Menu
Pesquisa
Pesquisa
Busca interna do iBahia
HOME > SÃO JOÃO
Ouvir Compartilhar no Whatsapp Compartilhar no Facebook Compartilhar no X Compartilhar no Email

SEM ESPAÇO?

São João sem LGBTs? Preconceitos e falta de diversidade intimidam comunidade

Pessoas LGBTQIAPN+ ainda enfrentam dificuldades para se destacar no cenário junino

Por Edvaldo Sales

17/06/2025 - 9:00 h
Aila Menezes comanda o Arraiá da Mamacyta
Aila Menezes comanda o Arraiá da Mamacyta -

A presença massiva do público LGBTQIAPN+ no Carnaval de Salvador já é uma realidade e pode ser atribuída a vários fatores que vão desde a abertura à comunidade até a resistência. No São João, porém, a realidade é diferente. Isso se deve à falta de diversidade e a preconceitos que ainda permeiam a festa, segundo artistas que pertencem à sigla.

Na percepção do presidente do Grupo Gay da Bahia (GGB) e coordenador do Centro Municipal de Referência LGBT, Marcelo Cerqueira, a presença da diversidade LGBTQIAPN+ ainda é pouca ou quase nenhuma nas festas de São João em zonas rurais e na noite da Bahia.

Ele pontuou que não se refere às grandes cidades que realizam eventos amplos quando diz isso. “Na cidade, houve um tempo em que, mesmo com forte presença LGBT+ nas quadrilhas juninas — como dançarinos, coreógrafos e integrantes —, pessoas travestis e transexuais eram proibidas de dançar com um par”, ressaltou em entrevista ao Portal A TARDE.

Marcelo lembrou que o estatuto da federação trazia uma norma que só permitia pares binários. “Há cerca de 10 anos, o GGB, junto com a advogada Anhamona Brito, redigiu um novo capítulo, excluindo essa proibição. Hoje, vemos a juventude LGBT dos bairros presente nas festas com vigor, cor e beleza em grupos como a Capelinha do Forró e a Asa Branca”, celebrou.

A estrutura da sociedade influencia nesse cenário, que é estruturalmente LGBTfóbica, como apontou a baiana Aila Menezes. “A gente encontra dificuldade de permear, de protagonizar esses espaços. No São João, por exemplo, existe ainda mais dificuldade. A gente pensa: para onde é que o público LGBT vai? A gente vai para as festas que todo mundo está curtindo, não para uma festa que seja pensada em algum momento. Acho que não tem essa reflexão sobre onde nós vamos habitar durante o São João”, disse.

Aila Menezes comanda o Arraiá da Mamacyta
Aila Menezes comanda o Arraiá da Mamacyta | Foto: Bruno Hierro | Divulgação

Leia Também:

Ausência de artistas LGBTQIAPN+ nos palcos

A ausência de artistas LGBTQIAPN+ nos palcos dos grandes eventos juninos da Bahia foi outro tópico levantado pelas fontes ouvidas pela reportagem. Algumas das maiores grades não contam com nomes que pertencem à comunidade. “Não vejo a gente nos palcos, infelizmente, mas gostaria muito de ver. A gente tem que dar um jeito para curtir dentro do que sobra”, lamentou Aila.

Para mudar, a gente precisa de uma construção social, de pessoas que apoiem, de pessoas aliadas à causa. Essas grades são montadas, geralmente, por homens brancos, cisgêneros, héteros e burgueses, que têm uma visão zerada para o público LGBT.
Aila Menezes - cantora

A alternativa, segundo a cantora, é ter acesso às pessoas que fazem as grades ou criar formas de chegar até elas. “Eu acho que essa é uma possibilidade de melhora. Eu enxergo o São João pobre de atrações LGBTs. Pobre às vezes das próprias atrações nordestinas. As coisas ficaram muito misturadas e aí termina que a gente não consegue perceber, por exemplo, a diferença de uma grade de uma festa do São João com a de Carnaval. Eu sinto falta de a gente ser representado”.

