ONCOLOGISTA EXPLICA
Entenda como Everton Ribeiro continuou jogando mesmo com câncer
O capitão do Bahia foi diagnosticado com câncer de tireoide há um mês e jogou na véspera da cirurgia

Por Marina Branco

O futebol baiano recebeu uma surpresa angustiante na tarde desta segunda-feira, 6. Depois de entrar em campo defendendo o Bahia contra o seu ex-clube, o Flamengo, na noite anterior, o capitão Everton Ribeiro contou em suas redes sociais que está lutando contra um câncer de tireoide e passou por cirurgia após a partida pela 27ª rodada do Brasileirão.
Clubes, torcedores e jogadores se sensibilizaram com a notícia de um dos meio-campistas mais amados do país, que vem convivendo com o diagnóstico já há um mês. Após a operação, Everton garantiu que tudo deu certo e está em processo de recuperação.
Leia Também:
Para compreender melhor o quadro, o Portal A TARDE conversou com Stella Dourado, oncologista da Clínica AMO e especialista em tumores de cabeça e pescoço. A médica explicou o comportamento desse tipo de câncer, os impactos sobre a rotina do atleta, o tratamento, o prognóstico, o processo de recuperação e comentou a decisão de Everton em jogar durante o último mês.
Como funciona o câncer de tireoide
De acordo com a Dra, "se você precisar ter algum câncer, que seja o de tireoide". Conhecido por crescer lentamente e não ter muitos sintomas, o tumor na tireoide costuma "esperar" o tratamento com tranquilidade.
"O câncer de tireoide tem uma particularidade de ser um câncer extremamente indolente. Ele não cresce rápido como os outros. Muitas vezes, o paciente descobre e tem alguma outra questão, está grávida, ou precisa adiar o tratamento, e a gente acaba tratando meses depois, e o tumor está lá igualzinho", conta a médica.
"Ele tem um comportamento extremamente indolente, muito mais tranquilo do que os outros cânceres e, na grande maioria das vezes, não dá sintomas. Provavelmente, ele foi liberado para jogar por isso. Não é um câncer que costuma dar sintomas, principalmente nos casos mais iniciais, como deve ter sido o dele", explica.
A médica ressalta que não tem acesso aos detalhes do caso clínico de Everton Ribeiro, mas considera que o quadro foi identificado precocemente. "Geralmente é um tumor de comportamento muito arrastado, e que, na maioria dos casos, não dá maiores sintomas. É bem provável que ele tenha sido diagnosticado em estágio inicial", diz.
Ele deveria ter jogado no último mês?
Quando recebeu o diagnóstico, a decisão do capitão tricolor foi clara - seguir em campo defendendo o Bahia. Para a oncologista, não foi uma atitude imprudente, já que o câncer de tireoide não costuma afetar as atividades cotidianas nem exigir repouso.
"A pessoa continua fazendo suas atividades normais mesmo até operar, às vezes meses depois. Então não é algo que impacte no dia a dia, não impacta no trabalho, não impacta na qualidade de vida. Na grande maioria dos casos, o paciente segue a rotina normalmente", explica.
Justamente por isso, ter jogado no dia anterior à cirurgia não foi sinal de imprudência da parte de Everton, já que suas condições físicas estavam preservadas mesmo com a presença do tumor.

