FUTEBOL FEMININO
Entre racismo e machismo, Viola se torna voz contra o preconceito
Ex-jogadora relata agressões sofridas nos gramados e reforça a importância da luta por respeito
Por Marina Branco

Ser um jogador negro no futebol já é um caminho repleto de injustiças. Ser uma mulher negra no futebol então, é um somatório de obstáculos. Algumas, no entanto, vencem os diversos desafios impostos pelo preconceito, e constroem dia após dia um futuro mais inclusivo para o esporte.
É o caso de Marlucy Cosmira, ou Viola, ex-jogadora e atualmente auxiliar técnica, que relembra momentos de discriminação que marcaram sua trajetória na luta contra o racismo e o machismo no futebol. “Por ser futebol feminino, já sofre discriminação. Empresarial, financeira, em todos os sentidos. Hoje em dia, é mais fácil ter clubes como o Bahia com times femininos. Na época, a gente precisava fazer rifa para participar de competições", conta a atleta aposentada dos campos há quatro anos.
Entre racismo e machismo, atletas baianas encontram também a xenofobia, vivida por Viola de perto em um episódio emblemático quando defendia o São Francisco do Conde, em partida contra a Ferroviária, em Araraquara, pelo Brasileirão. “A torcida pegava no pé da gente. Nessa situação, nós sofremos discriminação racial e pelo lugar de onde viemos", relata no seminário 'Racismo no Futebol - Combate à Discriminação nos Estádios'.
"Nós ganhamos, e antes de acabar o jogo já estávamos sendo chamadas de ‘tudo cearense’, dizendo que ‘vocês só prestam pra limpar nosso banheiro’. Deixávamos passar, porque estávamos fazendo o que gostávamos. Não podíamos nos deixar atingir", explica.
"Não satisfeita, a torcida agrediu fisicamente, lançando latas de cerveja, garrafas de água e um rádio de pilha. Ele atingiu nosso treinador, machucou a testa e ele teve que levar ponto. No vestiário, as atletas do outro time atacaram a gente do mesmo jeito. Todas mulheres, atletas, dividindo o mesmo espaço. Mas por ser do Sudeste, a equipe delas se achava melhor que a nossa", diz.
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Nem tudou mudou
Apesar da evolução social nos últimos anos, Viola ressalta que nem tudo mudou: “Ano passado, teve o mesmo episódio com Suelen, do Bahia, onde o treinador adversário fez gestos dizendo que a atleta estava fedendo e a comparando a um macaco. Nem dentro do nosso estado, na nossa torcida, respeitam a gente".
Para a ex-jogadora, as agressões deixam marcas profundas. “Ver coisas assim machuca, dói. Quem passa, sente. Assistindo já dá revolta, mas quem passa sofre muito. Mas acredito que pela educação, as pessoas consigam ver que somos todos iguais, e que não é a cor da minha pele que me representa, mas sim o que eu sou", opina.
"Não importa se eu sou negra, nordestina baiana, se meu clube é inferior ao adversário. É respeitar meu ser. Quando a gente entra em campo, somos todas iguais. Se eu me machucar, meu sangue é vermelho como o de todos ali", afirma.
Hoje, como auxiliar técnica da base de clubes, Viola leva a força que construiu a jovens atletas que, ainda na infância, precisam aprender a lutar contra a discriminação e o preconceito que as acompanharão no futuro, se tornando referência para a luta das futuras gerações.
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