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CRÔNICA

Se você quiser contestar alguma coisa, vá em frente… mas, meu caruru, não!

O caruru na Bahia em setembro já virou até patrimônio imaterial

Luisa Sá Lasserre*

Por Luisa Sá Lasserre*

21/09/2025 - 7:03 h
Confira a crônica deste domingo, 21
Confira a crônica deste domingo, 21 -

O despertador toca pela segunda vez e eu ignoro, só mais um pouquinho. Estou tendo uma conversa muito séria com uma amiga que não vejo há muito tempo… não entendo bem o que ela diz e, pra falar a verdade, a cara dela está até um pouco estranha. Espera aí… esta não é a minha amiga. Abro os olhos de supetão. Caramba, tô atrasada! Lavo o rosto, apressada, prendo o cabelo, troco a roupa e corro pra ajeitar o café, enquanto acordo os meninos para se arrumarem para a escola. Toda manhã é essa corrida contra o sono, o relógio e o típico humor matinal de dois adolescentes. Uns dias mais, outros mais ainda.

Mas, calma, hoje tem caruru, de repente me lembro. E isso, claro, faz toda diferença – afinal, eu sou baiana. Tento olhar o lado bom de sair de casa alguns minutos depois do horário habitual, mas não vejo nenhum… deve ser minha miopia. O trânsito depois das 7 horas não ajuda. Cinco minutos antes e aqueles três carros atravancando a pista à minha frente não estariam ali. Para melhorar, o esguicho d'água do para-brisa está enguiçado, e o vidro, todo embaçado.

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Acelero quando o semáforo abre e chego à escola prestes a findar os dez minutos de tolerância. Só então me dou conta de que não trouxe o documento assinado que preciso entregar na coordenação ainda no primeiro horário. Justo hoje? Deixo os meninos e volto todo o percurso para então retornar mais uma vez à escola. Respira e vai. Mais tarde tem caruru, é só o que importa; repito o mantra e ligo o rádio. As notícias não são nada animadoras; será o fim dos tempos? Começo a pensar… mas, hoje não, não venha mexer no meu caruru.

O restante do dia passa como quem tem fome. Mas setembro está aí e chega com essa garantia: tem caruru. E, quando vejo, já é hora. Uma amiga faz aniversário nesta época e todo ano ela acaba servindo a culinária temática do mês para os amigos. “Só os mais chegados”, ela garante, enquanto a turma começa a aparecer. Aham, sei como é. Vinte e nove, trinta e quatro, quarenta e dois… paro de contar e vou fazer meu prato.

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Vai um pouquinho de tudo… vatapá, banana frita, farofa, xinxim de galinha, feijão fradinho e, claro, o quiabo. Só não arroz, por favor. Pra que, afinal, vou estufar meu prato com esses grãozinhos pálidos e sem graça? Se tiver algum entusiasta do arroz por aí, me desculpe, mas é que eu não sou mesmo muito fã. É o tipo de alimento que enche a barriga sem oferecer muito sabor em troca. Tudo bem que é uma preferência nacional, mas será que só eu acho isso?

Bem, voltemos ao caruru. Na mesa ao lado, uma amiga tenta explicar a iguaria ao marido polonês. Ele aponta para a massa amarela no prato e pergunta o que é aquilo. Vatapá, ela responde – bread and dendê oil, tenta resumir os ingredientes. Está gostando? Outra amiga pergunta, enquanto ele remexe os talheres na comida. Sim, sim, ele arrisca dizer em português, balançando a cabeça e sustentando um sorriso na paleta do vatapá.

Quem não é baiano não entende essa nossa culinária exótica, de raízes africanas. O caruru na Bahia, em setembro, já virou até patrimônio imaterial. Não é só uma comida, é cultura, é motivo de celebração e até religião. A tradição percorre todo o mês, mas o dia 27 é o marco popular em que se oferece a culinária por ser o dia consagrado a Cosme e Damião, os santos gêmeos que estudaram medicina na Síria, curaram pessoas e professaram a fé cristã, padroeiros de crianças, médicos e farmacêuticos

O que caruru tem diretamente a ver com Cosme e Damião? Melhor nem entrar nesta seara... Desde quando a gente precisa justificar uma boa comida? Se você quiser contestar alguma coisa, vá em frente… mas, meu caruru, não!

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