Rodrigo Sales e Franklin Xavier, que dão vida às drag queens Mary Jany Beck e Sabrina Sasha, respectivamente, afirmaram que existem espaços que colaboram com a diversidade na comunidade no São João, mas existe resistência ainda. "A gente vive em um país LGBTfóbico e a resistência sempre vai existir no Brasil. Essa é a impressão que eu tenho, independente da época do ano, seja no Carnaval ou no São João", disse Rodrigo, que seguiu.

"Mas também faz parte da nossa história derrubar essa resistência e fazer a nossa própria resistência. Existem quadrilhas juninas aqui em Salvador, onde diversas integrantes são drag queens da cena da cidade. A gente faz nossos shows com repertório de forró. Nós tivemos recentemente o Arraiá da Aila Menezes, que é uma cantora LGBTQIAPN+ da cidade, trazendo a festa dela para o Pelourinho, que é um espaço histórico de Salvador".

Rodrigo Sales - Mary Jany Beck
Rodrigo Sales - Mary Jany Beck | Foto: Arquivo Pessoal

Franklin Xavier, a Sabrina Sasha toca triângulo na banda Tio Barnabé. Segundo ele, "ser uma drag queen no forró é, por si só, um ato político e cultural". "Levo minha arte com respeito às tradições, mas sem abrir mão de quem eu sou. Ainda tem quem torça o nariz, sim, mas também tem muita gente que se emociona, que se reconhece, que se sente representada. E para mim isso é o que é o mais importante", enfatizou.

Nós, pessoas LGBTQIAPN+, sempre estivemos presentes, seja nos bastidores, nas quadrilhas, na música ou nas ruas. A diferença é que agora estamos ocupando esse espaço com mais visibilidade e voz.
Franklin Xavier - drag queen
Franklin Xavier - Sabrina Sasha
Franklin Xavier - Sabrina Sasha | Foto: Arquivo Pessoal

Dentro desse contexto, Marcelo Cerqueira frisou que o São João em Salvador tem dois fatores que impactam diretamente sua dinâmica: “O inverno e o êxodo para o interior, geralmente para visitar familiares. Os LGBTs estão incluídos nessas populações que migram temporariamente. Por isso, a presença de eventos específicos para esse público na capital nesse período ainda é rara. É possível mudar isso com o fortalecimento de grupos culturais LGBT+, apoio institucional e promoção de quadrilhas e festas que incluam essa diversidade de forma explícita e segura”.

São João ou Carnaval: qual festa tem mais diversidade?

A discussão sobre o Carnaval de Salvador está atraindo cada vez mais o público LGBTQIAPN+ tem tomado conta da folia. Muito se fala sobre o evento ser uma festa de celebração da diversidade, com potencial até para se tornar uma Parada LGBT em um futuro próximo. Durante a folia, o Portal A TARDE constatou essa realidade. Mas e o São João, tem esse mesmo potencial?

Para Marcelo Cerqueira o Carnaval de Salvador “é, sem dúvida, uma grande confluência de afirmação da sexualidade, especialmente de gays e pessoas trans”. Ela ressaltou, contudo, que ainda existe hostilidade em relação às lésbicas, e “muitas não se sentem à vontade para demonstrar carinho com suas parceiras, porque os homens não permitem ou reagem com violência. Isso precisa mudar”.

O São João carrega outro sentido: é uma festa de origem católica, com forte marca familiar, com fogueiras, comidas típicas e danças tradicionais. A estrutura simbólica é diferente da do Carnaval.
Marcelo Cerqueira - presidente do Grupo Gay da Bahia (GGB)

Conforme Aila, para a comunidade alcançar o mesmo espaço e respeito nos festejo juninos é mais “delicado por ser uma festa tradicionalmente construída dentro do universo hétero, pensado nos interiores e no eixo da cultura nordestina. No Carnaval, existe mais liberdade”.

“O público LGBT consome, mobiliza o capital e a cultura no Brasil inteiro. Se a gente for observar os grandes eventos, são LGBTs que os mobilizam. Mas, infelizmente, também é um público que não é escutado”, reforçou.