A maior parte dos pacientes passa algum tempo convivendo com o tumor sem sequer saber de sua existência, justamente pela ausência de sintomas. A oncologista explica que o câncer de tireoide, por ser pouco sintomático, é frequentemente diagnosticado por acaso, durante exames de rotina como ultrassonografias.
"A gente vê bastante pessoas que fazem ultrassom de rotina, solicitado por algum especialista, e acabam flagrando um nódulo de tireoide pequeno. Muitas vezes é diagnosticado dessa forma", conta.
Apesar disso, ela reforça que não existe recomendação de rastreamento populacional para o câncer de tireoide: "É importante frisar que a gente não tem indicação de rastreio, de exame de rastreio a nível populacional, diferente do câncer de mama, de intestino ou de colo de útero, que têm exames de rotina indicados. No caso do câncer de tireoide, não há recomendação para fazer exames preventivos regulares".
No entanto, em alguns casos, é possível perceber alguns sintomas, como nódulos que aparecem no pescoço, ínguas na região cervical que não melhoram, rouquidão, ou algum desconforto para engolir.
No entanto, na grande maioria das vezes, o paciente não tem sintoma nenhum e acaba descobrindo por ultrassom de rotina, feito por conta própria ou porque algum médico solicitou, mesmo sem recomendação formal.
Índice de cura
O caminho de Everton Ribeiro, então, já está indo em direção à cura - e no câncer de tireoide ela é mais provável do que em qualquer outro. "Geralmente é um câncer de excelente prognóstico, um dos tumores com maior índice de cura, de 90% a 95% na grande maioria dos casos", diz a médica.
"O paciente normalmente faz a tireoidectomia, que é a retirada da glândula tireoide, e fica curado. Em alguns casos, dependendo do tamanho do tumor ou se há linfonodos comprometidos, pode ser necessário complementar o tratamento com iodoterapia, para reforçar a chance de cura", explica.
Segundo ela, as complicações são raras e costumam estar relacionadas à cirurgia, não à doença em si. "Qualquer cirurgia tem risco, mas a tireoidectomia é uma cirurgia geralmente segura, pouco mórbida e com pouquíssimas complicações", conta.
"A maioria dos cirurgiões de cabeça e pescoço tem ampla experiência com esse procedimento. O paciente normalmente tem alta precoce e evolui bem. Felizmente, é um tumor extremamente curável", garante.
Considerando que Everton Ribeiro já foi operado e confirmou que tudo correu bem na cirurgia, as complicações possíveis para a operação são praticamente descartadas, indicando uma recuperação ainda mais segura do atleta.
Pode precisar fazer quimioterapia?
A médica também esclarece que a quimioterapia, tratamento conhecido por debilitar o paciente fisicamente, não é usada no tratamento do câncer de tireoide. "Quimioterapia não é um dos tratamentos que a gente utiliza para o câncer de tireoide. Ele não é um tumor quimiossensível. O tratamento principal é a cirurgia, e, em alguns casos, a iodoterapia", explica.
O tipo mais comum da doença é o carcinoma papilífero, e, de acordo com a oncologista, esse é justamente o subtipo que costuma ter os melhores resultados. "No câncer papilífero de tireoide, o tratamento principal é a cirurgia, e, dependendo do caso, a iodoterapia. Depois, o paciente é acompanhado ao longo dos anos", diz.
Como é a cirurgia?
Sobre o procedimento, Stella explica que a cirurgia consiste na retirada total ou parcial da glândula tireoide, dependendo do tamanho e das características do tumor. "É uma cirurgia de retirada da glândula tireoide, que pode ser total ou, em casos bem selecionados de tumores muito pequenos, parciais. Mas, na grande maioria das vezes, é indicada a retirada completa da glândula", explica.
Após o procedimento, o paciente passa a fazer uso de hormônio sintético da tireoide. "Depois da cirurgia, o paciente recebe o hormônio sintético que substitui o que a glândula produzia. É uma medicação que mimetiza o hormônio natural. A cirurgia é relativamente tranquila e, em mãos habilidosas, é muito raro haver complicações, como lesão em algum nervo da voz", comenta.
"Geralmente, o paciente evolui de forma muito satisfatória e não costuma ficar com sequelas, especialmente se for bem operado, como acontece na grande maioria dos casos", garante.
Quando ele volta aos campos?
Quanto ao retorno de Everton Ribeiro aos gramados, a médica prefere cautela. "É difícil dizer, porque depende muito do tipo que ele teve, do resultado da biópsia. Acho melhor não gerar expectativa na torcida, porque pode variar de acordo com o tipo de câncer e a necessidade de fazer iodoterapia", justifica.
Mesmo assim, ela reforça que a recuperação costuma ser rápida. "Em geral, é uma cirurgia tranquila, com recuperação rápida e poucas complicações. O paciente normalmente retorna às atividades normais em poucos dias. Mas ele é um atleta de alto rendimento, e o retorno ao futebol exige uma avaliação individual, com o cirurgião e o oncologista", diz.
"De modo geral, o retorno à atividade física e ao trabalho é precoce, em 15 dias ou um mês o paciente já costuma ter uma vida normal. Mas como ele é jogador, com treinos intensos, jogos e viagens, o médico dele vai avaliar com cuidado. Ainda assim, não há risco grande de piora depois da cirurgia", completa.
"Se o paciente não teve complicação e está bem, como parece ser o caso, a recuperação deve ser boa e o retorno também. Provavelmente será precoce. Não é algo que costuma impactar muito", termina.
Vai dar tudo certo
A fala da doutora, então, pode ser resumida em uma palavra - esperança. Enfrentando um câncer altamente curável, Everton Ribeiro tem grandes chances de se recuperar da melhor maneira possível e voltar aos campos com todo o gás.
"No caso de um paciente jovem, saudável e com diagnóstico precoce, as perspectivas são excelentes. A expectativa é de um retorno tranquilo e uma recuperação completa, sem impactos significativos em sua vida ou carreira", finaliza.
Siga o A TARDE no Google Notícias e receba os principais destaques do dia.
Participe também do nosso canal no WhatsApp.
Compartilhe essa notícia com seus amigos
Siga nossas redes