidade mas a qualidade para que a gente possa realmente ter um efeito positivo na construção dessa escola mais digna, mais acessível e mais inclusiva no Estado da Bahia.

Raio-X

O promotor de Justiça Adriano Freire de Carvalho Marques atua no Ministério Público da Bahia (MPBA) há 14 anos. Além disso, coordena Centro de Apoio Operacional de Defesa e Educação (Ceduc). Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especialista em Direito Civil, já atuou também como professor de Direito Civil e Prática Jurídica em instituições de ensino superior.

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