O São João é uma festa muito mais debilitada de diversidade, de possibilidades e muito cheia de preconceitos. É feita por pessoas que geralmente são mais antigas, pessoas mais matutas, digamos assim. E é mais difícil entrar na cabeça dessas pessoas a nossa diversidade. Se já tá difícil no Carnaval, eu acho que no São João é mais difícil ainda.
Aila Menezes - cantora

Pequenos passos para alcançar a mudança

Em meio às diversas adversidades, artistas LGBTQIAPN+ de Salvador têm buscado maneiras de fazer a diversidade ser mais presente nessas festas. Aila Menezes realizou o Arraiá da Mamacyta no dia 4 junho no Pelourinho, em Salvador. Outra edição do evento vai acontecer no dia 28.

“Eu sou do público LGBT e a gente trouxe um São João super inclusivo. Foi maravilhoso. Isso precisa também permear outros espaços. É preciso lembrar que somos LGBT todos os dias do ano, não só em datas comemorativas ou no momento que dá para fazer Pink Money”, salientou.

Ver essa foto no Instagram

Uma publicação compartilhada por 🔥AILA MENEZES🔥 (@ailamenezes)

Outros eventos semelhantes marcam o São João deste ano em Salvador: Show das Drags Esquenta Junino com Chocolate Batidão (4 de junho); Festival Sonora Nu Quintal + Feira de Empreendedorismo LGBTQIP+ (7 de junho); e Orgulho e Raízes - O Brega é Junino (27 de junho). As informações foram colhidas junto à Secretaria de Cultura da Bahia (Secult-BA).

“A gente faz nossos shows com repertório de forró. Nós tivemos recentemente o Arraiá da Ayla Menezes, que é uma cantora LGBTQIAPN+ da cidade, trazendo a festa dela para o Pelourinho, que é um espaço histórico de Salvador. O São João eu acho super importante para a comunidade. Todo movimento, toda expressão artística e cultural que tem a nossa participação é incrível, não tem como, somos as maiores”, comemorou Rodrigo Sales.

Por fim, Franklin Xavier enfatizou que quando se leva a visibilidade LGBTQIAPN+ para o palco do forró, uma semente é plantada. “O que falta é mais incentivo, visibilidade, apoio institucional e, principalmente, coragem de quem organiza para abrir mais espaço de verdade”.

A gente precisa de arraiais onde possamos ser quem somos sem medo, com segurança, acolhimento, artistas LGBTQIAPN+ no palco e no comando. E isso se constrói com apoio do poder público, incentivo à cultura independente e principalmente com união da própria comunidade.
Franklin Xavier - drag queen

Polícia promete segurança e respeito à população LGBTQIAPN+ no São João

Na segunda-feira, 16, a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (SJDH), em parceria com a Polícia Militar, promoveu uma formação voltada para o atendimento humanizado e a proteção de públicos vulneráveis, com destaque para a comunidade LGBTQIAPN+ durante os festejos juninos na Bahia.

O primeiro módulo da capacitação abordou o acolhimento desse público, reforçando a importância do respeito ao nome social e identidade de gênero, especialmente para pessoas trans e travestis. A orientação foi dada por representantes da SJDH, que enfatizaram a necessidade de combater o preconceito e oferecer um atendimento digno e respeitoso em casos de violência ou discriminação durante os eventos.

Além da formação, a SJDH instalará o Plantão Integrado de Direitos Humanos nas cidades de Amargosa e Santo Antônio de Jesus durante o São João. O serviço oferecerá atendimento imediato a pessoas em situação de vulnerabilidade, incluindo a população LGBTQIAPN+. A estrutura contará com apoio de órgãos federais, estaduais e municipais, além de organizações da sociedade civil, garantindo acolhimento, orientação e encaminhamento de casos de discriminação ou violência.

Compartilhe essa notícia com seus amigos

Compartilhar no Email Compartilhar no X Compartilhar no Facebook Compartilhar no Whatsapp

Tags:

lgbtqiapn+ São João

Siga nossas redes

Siga nossas redes

Publicações Relacionadas