OPINIÃO
'Vale Nada', 'Vale Lacre'... Por que o remake de Vale Tudo não emplacou na Globo?
Novela enfrenta problemas graves e tem audiência menor que a desejada
Por Luiz Almeida

Quando a Globo anunciou o remake de Vale Tudo, muita expectativa foi criada em torno da reinterpretação de uma das novelas mais icônicas da TV brasileira. Internamente o canal falava em "atualizar um clássico", mas, até agora, o resultado tem gerado mais críticas do que aplausos. A trama não conseguiu emplacar na audiência e o motivo não parece ser falta de temas.
O folhetim, escrito por Manuela Dias, fez questão de incluir temáticas contemporâneas: pensão alimentícia, resgate de animais, masculinidade tóxica, independência feminina, questões de gênero e sexualidade. Todas muito pertinentes, todas importantes.
Mas há um problema que salta aos olhos: quase nenhuma dessas pautas é realmente aprofundada. Elas surgem como flashes, diálogos soltos, como se a novela se esforçasse para parecer atual, mas sem a coragem ou o tempo necessário para desenvolver essas discussões com a densidade que elas merecem.

O resultado é uma novela que se aproxima mais de um "vale lacre", ou seja, jogando temas sobre a mesa, do que de um "vale tudo", onde as relações humanas eram expostas de maneira crua e dramática, como foi feito na obra original, em 1988.
Vale Tudo perde essência e expõe erros
Outro aspecto que prejudica a produção é a perda de elementos técnicos essenciais que marcaram a primeira versão. A sonoplastia incidental, por exemplo, desempenhava um papel fundamental na ambientação emocional das cenas clássicas. Agora, parece tratada com desleixo, diminuindo a intensidade de momentos chave e tornando a narrativa mais fria.
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Os erros técnicos, por sinal, também incomodam o público mais atento. Problemas de continuísmo, como a cena em que Odete Roitman aparece, num corte, com um copo de água e, no seguinte, segura uma xícara de café, minam a credibilidade da produção. São deslizes que, numa novela de tamanha importância e orçamento, não deveriam acontecer.
Outro ponto delicado está na construção dos personagens. Muitos deles ainda não caíram no gosto do público, como Afonso, interpretado por Humberto Carrão, cuja interpretação não consegue gerar identificação suficiente para movimentar a trama. Fica no meio do caminho.
A vilã quase heroína
Mas talvez a maior polêmica seja a transformação de Odete Roitman. Vendida como a maior vilã da teledramaturgia brasileira, imortalizada por Beatriz Segall, a personagem agora passa por um processo de "humanização". Ela tem preconceitos, sim, mas suas falas são justificadas; ela é, muitas vezes, a voz da razão.

O problema é que falta à personagem a vilania escancarada que a fez se tornar inesquecível. Ao tentar suavizá-la, o remake dilui o impacto da narrativa, frustrando quem esperava ver a megera de volta em sua plenitude.
Ninguém duvida que Vale Tudo é uma boa novela e seu remake, inclusive, melhor que a antecessora Mania de Você. No entanto, há muitas falhas expostas onde deveria brilhar: no roteiro, nos personagens e na capacidade de provocar.
*Luiz Almeida é jornalista e analista de televisão
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